quinta-feira, 4 de outubro de 2018

Procuradoria diz que Lula comandou esquema criminoso para enriquecer ilicitamente

Lula. FOTO DIDA SAMPAIO/ESTADAO

Ministério Público Federal diz 

que o ex-presidente planejava 

'perpetuação criminosa no poder'

A quatro dias das eleições presidenciais, a força-tarefa da Operação Lava Jato reiterou em alegações finais entregue ao juiz Sérgio Moro a argumentação já exposta na denúncia criminal sobre o terreno do Instituto Lula, segundo a qual o petista, ao assumir o Palácio do Planalto, em 1.º de janeiro de 2003, ‘comandou a formação, o fortalecimento e a manutenção de um esquema criminoso de desvio de recursos públicos destinados a enriquecer ilicitamente, bem como, em meio à perpetuação criminosa no poder, comprar apoio parlamentar e financiar caras campanhas eleitorais’.

Documento

O documento preenche 408 páginas e reforça pedido de condenação de Lula por nove atos de corrupção passiva e sete de lavagem de dinheiro. A força-tarefa do Ministério Público Federal também cobra R$ 75,4 milhões do ex-presidente.
Os procuradores da Lava Jato descrevem ‘a atuação de Luiz Inácio Lula da Silva no exercício da Presidência da República’.
A suposta propina da Odebrecht teria sido repassada a Lula por meio da compra de um terreno de R$ 12 milhões que abrigaria o Instituto que leva seu nome e um apartamento avaliado em R$ 504 mil, em São Bernardo do Campo. Em troca desses bens, Lula teria beneficiado a empreiteira em contratos bilionários com a Petrobrás.
Lula está preso desde 7 de abril, para cumprimento de uma pena de 12 anos e um mês de reclusão que lhe foi imposta pelo Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF-4) – o Tribunal da Lava Jato – no processo do triplex do Guarujá.
O processo sobre o terreno do Instituto Lula e o apartamento em São Bernardo está em sua fase derrradeira, por isso o Ministério Público entregou suas alegações finais, reiterando argumentos apresentados quando da apresentação da denúncia criminal.
Ao cravar que Lula criou e manteve suposto esquema criminoso na Petrobrás, os procuradores da Lava Jato assinalam que ‘nesse cenário, em oposição ao que era plausível e esperado de um presidente da República, em vez de buscar apoio político por intermédio do alinhamento político-ideológico com outras agremiações, dirigiu a formação de um esquema criminoso de desvio de recursos públicos, destinados a comprar apoio parlamentar de outros políticos e partidos, enriquecer ilicitamente os envolvidos e financiar caras campanhas eleitorais do PT’.
Os procuradores afirmam que o petista assim agiu ’em prol de uma permanência no poder assentada em recursos públicos desviados, configurando um presidencialismo de coalizão deturpado’.
“A motivação da distribuição de altos cargos na Administração Pública Federal excedeu a simples disposição de postos estratégicos a legendas alinhadas ao plano de governo, passando, então, a visar à geração e à arrecadação de propina a partir do atendimento de interesses junto ao governo, inclusive em contratações públicas”, ressaltam os procuradores.
Na avaliação da Lava Jato, ‘a distribuição de cargos para arrecadar propina não teve por propósito único garantir a governabilidade, objetivando, outrossim, a perpetuação no poder do próprio partido do então presidente da República, com a majoritária distribuição de cargos, e o enriquecimento espúrio de todos, tanto que expressiva porcentagem da propina foi direcionada a funcionários públicos e agentes políticos’.
“No estratagema delineado, agentes minuciosamente escolhidos eram indicados por agremiações políticas da base aliada e nomeados a altos cargos da Administração Pública a fim de zelar pelos interesses escusos de seus padrinhos políticos”, segue o Ministério Público Federal nas alegações finais.
“Mais especificamente, em um esquema ilícito bastante conhecido nas sombras do poder, objetivava-se, na realidade, permitir que os agentes políticos responsáveis pelas indicações, os quais, ressalte-se, fecharam os olhos para projetos de governo em troca desse direito de apontar indivíduos de sua confiança para importantes funções públicas, neles alocassem pessoas comprometidas com a arrecadação de propina.”
Para a Procuradoria, ‘essas pessoas escolhidas para os altos cargos da República, ao cumprir o compromisso assumido perante seus padrinhos, políticos e partidos, recebiam, como contrapartida, igualmente, centenas de milhões de reais em vantagens indevidas, não raro provenientes de grandes empresas e empreiteiras contratadas pelo Estado’.
Em outro trecho do documento, a Procuradoria cita o ex-ministro José Dirceu, também condenado na Lava Jato. “Ao tempo em que preocupado em garantir a governabilidade, imbuído do intuito de perpetuar o poder do Partido dos Trabalhadores e propiciar o enriquecimento ilícito dos membros da organização criminosa em detrimento da Administração Pública, Lula, com o apoio de José Dirceu e de diversas outras pessoas de sua confiança, lançou mão da distribuição de centenas de cargos de direção em ministérios, secretarias, empresas públicas e sociedades de economia mista, assim como dos 18.374 cargos de confiança já previstos desde o governo anterior, traduzido, genuinamente, como forma de compra, por meio de uma sofisticada estrutura ilícita, de apoio parlamentar’.
“Nesse contexto, no intuito de angariar o apoio de importantes partidos políticos que não compunham a base governamental, Lula nomeou, ainda em 2003, pessoas ligadas notadamente ao PP e ao MDB para ocupar altos cargos da Administração Pública Federal, compondo relevantes alianças, ao que, finalmente, o então presidente da República viu seu projeto governamental alinhado às suas prioridades.”

Julia Affonso, Ricardo Brandt, Luiz Vassallo e Fausto Macedo, O Estado de São Paulo