O que aconteceu com quase 650 mil brasileiros em idade ativa (com mais de 10 anos e capacitados para o trabalho) que deixaram de integrar a população economicamente ativa (PEA) por não estarem trabalhando nem estarem à procura de uma ocupação? A Pesquisa Mensal de Emprego (PME) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) constata uma redução da PEA nessa proporção entre 2013 e 2014, mas não contém dados que permitam saber para onde foram e de que passaram a viver essas pessoas. O que a pesquisa mostra é que essa redução vem gerando um resultado surpreendente: apesar da redução do número de brasileiros que têm uma ocupação regular, diminuiu também a taxa de desemprego. Parece paradoxal: menos pessoas trabalham e, mesmo assim, o desemprego diminui.
Por causa desse fenômeno estatístico - decorrente do uso de critérios expostos pelo IBGE em notas técnicas -, o desemprego em dezembro medido pela PME ficou em 4,3%, igualando o resultado de um ano antes, o menor de toda a série, iniciada em 2002.Esse resultado foi alcançado a despeito de a média anual da população ocupada ter diminuído de 23,166 milhões em 2013 para 23,087 milhões em 2014.
A PME abrange apenas as regiões metropolitanas do Recife, Salvador, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre. A pesquisa mais abrangente realizada trimestralmente pelo IBGE - a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad) Contínua - aponta uma taxa de desemprego maior do que a aferida pela PME. A edição mais recente da Pnad Contínua constatou uma taxa de desocupação de 6,8% no País no terceiro trimestre do ano passado.
A PME considera integrante da PEA as pessoas que exerceram trabalho, remunerado ou não, de maneira contínua ou interrompida, no período abrangido pela pesquisa. Também integram a PEA as pessoas desocupadas, mas que estavam dispostas a trabalhar no período de referência (de 30 dias) ou tomaram alguma providência efetiva para conseguir trabalho.
As demais pessoas em idade ativa que não estão nessa classificação são excluídas da PEA. Podem ser trabalhadores desalentados - dispostos a trabalhar, mas desestimulados pela dificuldade em encontrar emprego -, estudantes ou os que simplesmente decidiram não trabalhar. Este é o contingente ao qual se juntaram 646 mil brasileiros ao longo do ano passado, aumentando o número de inativos e reduzindo a PEA.
Manteve-se, no ano passado, o processo de formalização do mercado de trabalho, com o aumento proporcional do número de trabalhadores com carteira assinada. Eles representam 50,8% das pessoas ocupadas, índice 11 pontos maior do que o constatado em 2003 (39,7%). A média anual do rendimento habitual real da população ocupada, bem como a massa de rendimento real mensal habitual continuaram a crescer no ano passado. Estes são alguns dos pontos positivos do comportamento do mercado de trabalho em 2014 apontados pela PME.
Há outros que indicam a piora da situação. A redução do número de brasileiros que trabalham - embora estatisticamente não reduza na mesma proporção a taxa de desemprego - já seria suficiente para mostrar a deterioração do mercado de trabalho no ano passado, em consequência, sobretudo, da paralisia da economia, da resistência da inflação e da redução dos investimentos produtivos. Também a qualidade do trabalho se deteriora, como se pode constatar pela redução de 140 mil postos de trabalho na indústria entre novembro e dezembro do ano passado e de 105 mil entre dezembro de 2013 e dezembro de 2014. São empregos que, em geral, exigem melhor qualificação e, por isso, oferecem remuneração mais alta. Também no comércio, que até 2013 vinha compensando a redução do emprego na indústria, houve redução do número de vagas entre 2013 e 2014.
A contração da atividade econômica deve aumentar o número de desempregados. A redução da renda familiar decorrente disso pode forçar os atuais inativos a procurar trabalho, o que fará crescer tanto a PEA como a taxa de desemprego.