Danielle Nogueira, Glauce Cavalcanti e Geralda Doca - O Globo
HNA deve fazer aporte de R$ 4 bilhões, que será usado para pagar outorgas
O grupo chinês HNA — que efetivou a compra de uma fatia da Azul no ano passado — se prepara para ampliar sua atuação no Brasil. O braço de infraestrutura da companhia negocia a aquisição da participação da Odebrecht TransPort no RIOgaleão, como antecipou o colunista do GLOBO Ancelmo Gois.
O aeroporto internacional é administrado por sócios privados, com 51% de participação, e pela Infraero, com 49%. Dentro da fatia do setor privado, a Odebrecht tem 60%, e a operadora de terminais Changi, de Cingapura, tem o restante. É a parcela da Odebrecht TransPort que deve ser repassada aos chineses.
Para embarcar no consórcio, a chinesa faria um aporte de R$ 4 bilhões — referentes ao pagamento de outorgas, que seriam repassados à União — segundo fonte próxima à negociação. Metade desses recursos seria usada no pagamento de outorgas vencidas; o restante, em outras ainda por vencer. Essa antecipação atende a uma exigência do governo para repactuar o plano de pagamento de outorgas do aeroporto, como previsto em portaria ministerial a ser publicada esta semana, explicou uma fonte ouvida pelo GLOBO. A decisão final sairá de uma reunião entre os ministros do Planejamento, Dyogo Oliveira, dos Transportes, Maurício Quintella, e da Secretaria-Geral da Presidência, Moreira Franco, marcada para hoje à noite.
AUDITORIA EM ATÉ 60 DIAS
Executivos da HNA chegam ao Rio amanhã. Na quinta-feira, acompanhados de executivos do RIOgaleão, voam para Brasília, onde vão ser apresentados a integrantes do governo federal.
— O HNA vai comprar os 60% da Odebrecht TransPort no consórcio privado, mas pode ser que haja um reequilíbrio entre os sócios, e a participação dos chineses seja reduzida, para aumentar a da Changi, que intermediou a vinda do grupo chinês. A HNA terá participação ativa na gestão — explica uma fonte.
O negócio, no entanto, só será fechado em definitivo num prazo de 45 a 60 dias, quando estará concluída a due dilligence (processo de auditoria) já em andamento. A tendência é que a Infraero mantenha sua fatia de 49%.
— O patrimônio da Infraero se valoriza com o novo sócio. Seria um desperdício não ficar na concessionária — diz uma fonte.
O Odebrecht TransPort informou que “está em contato com potenciais investidores e avalia vender sua participação no RIOgaleão”. O consórcio RIOgaleão enfrenta dificuldades financeiras porque não consegue apresentar garantias para transformar o empréstimo-ponte em empréstimo de longo prazo.
Caso seja bem-sucedida, a reorganização societária do RIOgaleão será passo fundamental para que o consórcio coloque suas contas em dia. Dos R$ 930 milhões em outorga que venceram em 2016, apenas R$ 120 milhões foram pagos. O valor em aberto se soma a uma parcela de quase R$ 1 bilhão que vence em maio. Em junho, vence o empréstimo-ponte no valor de R$ 1,1 bilhão concedido pelo BNDES.
O RIOgaleão já solicitou a repactuação desses pagamentos com o governo, com quem vem discutindo alternativas. A proposta inicial do consórcio era reduzir as parcelas a vencer nesses primeiros anos, devido às dificuldades de caixa em consequência da crise econômica — que freou investimentos de companhias aéreas e a demanda dos passageiros — e à situação da Odebrecht TransPort, empresa voltada para os segmentos de rodovias e mobilidade do grupo Odebrecht, investigado pela Operação Lava-Jato. Mas a proposta não foi aceita pelo governo.
Com o negócio sacramentado e o aporte do novo investidor em caixa, o RIOgaleão planeja pagar a parcela atrasada da outorga de 2016 e quitar 2017, além de antecipar o pagamento de 2018, podendo incluir outros anos. Ao quitar as obrigações em atraso, o consórcio fica em dia com o Fundo Nacional de Aviação Civil, derrubando outro entrave à liberação do financiamento pelo banco.
O consórcio venceu o leilão de privatização do Galeão em 2013, com lance de R$ 19 bilhões, um ágio de 294% sobre o mínimo estabelecido pelo governo, que era de R$ 4,82 bilhões. O contrato de concessão é de 25 anos. Sem financiamento de longo prazo e com receitas aquém do necessário, as outorgas deixaram de ser pagas em meados de 2016.
Em dezembro do mesmo ano o aeroporto quitou R$ 120 milhões e, desde então, paga R$ 9 milhões por mês.
A portaria ministerial foi a saída encontrada para viabilizar a repactuação da dívida do RIOgaleão e evitar que, em última instância, houvesse perda da concessão. Esse modelo de portaria já vinha sendo discutido com o Tribunal de Contas da União (TCU), segundo fontes. É que o governo temia que a permissão para a reprogramação do pagamento de outorgas de concessões de aeroportos fosse interpretada como quebra de contrato por investidores, principalmente os estrangeiros, o que traria insegurança jurídica ao setor, explica uma fonte.
Outra via seria o governo fazer uma emenda para incluir a renegociação de outorga em uma medida provisória em tramitação para o setor de concessões. Com esse desenho (da portaria), o governo encontra uma solução antes mesmo da aprovação da medida. A portaria pode ser utilizada por qualquer concessionário, mas foi feita sob medida para o Galeão, segundo uma fonte.
Não permitirá, porém, jogar a maioria dos pagamentos para o fim do contrato. O governo exigirá pagamento antecipado de outorga, e, em determinado período, o concessionário pagará um pouco menos, mas não jogará todos os compromissos para o fim do contrato. A avaliação é que isso traria risco jurídico.