sexta-feira, 1 de agosto de 2014

Michael Pollan faz defesa bem-humorada da alimentação natural

O Globo

“Se realmente ouvir suas papilas gustativas, é como a diferença entre pornografia e sexo de verdade”, disse o escritor sobre fast food


O escritor Michael Pollan, fã incondicional da alimentação natural, não tolera fast food
Foto: André Teixeira / Agência O Globo
O escritor Michael Pollan, fã incondicional da alimentação natural, não tolera fast food - André Teixeira / Agência O Globo



Coma comida, coma pouco e coma vegetais. Esses são os três conselhos básicos do jornalista e escritor Michael Pollan para quem gostaria de se dedicar à alimentação saudável. Comida, neste caso, é aquela não processada e industrializada que ele vem renegando ao longo dos 15 anos em que pesquisa e escreve sobre o tema, em livros como “O dilema do onívoro” e “Regras da comida”. O mais recente, “Cozinhar”, ele lança agora na Flip, onde conversou nesta sexta-feira com o mediador Paulo Werneck, que substituiu Lúcia Guimarães, ausente por problemas de saúde.

Uma característica da obra de Pollan, destacou Werneck na longa apresentação inicial, é que o autor mergulha profundamente nos universos sobre os quais deseja escrever. Não foi diferente com “Cozinhar”: para analisar os efeitos dos alimentos no corpo humano, o americano conta ter transformado a própria cozinha num laboratório.

— Quis tentar aprender a cozinhar não apenas para o dia a dia, mas também aprender a fazer pão, fermentar cerveja, produzir queijo. Gosto de botar a mão na massa, escrever do ponto de vista da pessoa envolvida. Quando se escreve como jornalista, é muito mais fácil ser cínico — defende Pollan, cujos ensaios vão além da gastronomia para falar também de política, cultura e sociedade:

— A mesa de jantar é um espaço social importantíssimo onde você aprende ferramentas de cidadania, a compartilhar, a esperar sua vez. É o centro de gravidade da casa. A perda disso leva à piora da civilização.

No papo, Pollan disse ainda que todo o conhecimento acumulado em anos de pesquisa sobre comida não o deixou paranóico ou cheio de restrições sobre o que entra ou não em sua geladeira. Aliás, pelo contrário:

— Tudo o que aprendi me deixou muito mais relaxado. Porque a única restrição é comer comida de verdade, e tem muita comida de verdade por aí. Mas é preciso prestar atenção porque nem tudo que aparece no mercado com o rótulo de comida deveria ter a honra de ser chamado assim. Eu chamo de substâncias comestíveis. E você não deve comer essas coisas — disse, provocando risos na plateia.

O curador da Flip, Paulo Werneck (à esquerda), e o escritor Michael Pollan - André Teixeira / Agência O Globo


E se tem uma coisa que o escritor não tolera é fast food:

— É difícil convencer as pessoas, mas a verdade é que nem é tão bom! Se você realmente ouvir suas papilas gustativas, vai ver que é como a diferença entre pornografia e sexo de verdade.

O americano falou também do lado político de seu trabalho, que é parte de uma campanha chamada Food Movement, criada para pressionar todas as instâncias do governo dos Estados Unidos a lidar com o problema de alimentação no país.

— Obama nos decepcionou muito em relação a isso, embora a Michelle tenha algumas iniciativas e fale bastante sobre o tema. Eu vi que o Ministério da Saúde aqui no Brasil vai lançar em breve um manifesto bastante progressista sobre o assunto, então vocês deveriam prestar atenção nisso — alertou.

Bem-humorado, Pollan contou histórias sobre suas pesquisas para “Cozinhar”, como a da freira que o ensinou a a fazer queijo e acreditava que a iguaria devia se juntar ao pão e ao vinho na eucaristia da igreja.

—Acho que ela pode ter problemas com o Papa, disse, rindo.

Ele contou ainda que provou diversas comidas típicas do Brasil:

— Comi feijoada e gostei, mas gostei ainda mais de moqueca. E de acarajé também. Vou sair do Brasil mais gordo. Vocês têm uma das culturas de comida mais importantes do mundo e espero que defendam, porque o pessoal está doido para invadir isso aqui — afirmou, sob muitos aplausos, e depois se lembrou:

— Ah, e se cachaça for comida eu gostei muito também!