Apesar de rejeitar o rótulo de “guru do bolsonarismo”, o filósofo Olavo de Carvalho aumentou em mais de três vezes a venda de seus livros durante e após a campanha eleitoral que elegeu Jair Bolsonaro presidente da República, em comparação com o mesmo período do ano anterior. De setembro a dezembro de 2018, foram vendidas 51,9 mil cópias das obras do escritor – em 2017, esse número tinha sido de 17,1 mil, de acordo com dados obtidos pelo Estado com a Nielsen Bookscan e o Sindicato Nacional dos Editores de Livros (SNEL).
A partir do período das eleições, os livros de Carvalho geraram rendimento bruto de mais de R$ 3,2 milhões. O montante das vendas nestes quatro meses equivale ao dinheiro arrecadado nos 15 meses anteriores. O principal título que puxou esse aumento foi O mínimo que você precisa para não ser um idiota, que correspondeu a 42% das obras do filósofo adquiridas entre setembro e dezembro de 2018. Junto com a Bíblia e as memórias do estadista britânico Winston Churchill, o best-seller de Carvalho estava na mesa de Jair Bolsonaro em vídeos divulgados pelo então candidato aos seguidores na internet.
‘Marxismo’
Influente, o filósofo radicado nos Estados Unidos emplacou dois ministros na administração federal: o chanceler Ernesto Araújo e o titular da Educação, Ricardo Vélez Rodríguez. Ambos já ecoaram ideias popularizadas por Carvalho, especialmente o que chamam de “marxismo cultural” – a noção de que a esquerda teria um projeto de dominação para além do campo político, se estendendo para áreas da cultura, das artes, da mídia e das ciências.
O interesse por autores vistos como conservadores, porém, não é recente, segundo Sônia Jardim, presidente do Grupo Editorial Record – que publica as obras de Carvalho. “Percebemos que havia uma demanda por livros neste perfil antes mesmo da chegada do Olavo de Carvalho ao nosso time de autores”, disse Sônia, lembrando que o escritor já publicava artigos na imprensa.
Com o sucesso de Carvalho, outros autores da mesma linha de pensamento passaram a fazer parte do catálogo da editora e entraram nas listas de mais vendidos, como Bruno Garschagen e Flávio Gordon. Este último, segundo Sônia, superou a marca dos 25 mil exemplares vendidos com A corrupção da inteligência.
Nomes como Reinaldo Azevedo, Diogo Mainardi e Rodrigo Constantino também apresentam vendagem expressiva, de 50 mil a 80 mil exemplares. Os números, porém, são discretos se comparados aos de Carvalho, que desde 2013 vendeu cerca de 228 mil exemplares.
Para o doutor em Filosofia pela Universidade de São Paulo (USP) Eduardo Wolf, a razão do sucesso editorial dessa linha de pensamento vem do predomínio anterior da esquerda no mercado de livros de humanidades. Segundo ele, na década de 1990 era impossível comprar clássicos do conservadorismo em português.
Logo as editoras perceberam que havia público para esses livros e o nicho se ampliou com o “cansaço em torno do petismo”. E surgiu uma nova leva de autores, muitos vindos das redes sociais. “Depois de 2013, o Brasil entra uma espécie de dissolução do quadro anterior, o que impulsiona livros nessa pegada”, disse Wolf.
Alessandra Monnerat e Caio Sartori, O Estado de S.Paulo