segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

Metade das agências reguladoras federais está desfalcada

Vinícius Sassine - O Globo

Cinco dos dez órgãos funcionam com diretores interinos ou colegiados incompletos


Cinco das dez agências reguladoras do governo federal vêm funcionando com diretores interinos, cargos vagos no colegiado ou presidentes improvisados. A indicação de ocupantes desses cargos para sabatina e aprovação pelo Senado é uma atribuição da presidente da República, mas, em algumas situações, diretores estão no exercício da função há quase três anos sem seguir esse rito básico.

Das 26 diretorias nessas cinco agências, dez (38,4%) estão vagas, ocupadas por interinos ou gestores que acumulam função. Dilma Rousseff indicou ao Senado e retirou a indicação — gesto raro, segundo fontes no Congresso — os nomes de diretores da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) e da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).

O vaivém da presidente deixou desfalcadas as duas agências. A primeira cuida de concessões rodoviárias e ferroviárias que envolvem investimentos bilionários. A segunda fiscaliza planos de saúde. O desfalque na gestão ocorre ainda na Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), responsável por garantir a eficiência dos serviços pelas companhias aéreas; na Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), que cuida de outorgas na área; e na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que fiscaliza de medicamentos a agrotóxicos.

INDICAÇÕES EM FEVEREIRO

A Casa Civil, responsável por formalizar indicações da presidente, atribuiu ao Senado a responsabilidade pelo vazio em metade das agências. Ao GLOBO, a pasta comandada por Aloizio Mercadante sustentou que “em virtude das eleições, o ano de 2014 foi de baixa produção legislativa no Senado, sendo o final do ano marcado por esforço concentrado para aprovação da LDO, de medidas provisórias e legislações de natureza complexa”.

Nos cinco casos, o problema, na verdade, está na falta de indicação de nomes pela Presidência, e não num represamento de análises pelo Senado, segundo as próprias agências e as duas comissões responsáveis pelas sabatinas — a de Serviços de Infraestrutura e a de Assuntos Sociais. A Casa Civil disse que fará as indicações na abertura dos trabalhos legislativos, em fevereiro.

A situação mais crítica é da ANTT. Um único diretor, Jorge Luiz Bastos, foi sabatinado pelo Senado e nomeado pela presidente. Mesmo assim, ele está “em exercício” na diretoria geral, acumulando as funções. Os outros três diretores do colegiado são servidores de carreira que estão nos cargos de forma interina há quase três anos, desde 23 de março de 2012, por nomeação do ministro dos Transportes.

A Casa Civil argumentou que a indicação de diretores interinos em situação de vacância está prevista no decreto 4.130, de 2002. O decreto detalha o regulamento da ANTT. A interinidade, conforme o decreto, é determinada para que exista quórum nas deliberações do colegiado. Esta é uma alteração da legislação vigente, instituída pela própria presidente Dilma, por meio de outro decreto, de 20 de março de 2012. Três dias depois, os interinos foram nomeados diretores e permanecem desde então na função.

FUNCIONAMENTO PREJUDICADO

Em novembro de 2013, a Comissão de Serviços de Infraestrutura chegou a marcar a data da sabatina de um dos interinos, o advogado Carlos Fernando do Nascimento, indicado por Dilma. A presidente, no entanto, retirou as indicações de Nascimento, do ex-ministro Paulo Passos e de mais dois servidores para os cargos de diretores da ANTT — dois desses indicados já estavam na interinidade. Em 2012, a presidente sofreu um revés da base aliada: o Senado rejeitou a recondução de Bernardo Figueiredo para a diretoria geral da ANTT.

Uma auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) na ANTT, sobre irregularidades na condução de concessões rodoviárias, elogiou a existência de servidores de carreira nas diretorias do órgão, mas criticou a interinidade. O documento data de novembro de 2013 e o problema persiste. A ANTT sustenta que a interinidade não afetou as decisões da agência.

Na Anac, as diretorias de Infraestrutura Aeroportuária e de Operações de Aeronaves estão vagas. O regimento da agência não prevê nomeação de interinos. Em março, outro cargo de diretor deve ficar vago. Assim, não haverá quórum para deliberação colegiada e a análise de processos pode ser suspensa. “Aguardamos nomeação pela Presidência”, informou o órgão.

Na Anatel, um cargo de conselheiro está vago desde novembro. Já ANS e Anvisa são presididas por substitutos. Na primeira agência, Martha Oliveira é presidente interina desde o dia 10. O órgão também tem um diretor de Gestão interino. Na Anvisa, o diretor-presidente substituto, Jaime Cesar de Oliveira, acumula outras duas diretorias — uma delas também interinamente.

“Todos os diretores da ANS cumpriram o rito da indicação, sabatina e aprovação no Senado”, afirmou a assessoria de imprensa da ANS. A Anvisa, também por meio da assessoria, disse que o improviso não afeta “substancialmente” as atividades do órgão: “A presença de quatro diretores tem garantido sempre o quórum para as decisões do colegiado.”

O presidente da Associação Brasileira de Agências de Regulação (Abar), Vinicius Benevides, aponta o risco de decisões de diretores-gerais, adotadas por falta de quórum, não serem homologadas por um colegiado futuro:

— Toda vez que não há titulares, o funcionamento das agências fica prejudicado. Indicações são demoradas por conta de negociações políticas.