Os eleitores gregos disseram não à austeridade administrada pelo governo do primeiro-ministro Antonis Samaras, dando a vitória no domingo ao partido de extrema esquerda Syriza, de Alexis Tsipras. Qual será o preço da vitória contra a austeridade imposta pela troica da União Europeia, Banco Central Europeu e FMI?
Após negociações para a formação de um governo de coalizão (no frenesi político, ele costurou esta coalizão com um pequeno partido de direita, Gregos Independentes), Tsipras, de 40 anos, tem um mandato para negociar com os credores internacionais a suavização da dívida de 240 bilhões de euros acumulada nos últimos cinco anos (a injeção foi concedida em troca da austeridade). Depois de seis anos de profunda recessão, a Grécia começa a engatinhar no crescimento. No entanto, o valor da previdência social caiu em 40% no período, a taxa de desemprego ainda é de 25% e 1 em 2 jovens não trabalha.
O desafio para Tsipras (que começou na política aos 16 anos como líder estudantil comunista) será equilibrar as promessas de campanha de menos sacrifícios populares e também as de não fazer nenhum loucura que leve a uma saída grega da zona do euro.
Contra a mensagem de medo empreendida por Samaras na campanha eleitoral, Tsipras posou de “extremista responsável”. Pudera. A extensão do programa de resgate europeu expira no final de fevereiro e a projeção é de que o país fique sem dinheiro no mais tardar em junho. Nas capitais europeias, existem acenos de que há margem de manobra para prorrogar o resgate grego e negociar a reestruturação da dívida.
Para o infeliz Tony Barber, do Financial Times (aquele que lamentou a “estupidez” do jornal Charlie Hebdo depois da chacina dos seus jornalistas), a pergunta é se no poder Tsipras será um Hugo Chávez ou um Lula? Que belo consolo! Bem, de certa maneira, há um consolo. Barber escreve que a previsão mais provável é a de que Tsipras não fique oito anos consecutivos no poder.
Mais ou menos irresponsável no seu extremismo, de acordo com a perspectiva de cada um, o fato é que o Syriza é o partido mais explicitamente contrário à austeridade que chega ao poder na Europa desde a crise econômica e um dos mais esquerdistas a vencer eleições na democracia europeia pós-guerra. Tsipras manda um recado contra os partidos convencionais de esquerda e de direita que se revezam no poder. Sua vitória representa o fim de quatro décadas de governo pelos conservadores da Nova Democracia, de Samaras, e os socialistas do Pasok.
Ambos têm se alternado no poder desde a volta da democracia em 1974, após sete anos de ditadura militar. Os partidos tradicionais levaram a Grécia para o buraco e o eleitorado concluiu agora que o buraco é ainda mais fundo com a austeridade encarnada na primeira-ministra alemã Angela Merkel.
Para Merkel, a âncora do projeto europeu, há um ardiloso desafio. Se ela mantiver a linha dura com o novo governo em Atenas, o desfecho poder á ser a saída da Grécia da zona do euro. Se ela amolecer, poderá reforçar os partidos populistas e extremistas na Europa e na própria Alemanha. Existe, portanto, o desafio duplo de conter o contágio financeiro e o contágio político.
A vitória do Syriza retoma não apenas o desafio para a zona do euro (com 19 países) manter sua atual configuração, mas a capacidade do establishment europeu (com seus partidos de centro-esquerda e de centro-direita) acomodar partidos extremistas. Existem os suspeitos habituais, como a Frente Nacional, na França, de extrema direita, com seu discurso sem ambiguidade contra o projeto europeu
No entanto, há casos mais complexos e não apenas o do Syriza, que apregoa uma identidade europeia. A vitória de Tsipras é acompanhada com muita atenção especiamente na Espanha devido à ascensão repentina de outro partido de extrema esquerda, o Podemos, de Pablo Iglesias, um acadêmico de 36 anos. Tsipras e Iglesias são filhos e herdeiros da grande e longa recessão europeia.
A questão que excita uns e inquieta outros é: se o Syriza pode, por que outros partidos de extrema esquerda e de extrema direita não podem?
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