Condenado a 37 anos pelo mensalão, o publicitário mineiro faz o diabo para sair do presídio em Contagem (MG). Até reeditar sua aliança com o PT. De olho em possíveis benefícios, como redução de pena, ele tenta emplacar na praça um dossiê fajuto que, por inconsistente, não pára em pé
Germano Oliveira - IstoE
Nos últimos dias, o advogado Jean Robert Kobayashi, que representa o publicitário Marcos Valério Fernandes, condenado a 37 anos e cinco meses de prisão por causa dos crimes cometidos no mensalão do PT, está tentando emplacar na praça um dossiê fajuto contra o senador Aécio Neves (PSDB-MG) e outros políticos tucanos. O documento difundido por Valério, que cumpre pena num presídio em Contagem, na região metropolitana de Belo Horizonte, faria parte de um esboço de uma suposta delação premiada que ele estaria disposto a fazer. Trata-se de uma operação aloprada que passa pela reedição de uma antiga aliança com o partido a quem serviu durante o primeiro mandato de Lula, o PT. Em troca do compromisso firmado pelo publicitário de implicar lideranças do PSDB em sua delação, o PT, por meio do governador petista Fernando Pimentel, responsável pela administração da cadeia de Contagem, tem garantido benefícios a Valério no presídio, como cela individual, que só pode ser concedida a quem tem curso superior. Não é o caso de Valério.
O problema é que a armação não se sustenta. Não resiste nem a uma avaliação cronológica dos fatos. Ao se verificar os dados disseminados pelo publicitário, se percebe que o dossiê é uma farsa. Valério diz, por exemplo, que em 1999, durante o governo Fernando Henrique, teria havido uma reunião entre o então presidente da Câmara, Aécio Neves, o ministro da Secretaria das Comunicações, Andrea Matarazzo, e o ministro das Comunicações, Sérgio Motta. O encontro teria sido marcado para acertar um repasse de dinheiro para tucanos proveniente das contas publicitárias da DNA, a empresa de Valério. As supostas propinas viriam de contratos da DNA com a Câmara dos Deputados e com a Fundacentro, do Ministério do Trabalho. A versão não pára em pé. É humanamente impossível que Motta tivesse participado de uma reunião em 1999, como quer fazer crer Valério. Afinal, Sérgio Motta morreu no ano anterior: 1998. Há ainda outra inconsistência grave. Aécio não era presidente da Câmara. A Casa era comandada por Michel Temer (PMDB). Na ocasião, Aécio era apenas mais um deputado. Ou seja, a tese de Valério se revela tão frágil como um castelo de cartas.
Na mesma linha, o dossiê apresenta outro erro grotesco. Valério diz ter participado em 2000 de uma reunião na residência oficial do presidente da Câmara, Aécio Neves, com o ministro da Secom Andrea Matarazzo para repassar aos tucanos 2% de uma conta de publicidade que a DNA tinha junto ao Banco do Brasil. De novo, há uma equívoco tendencioso de datas. Aécio só assumiu a presidência da Câmara em 2001. Além disso, em entrevista ao jornal “O Estado de S. Paulo” em 2012, o próprio Valério acusou o PT de instituir em 2013 um pedágio de 2% para os contratos de publicidade do governo federal. Contrariando o que ele mesmo disse lá atrás, agora o publicitário diz que o partido envolvido na propina de 2% foi PSDB, mostrando uma grande confusão mental. Em que momento, afinal, Valério diz a verdade?
Boquirroto
O material que o publicitário mineiro tenta emplacar na praça apresenta outros trechos risíveis. Ele garante que, em 2002, ajudou o ministro da Secom Andrea Matarazzo a amealhar R$ 20 mil para a campanha de Roberto Freire a deputado. Acontece que nessa época Matarazzo não era mais ministro de Estado. Havia sido nomeado por FHC embaixador do Brasil em Roma. Não bastasse isso, Freire sequer foi candidato a uma cadeira na Câmara naquele ano, pois estava em pleno exercício do mandato de senador por Pernambuco.
O material que o publicitário mineiro tenta emplacar na praça apresenta outros trechos risíveis. Ele garante que, em 2002, ajudou o ministro da Secom Andrea Matarazzo a amealhar R$ 20 mil para a campanha de Roberto Freire a deputado. Acontece que nessa época Matarazzo não era mais ministro de Estado. Havia sido nomeado por FHC embaixador do Brasil em Roma. Não bastasse isso, Freire sequer foi candidato a uma cadeira na Câmara naquele ano, pois estava em pleno exercício do mandato de senador por Pernambuco.
A quarta grande trapalhada de Valério foi dizer que, em 1998, repassou R$ 200 mil de caixa dois para a campanha de Aécio a deputado, por meio de um depósito que teria sido feito na conta de uma empresa de sua irmã Andrea Neves. Extratos da conta mostram, no entanto, Andrea já separou que o faturamento médio mensal dessa empresa – uma loja de carrinhos de bebê em Belo Horizonte – foi de R$ 7 mil naquele ano. Não há um depósito com valor dessa natureza.
O dossiê aloprado produzido por Valério, ao qual ISTOÉ teve acesso, chegou às mãos dos advogados do PSDB de Minas nos últimos dias. Diante das acusações levianas, o jurídico do partido estuda ingressar com uma ação na Justiça. A ideia é impedir também que ele obtenha os benefícios da delação. Valério é useiro e vezeiro no lançamento de bravatas. No afã de deixar a cadeia, o publicitário recorre a expedientes dos mais espúrios. Recentemente, ele prometeu implicar petistas no episódio da morte do prefeito de Santo André, Celso Daniel. Mas, na frente do juiz Sergio Moro, capitulou. Seria mais uma parceria de Valério com o PT?