“Bom dia, amados!” Janaina Paschoal, 44, costuma chamar seus interlocutores assim, amados ou lindos, nas redes sociais ou ao vivo.
Há um mês, com apoio de dois milhões de “amados”, ela ganhou uma cadeira na Assembleia Legislativa paulista e, de quebra, virou a deputada mais votada da história dos parlamentos brasileiros.
Superou em 200 mil votos o recordista na mais graduada Câmara dos Deputados, o colega do PSL Eduardo Bolsonaro, e multiplicou em quase sete vezes os 306 mil do ex-detentor da marca no Legislativo de São Paulo, Fernando Capez (PSDB).
Sergio Moro é o primeiro tema da uma hora de conversa com a Folha, no escritório de advocacia que tem com duas irmãs nos Jardins paulistanos. “Achei o máximo! Tô tão feliz”, afirma sobre a indicação do juiz responsável pela Lava Jato, numa sala com Bíblia, livros de direito, chocolates e um quadro com uma ilustração dela e da flâmula nacional, presente de um admirador.
Para a advogada, é tolo dizer que Moro agiu com interesses políticos ao condenar Lula à prisão, em 2017, ou ao levantar o sigilo sobre a delação do ex-ministro petista Antonio Palocci, a dias do pleito.
Afinal, quem levava fé em Bolsonaro? “Vamos falar a verdade, a maioria dos analistas sequer acreditava na vitória dele.”
Ela crê e não é de hoje. Filiou-se ao PSL do capitão reformado e quase foi sua vice. Na convenção que ungiu o presidenciável, indispôs-se com a militância ao dizer que boa parte dela “tem uma ânsia de ouvir um discurso inteiramente uniformizado”. E pediu: “Reflitam se não estamos fazendo o PT ao contrário”.
Já ela se diz aberta "ao contraditório".
Veja só: quando coassinou o impeachment de Dilma Rousseff (PT), vários de seus alunos alunos da Faculdade de Direito da USP, onde dá aula desde 1997 e de onde se afastará para ser parlamentar, não gostaram. Teve até encenação do enterro da Constituição em sala de aula.
“Pensei: ‘Ah, se estou de alguma maneira estimulando a arte, tudo bem”, conta e ri.
Se ela é do diálogo, dá para dizer que também o é Bolsonaro —alguém que, no passado e no presente, já falou em fechar o Congresso, fuzilar FHC e “a petralhada” e ameaçar a Folha por lhe desagradarem suas reportagens?
“Ele tem essas frases muito contundentes. Mas, no modo de ser, não é autoritário como o PT. É difícil sentar com petista sem ele te chamar de ignorante, se sentir superior.”
Nem sempre a esquerda é gentil com ela, que virou alvo de zombaria por seus discursos inflamados —como ao tuitar que, a partir da Venezuela, a Rússia estaria por um triz de atacar o Brasil. “Estão rindo? Bem típico: fazer a pessoa passar por burra, para que se cale. Mas comigo não!”
Em outro, girando a bandeira do Brasil feito hélice, responde a Lula ter dito que “a jararaca está viva”. Aqui, bradou, não é a “República da Cobra”. Pela cena, foi comparada com a garota de “O Exorcista”.
Quando Bolsonaro promete “botar um ponto final em todos os ativismos”, a opinião pública o entendeu mal, diz. Todo ativismo, do rural ao feminista, “acaba se tornando cruel” se “virar a única lente, e tenho a sensação de que é disso que ele está falando”.
Janaina acha, sim, que há doutrinação ideológica no ambiente de estudo, e a isso ela se opõe.
Conta que teve uma tese sua, "Religião e Direito Penal", reprovada na USP "logo depois do impeachment". Coincidência? Ela duvida.
"Entendi que teve um viés ideológico macro. A USP virou um ambiente petista", diz a "muito religiosa" deputada eleita, que percorre com desembaraço do catolicismo ao budismo.
Para Janaina, "o que acontece na universidade é emburrecimento em massa, o cara tem que dizer amém [para a cartilha da esquerda], se prostituir intelectualmente."
“Mas proibir temas me preocupa”, continua a criminalista. E se um aluno perguntar ao professor temas como homossexualidade? Ele deve dizer “vá para a casa e pergunte à sua mãe”?
Ela acha que não, por isso afirma ter ressalvas ao projeto Escola Sem Partido.
Não gosta que lhe digam o que deve ser. Quando usou lilás, cor associada ao feminismo, em sua campanha, ouviu: “Isso tá muito feminazi!”. E desde quando a pauta é monopólio da esquerda?, questiona a advogada que já foi confundida com assessora e cliente dos pares engravatados.
Diz ela que, se Bolsonaro fizer algo como retirar “conquistas da comunidade homossexual, LGBT, o que vocês quiserem chamar”, será contra. “Agora, falar que sou oposição... Acho isso tão infantil!”
A futura parlamentar ainda não sabe se brigará pela presidência da Assembleia —e direito ela teria, após ser partido conquistar a maior bancada na Casa, com 15 cadeiras, e ela, a maior votação de todos os tempos. Quer primeiro entender onde está pisando, diz.
Janaina não conta em quem votou, se em João Doria, o tucano que se agarrou no "bolsodorianismo" e acabou vencendo a disputa pelo governo de São Paulo, ou em Márcio França (PSB).
O PSL paulista se dividiu nessa: o presidente da legenda no estado, Major Olímpio, ojeriza Doria, já a deputada federal eleita Joice Hasselmann virou sua mais eficiente cabo eleitoral no segundo turno.
O que a advogada adianta é que, em seu mandato, priorizará uma bandeira cara a todos eles: segurança pública.
Não que concorde quando o governador eleito diz que, a partir de janeiro, a polícia tem que atirar para matar.
Por um lado, "não tem como enfrentar um revólver com buquê de flores, isso é fato". Mas chegar atirando em pessoas que não apresentam risco imediato "seria só execução", afirma.
Com um crucifixo no pescoço, Janaina Conceição Paschoal conta seu versículo bíblico preferido, no livro de Mateus: "Porque, onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome, aí estou eu no meio deles".