Depois de meses de desalento, as últimas semanas sinalizaram que talvez seja possível organizar uma agenda para tirar o país da crise.
Para começo de conversa, vai caindo a ficha sobre a extensão dos nossos desafios. Uma reforma ousada da Previdência é urgente. Com as regras atuais, não há crescimento econômico factível, ou da carga tributária, que evite o aumento descontrolado da dívida pública e a degradação da infraestrutura por falta de manutenção, com queda de viaduto e queima de museu, em decorrência dos gastos crescentes com aposentadorias.
A reforma da Previdência, porém, apenas estabiliza o paciente. Os gastos com aposentadorias continuarão a crescer, só que a uma menor taxa. Outras medidas fiscais serão necessárias para resgatar a capacidade do governo para cumprir as suas obrigações comezinhas.
A frustração dos que esperavam uma poção mágica para superar os nossos problemas revela a superficialidade de alguns analistas que vendiam ilusão. O poço era mais profundo e o resultado tem sido um ano com muita volatilidade e estagnação da economia.
Superado o desequilíbrio fiscal, há muito mais a ser feito, como melhorar a qualidade dos serviços públicos, especialmente em educação. Para agravar, o ambiente de negócios condena o Brasil a um crescimento potencial medíocre, talvez de 1% ao ano. Podemos ter surtos curtos de recuperação da produção, mas apenas isso.
As restrições ao comércio exterior contribuem para a nossa baixa produtividade. As regras de conteúdo nacional e as barreiras à importação dificultam o acesso do setor produtivo ao que melhor se faz em outros países, como as inovações tecnológicas que aumentam a eficiência dos bens de capital.
A estrutura tributária disfuncional prejudica a produção e a geração de empregos, com suas regras mal definidas, jurisprudência oscilante, frequentes alterações nas normas e uma aparente ansiedade por aumentar a arrecadação.
A insegurança sobre regras do jogo nos setores de infraestrutura desestimula novos investimentos essenciais para viabilizar a retomada do crescimento.
As manifestações recentes revelaram o cansaço do país com a longa crise e induziram ao diálogo entre os Poderes. Cabe, agora, ao Executivo definir uma agenda econômica consistente, sem os ruídos desnecessários causados por declarações precipitadas.
O Congresso demonstra disposição para colaborar com o enfrentamento dos difíceis problemas neste momento em que o dinheiro acabou. O STF parece pacificado, ainda que, por vezes, pareça tomar decisões premido por análises incompletas sobre as suas consequências.
Pode não ser muito, mas é bem melhor do que os conflitos insensatos dos últimos meses.
Folha de São Paulo