quinta-feira, 20 de setembro de 2018

"O buraco é maior", por Carlos Alberto Sardenberg

O pessoal do Ministério da Fazenda encontrou o que parece ser uma boa notícia: há uma folga de R$ 8 bilhões no Orçamento deste ano. Folga é isso mesmo que o leitor está pensando: dinheiro para gastar.

A primeira reação de uma pessoa que acompanha o noticiário econômico, incluindo nossos comentários, é de espanto. Como pode haver sobra se só se ouve falar de déficits e dívida? Espanto correto. A folga é técnica, digamos assim.

Não é que esteja sobrando dinheiro, mas apenas que o buraco é menor que o antecipado.

Poucos números: o déficit do governo federal autorizado para este ano é de R$ 159 bilhões. É o que consta do Orçamento aprovado pelo Congresso Nacional. Como a atual equipe econômica faz um esforço para segurar os gastos, verificou-se na última checagem que, mantida a atual programação, o déficit será de R$ 151 bilhões. Daí a tal folga de R$ 8 bilhões.

Ótimo, diria uma pessoa normal. Para quem está atolado em dívida, qualquer economia já serve.

Mas não estamos em uma situação normal. O fato é que os serviços prestados pelo governo, educação, saúde, segurança, andam tão prejudicados pela contenção de recursos que faz sentido aproveitar aqueles R$ 8 bi e dar algum alívio a setores da administração.

Isso mostra bem como é dramático o estado das contas públicas e como isso ameaça toda a economia. Fechado 2018, serão cinco anos seguidos de déficits, acumulando-se um buraco de mais de R$ 572 bilhões — valor que foi incorporado à dívida bruta. Esta, obviamente em alta, se aproxima do equivalente a 80% do PIB, quando deveria ser inferior a 40% pelos padrões internacionais.

A atual equipe econômica, de reconhecida competência, calcula que haverá déficits nos próximos três anos, mesmo que sejam feitas reformas. Sem reformas, como a da Previdência, a dívida explode, e o governo cai no dilema fatal: precisa ao mesmo tempo cortar gasto e gastar — para prestar serviços essenciais — e reduzir impostos, abusivos, e aumentá-los para fechar a conta.

E com isso, se vai da crise econômica para a política.

Acrescentem ao quadro que as despesas obrigatórias do governo com previdência, pessoal e programas sociais (pagamentos a pessoas, como desempregados, idosos mais pobres e do Bolsa Família), e isso chega a mais de 80% do Orçamento. Sobram menos de 20% para todo o funcionamento — mau funcionamento — da máquina e um mínimo de investimentos.

Diante desse quadro, Paulo Guedes, economista do líder das pesquisas, diz que será até fácil zerar o déficit no primeiro ano de governo. Como? Vendendo estatais e imóveis.

É não conhecer o governo, o Congresso, os entraves legais, a resistência das corporações, dos sindicatos de funcionários de estatais e dos políticos que controlam aquelas estatais. Todas as privatizações já feitas passaram por uma complicada disputa política. Já pensaram o tamanho dos obstáculos para vender a Petrobras?

Por outro lado, podem notar, novos governos começam assim: a gente vende alguns prédios e terrenos e, pronto, está resolvido. Não está. Começa que estão sobrando imóveis comerciais novos. E quem vai querer comprar, a não ser por preço de banana, imóveis antigos e frequentemente legalmente enrolados?

Do lado do PT, a conversa é pior. Alguns economistas do partido dizem que basta cobrar impostos dos ricos — das grandes fortunas — para fechar o déficit. Não fecha. Não há ricos suficientes para isso.

Mas o pior é o retrospecto do governo Dilma. Assumiu com um superávit de R$ 126 bilhões e entregou com um déficit de R$ 170 bilhões. Sim, podem dizer que Lula fazia superávit. 

Mas foi o próprio Lula que endossou a política de gastança de Dilma e o PT continua oficialmente defendendo o programa de aumentar gasto público, sem fazer qualquer autocrítica da gestão anterior.

Na verdade, o PT teve até sorte com o impeachment de Dilma. O partido pode fazer campanha dizendo é tudo culpa do golpista Temer e seus aliados. Mas isso serve para campanha — mentirosa — não para governar.

Parecia que estas eleições seriam de mudança. Parecia.




O Globo