LETÍCIA CASADO
LEANDRO COLON
Folha de São Paulo
O relatório final do ministro Herman Benjamin, do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), aponta que ele votará pela cassação da chapa de Dilma Rousseff-Michel Temer e contra a punição para tornar os dois candidatos inelegíveis.
Segundo ministros que tiveram acesso ao documento, de caráter sigiloso, a narrativa construída por ele sinaliza uma série de irregularidades financeiras na campanha de 2014, mas também a ausência de provas cabais de que Dilma e Temer sabiam, durante aquele período, que um esquema de caixa dois abastecia as contas.
Para cassar a chapa, não é necessário, destacam membros do tribunal, que os candidatos tenham ciência dos atos ilícitos. É a chamada "responsabilidade objetiva".
Pedro Ladeira/Folhapress | ||
Herman Benjamin, o ministro relator da ação no TSE contra a chapa Dilma-Temer |
Mas para torná-los inelegíveis, sim, é preciso provar o dolo ou a culpa do candidato, o que os juristas classificam como "responsabilidade subjetiva".
Benjamin, relator da ação que pede a cassação da chapa, deve fazer essa diferenciação em seu voto, seguindo uma praxe do próprio TSE.
O relatório tem 1.086 páginas e não entra exatamente no mérito. É um relato dos principais pontos do processo. O voto, ainda em fase de elaboração, será apresentado no julgamento, que começa na próxima terça (4). Procurado, o relator não quis se manifestar sob alegação de estar em fase de pré-julgamento.
Segundo a Folha apurou, o documento, distribuído somente a membros do tribunal, descreve irregularidades que podem levar à cassação da chapa, incluindo uso de propina na campanha, a compra de partidos para aumentar espaço de propaganda na televisão e a utilização de recursos não declarados, o caixa dois. A Odebrecht é descrita como uma organização focada no crime.
Ao mesmo tempo, o relator destaca perguntas e comentários feitos ao longo do depoimento de Marcelo Odebrecht, ex-presidente do grupo, em relação ao fato de que, segundo o empresário, Dilma sabia do caixa dois.
INSISTÊNCIA
Benjamin insistiu em questões
Em um determinado momento, o ministro diz: "Se jamais o senhor, embora achando que ela sabia –se a minha interpretação é correta– falou diretamente com ela, antes das eleições? Não estou me referindo após, quando as contas já estavam vazando. Antes das eleições, o senhor falou com ela, abertamente, sobre pagamentos ilícitos."
O ex-presidente da empresa responde: "Não, sobre... isso aí eu posso assegurar, veja bem... O que é que eu posso assegurar? De minha parte, eu nunca... eu nunca sinalizei para ela, nem ela sinalizou para mim que conhecia de onde vinham ou por que dessa dimensão dos recursos".
Foram pelo menos cinco vezes em que Benjamin contestou a afirmação de Marcelo de que Dilma sabia. Ele chega a comparar o assunto a uma declaração do executivo de que nunca tratou com Temer de uma doação de R$ 10 milhões discutida em um jantar no Palácio do Jaburu.
"Da mesma forma que o senhor não falou diretamente com o presidente Temer sobre os dez milhões, eu imagino, pelo que o senhor está dizendo, que o senhor nunca falou com a ex-presidente", disse o relator.
O ministro mantém a insistência e arranca de Marcelo que somente após as eleições, em uma viagem ao México em 2015, ele tratou com Dilma sobre o assunto.
Na avaliação de pessoas ligadas ao processo, o relator deve apontar que há diferença no fato de um candidato ser informado antes ou depois da eleição de um crime.
O voto de Benjamin pode surpreender envolvidos que esperavam um pedido de cassação da chapa atrelado à penalização da ex-presidente.
CHAPA QUENTE
Entenda a ação que pode resultar na cassação de Temer
Quem propôs
PSDB e partidos coligados ao então candidato tucano Aécio Neves em 2014
O que questionam?
- Gastos de campanha acima do limite informado à Justiça Eleitoral
- Financiamento eleitoral com dinheiro desviado da Petrobras
- Falta de com-provação de despesas de campanha
Principais pontos analisados pelo relator Herman Benjamin
1. R$ 50 milhões de caixa 2 como contrapartida de aprovação de medida provisória
Governo pediu R$ 50 milhões em 2009 para aprovação da MP que ficou conhecida como Refis da Crise. O dinheiro, porém, não foi usado na eleição de 2010 e virou crédito para 2014
Governo pediu R$ 50 milhões em 2009 para aprovação da MP que ficou conhecida como Refis da Crise. O dinheiro, porém, não foi usado na eleição de 2010 e virou crédito para 2014
2. R$ 25 milhões para compra de partidos por mais tempo na TV
Ex-executivo contou que Odebrecht pagou partidos para entrarem na coligação da chapa Dilma-Temer e, assim, terem mais tempo de propaganda eleitoral gratuita na TV. (12 min contra 6 min da chapa de Áecio)
Ex-executivo contou que Odebrecht pagou partidos para entrarem na coligação da chapa Dilma-Temer e, assim, terem mais tempo de propaganda eleitoral gratuita na TV. (12 min contra 6 min da chapa de Áecio)
3. R$ 16 milhões de caixa 2 para marqueteiro da campanha
Os relatos dão conta de pagamentos para João Santana por meio de caixa 2, em contas no exterior. Sua mulher, Mônica Moura, teria intermediado os acertos realizados. Marcelo Odebrecht diz ter certeza de que Dilma sabia
Os relatos dão conta de pagamentos para João Santana por meio de caixa 2, em contas no exterior. Sua mulher, Mônica Moura, teria intermediado os acertos realizados. Marcelo Odebrecht diz ter certeza de que Dilma sabia
Relatório final
Benjamin mandou aos colegas do tribunal nesta segunda
Ação está pronta para entrar na pauta de julgamento do TSE
- Presidente do tribunal, ministro Gilmar Mendes, definiu que ação começa a ser julgada na terça (4)
- Benjamin é o primeiro a dar o voto na sessão de julgamento (sete ministros participam)
- Qualquer ministro pode pedir vista do processo (o que interrompe a sessão)
- Cada ministro pode ficar com a ação para análise
O que pode acontecer
1. Ação ser julgada improcedente: ninguém sofre punição
2. Ação ser considerada parcialmente procedente: apenas Dilma punida, por exemplo, e Temer poupado
3. Ação ser considerada totalmente procedente: cassação de Temer e Dilma se torna inelegível
Há recurso?
Sim. As partes podem recorrer ao STF (Supremo Tribunal Federal)
O que dizem as defesas?
- Não houve gasto acima do limite ou despesas não comprovadas. Financiamento foi feito de forma lícita; não compete à chapa saber se o dinheiro doado era lícito
- A defesa de Temer ainda diz que os gastos do PT e do PMDB foram feitos individualmente e pede julgamento separado