quarta-feira, 1 de abril de 2015

Entre correntistas na Suíça, nomes da Justiça

O Globo

Desembargadores do TJ-SP, ex-procurador do Rio e ex-defensora pública geral de PE na lista do HSBC


Desembargadores do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), um ex-procurador-geral de Justiça do Rio e uma ex-defensora pública geral de Pernambuco aparecem na lista dos 8.667 brasileiros ligados a contas numeradas (sigilosas) abertas no HSBC da Suíça. O levantamento foi feito pelo GLOBO, em parceria com o UOL, nos documentos vazados em 2008 pelo ex-técnico de informática da instituição, Hervé Falciani. Procurados pela reportagem, todos os citados negaram ter conta.
Contas somariam R$ 1,7 milhão até 2007

Dois desembargadores do TJ-SP surgem nos documentos do banco de Genebra. O primeiro é Jayme Queiroz Lopes Filho, da 36ª Câmara de Direito Privado. Segundo os registros do HSBC, ele está ligado a duas contas numeradas. Uma foi aberta em janeiro de 1997 e fechada dois anos depois. A outra surgiu em outubro de 1998 e ainda permanecia ativa em 2006 e 2007, com um saldo total de US$ 131,1 mil.

O segundo desembargador do TJ-SP é Paulo Eduardo Razuk, da 1ª Câmara de Direito Privado. De acordo com as planilhas do HSBC suíço, ele aparece ligado a uma conta aberta em novembro de 1994 e fechada em março de 2004. Em 2006/2007, seu saldo estava zerado.

Há na lista um desembargador aposentado do Tribunal de Justiça de São Paulo: Ney de Mello Almada, que hoje atua como advogado. A conta vinculada a seu nome na agência suíça do HSBC foi aberta em maio de 1992 e permanecia ativa entre os anos de 2006 e 2007, com um saldo total de US$ 263.922.

Carlos Antonio da Silva Navega, que foi procurador-geral de Justiça do Estado do Rio de Janeiro entre 1987 a 1991, aparece atrelado a três contas. Em 2006/2007, todas estavam zeradas.

Também está na listagem do HSBC a ex-defensora pública geral de Pernambuco Marta Maria de Brito Alves Freire. Ela comandou a instituição de 2010 a 2014. A conta vinculada a seu nome é conjunta com seu marido, o advogado Marcos Freire Filho, e foi aberta em 29 de outubro de 1996. Em 2006/2007, o saldo era de US$ 1,016 milhão.


Citados negam conta no banco

Todos os citados nas planilhas vazadas do HSBC em 2008 que foram encontrados pela reportagem negaram ter contas na filial suíça do banco. Jayme Queiroz Lopes Filho disse, por e-mail, “desconhecer por completo a existência das contas”.

O desembargador Paulo Eduardo Razuk foi contatado na sexta-feira por meio da assessoria do tribunal, mas não retornou até o fechamento desta edição.

Ney de Mello Almada, advogado e desembargador aposentado, negou, por telefone, que tenha ou que tenha tido conta em Genebra:

— Deve haver algum engano.

O ex-procurador-geral de Justiça do Rio Carlos Antonio da Silva Navega afirmou em nota: “Jamais abri ou mantive, isoladamente ou em conjunto com qualquer pessoa, conta corrente no HSBC na Suíça. Os bens de minha propriedade no exterior, assim como a conta corrente que possuo em outro país, estão devidamente inscritos e informados em minha declaração anual de Imposto de Renda, assim como comunicados anualmente ao Banco Central do Brasil, na forma da lei”.

A ex-defensora Marta Maria de Brito Alves Freire disse, em nota, que “encontra-se rigorosamente em dia com todas suas obrigações fiscais” e que ficou “surpresa e indignada” com a aparição de seu nome. Marta é casada em comunhão de bens com Marcos Freire Filho, relacionado à mesma conta, desde 1972. Ele confirmou que a data de nascimento e o endereço residencial que estão nas fichas do HSBC são seus, mas disse que nunca teve conta.

Nas últimas semanas, O GLOBO, em parceria com o UOL, cruzou a lista dos principais nomes da Justiça do país com a lista dos 8.667 brasileiros que aparecem relacionados a contas numeradas do HSBC na Suíça em 2006/2007. Foram checados os nomes de todos os ministros de tribunais superiores; dos desembargadores dos cinco Tribunais Regionais Federais e dos Tribunais de Justiça dos Estados de São Paulo, Rio e Minas Gerais. Foram rastreados os nomes de chefes do Ministério Público e da Defensoria Pública.

Segundo a lei brasileira, só comete crime o contribuinte que mantém valores no exterior sem declará-los à Receita Federal e ao Banco Central.


Mais de 700 nomes de políticos foram checados

Nas últimas semanas, O GLOBO, em parceria com o UOL, cruzou a lista de congressistas do país com a dos 8.667 brasileiros que aparecem relacionados a contas numeradas do HSBC na Suíça em 2006/2007. Além dos atuais 513 deputados federais, 81 senadores titulares e 162 senadores suplentes, a reportagem checou se apareciam como correntistas em Genebra a presidente da República e todos seus antecessores, o atual vice-presidente da República e os integrantes das Assembleias Legislativas dos Estados de São Paulo, 
Minas Gerais e Rio de Janeiro. 

No mesmo levantamento, foram verificados todos os integrantes das Câmaras de Vereadores das cidades de São Paulo, Belo Horizonte e Rio. Nenhum deles apareceu na lista dos brasileiros com contas numeradas no HSBC da Suíça entre os 2006 e 2007. Nada impede, no entanto, que eles tenham mantido contas no exterior em outros bancos ou períodos.

De acordo com a legislação brasileira, enviar e manter dinheiro no exterior não é necessariamente um crime. Isso só acontece quando o contribuinte deixa de declarar à Receita Federal e ao Banco Central que mantém valores fora do país.

Desde 8 de fevereiro, o Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ) publica reportagens com base nas planilhas vazadas do HSBC em 2008. No Brasil, a apuração é feita com exclusividade pelo GLOBO e pelo UOL, que, no trabalho, já localizaram pessoas que mantiveram valores na Suíça de forma legal, declarando-os