A história quase rocambolesca do ex-policial militar Fabrício Queiroz, próximo à família Bolsonaro, assessor do deputado estadual Flávio, eleito senador em outubro, continua mal explicada. E, pior, acaba de entrar num caminho que pode ser longo e acidentado, a depender da resposta do ministro do Supremo Marco Aurélio Mello ao pedido do senador para que as investigações sobre Queiroz tenham foro privilegiado, no STF. Um dos que votaram, em julgamento na Corte, por um conceito mais restrito de foro — só para casos ocorridos no mandato e em função do cargo —, por isso mesmo o ministro já indicou ontem que deverá rejeitar a demanda do senador.
Uma tramitação longa do imbróglio não interessa ao governo de Jair Bolsonaro, pai de Flávio, com menos de um mês de poder, e nem ao país, devido à crucial agenda de reformas que a nova administração precisa viabilizar junto ao Legislativo. Neste sentido, por ser evidente manobra protelatória, é reprovável a iniciativa do senador diplomado Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) de pedir ao Supremo que também invalide provas obtidas em investigações sobre suspeitos créditos e débitos na conta bancária de Queiroz. O que teme o senador? Por enquanto, apenas atraiu as atenções para si mesmo.
Queiroz caiu na malha do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) devido a estas atípicas movimentações financeiras. Passou pela conta do ex-assessor parlamentar R$ 1,2 milhão em um ano, cifra incompatível com sua renda.
Queiroz não foi detectado sozinho. Junto com ele, outros assessores, de 21 deputados, também chamaram a atenção do Coaf. Esta é a função do conselho, e, por isso, parece não ter base muito sólida a alegação do senador de que teve o sigilo quebrado sem autorização judicial. Ora, se ele também fez vultosos depósitos ou saques, o sistema do Coaf o identificou, e deve ter avisado ao Ministério Público. Como acontece com qualquer cidadão.
Os nomes de Queiroz e de outros assessores da Alerj estão em relatório do Coaf utilizado pela Operação Furna da Onça, do MP, que investiga corrupção na Assembleia do Rio. Uma das práticas ilegais que constam dos usos e costumes dos porões do Legislativo é o confisco de parte dos altos salários de assessores, que, para manterem o bom emprego, aceitam devolver uma parcela da remuneração. Queiroz pode ter sido o arrecadador no gabinete do deputado Flávio. Entre os contribuintes, filhas dele e a mulher, gente de confiança, como é indicado nestes golpes.
Jair Bolsonaro deu explicações plausíveis sobre os R$ 24 mil depositados em parcelas por Queiroz na conta da ainda futura primeira dama, Michele. Tratava-se, disse, do pagamento de dívida pessoal.
Mas há danos políticos para o presidente, eleito com a bandeira anticorrupção, já tendo inclusive feito críticas públicas duras ao foro privilegiado. Quanto mais rápido tudo for esclarecido, também melhor para ele. Mas Flávio demonstra querer ganhar tempo. Há um desentendimento aí.
E à medida que demoram os esclarecimentos, as dúvidas sobre o dinheiro de Queiroz crescem. Teria sido proveniente de “rolos” na compra e venda de carros, negócios tão rentáveis que permitiram ao ex-assessor se submeter a uma cirurgia no Einstein, hospital top de São Paulo, para extirpar um câncer.