domingo, 25 de novembro de 2018

"O centrão do bem", por Gustavo Krause

“Odeio a política e quem se mete nessa chafurdação. Entram prometendo mundos e fundos. Quando chegam, lá os caras se aproveitam do poder para defender seus interesses pessoais e mergulhar no oceano da corrupção”.
Essa era a voz da sociedade brasileira: rejeição indignada, movida pela raiva e pela intolerância que, na eleição, racharam o país entre ausentes desiludidos e aderentes furiosos. Radicalizada, a nação colocou frente a frente duas abstrações: “o mito” e a “ideia”.
De concreto, ofensas e “fakes” ocuparam o espaço propositivo do debate. De relevante e assustador, a facada no candidato Bolsonaro entrou no rol dos atentados políticos da História, a exemplo da tentativa de assassinato de Prudente de Moraes, salvo pelo sacrfício da própria vida do Ministro da Guerra, Marechal Machado Bittencourt. Em 1954, o alvo era Lacerda, mas a bala se alojou no coração do Presidente Vargas.
A democracia é assim: virtuosa a tal ponto que se torna vítima dos liberticidas. Porém, renasce e, sob ameaças recorrentes, exige permanente vigilância e firme proteção dos valores que a iluminam. Não poucas vezes, expõe fragilidades nas respostas às demandas urgentes dos cidadãos. Perde prestígio, corre riscos e clama por solidariedade.
É desta solidariedade que emana o paradoxo da democracia: apesar do confronto, a eleição brasileira deixou um expressivo resíduo de politização. Como assim, perguntaria o leitor?
Hoje o brasileiro tem noção da agenda reformista e sepultou o lema “rouba, mas faz”. A corrupção sistêmica assumiu tamanha proporção que, na ponta da gestão, faltam remédio para doentes, merenda escolar para crianças e recursos para a segurança das pessoas.
E mais: o dialeto da tecnocracia foi sendo traduzida para a compreensão dos simples mortais: déficit fiscal é gastar mais do que arrecada; dívida pública é o “pendura” que fica na mão do agiota; reforma da previdência é uma simples conta aritmética que não fecha porque tem gente vivendo mais e menos gente nascendo (longevidade); privilégio é uma sacanagem histórica que torna o rico mais rico e o pobre mais pobre.
Para o novo governo, o desafio é fazer, reformar e atender aos anseios da cidadania. Como? Os velhos arranjos da governabilidade foram rejeitados. Cadê o Centrão? E o toma lá dá cá? Acabaram. Mas existe uma cidadania crítica, ativa. Com ou sem mandato. Percebe-se um ímpeto social renovador que precisa tomar forma, o Centrão do Bem, comprometido com a democracia e com a urgência de reformas inadiáveis.
Gustavo Krause é ex-ministro da Fazenda 
Com Blog do Noblat, Veja