terça-feira, 25 de setembro de 2018

País envelhece, sofre com gargalos e experimenta retrocesso na saúde

Filas, dificuldade de acesso a especialistas, longo tempo de espera por cirurgias eletivas e emergências superlotadas. No caminho que percorre no sistema de saúde, o brasileiro se depara com situações caóticas, agravadas por problemas de organização da rede e escassez de recursos.
Área apontada em pesquisas como uma das principais preocupações da população, a saúde vive um paradoxo.
Em 30 anos, o SUS (Sistema Único de Saúde) consolidou-se como o maior sistema de saúde gratuito do mundo, atendendo a quase 75% da população do país.
A oferta de serviços, porém, é desafiada por um quadro crônico de subfinanciamento, que pode piorar nos próximos anos. Ao mesmo tempo, diante de uma projeção de aumento nos gastos, o sistema desperdiça recursos por conta da ineficiência.
Relatório do Banco Mundial indica que nos próximos 12 anos o SUS poderia economizar R$ 115 bilhões se buscasse mais eficiência na sua rede. Entre as sugestões, está a ampliação do programa ESF (Estratégia de Saúde da Família).
Recentemente, um novo ingrediente agravou ainda mais a situação: com a recente recessão econômica, mais de 3 milhões de pessoas perderam seus planos de saúde e muitos têm recorrido ao SUS.
O setor também tem registrado sinais preocupantes de retrocesso, com aumento nas taxas de mortalidade infantil e materna -e queda nos índices de vacinação.
Dados inéditos do Ministério da Saúde disparam um novo alerta: o crescimento no índice de mortalidade por doenças cardiovasculares, diabetes, câncer e doenças respiratórias crônicas na população de 30 a 69 anos. São mortes evitáveis e prematuras.
Um estudo publicado na revista científica "The Lancet" que analisou dados da carga de doenças nos últimos 30 anos conclui que o brasileiro passou a viver mais e melhor (as expectativas de vida ao nascer aumentou seis anos e a de vida saudável, cinco), mas essas melhorias não foram suficientes para eliminar as iniquidades em saúde.
Em outro paradoxo, o país vê avanços como a melhoria de indicadores de doenças transmissíveis. Mas, ao mesmo tempo, enfrenta o risco de ressurgimento de algumas consideradas eliminadas ou que estavam neste caminho, como o sarampo e a malária.
Embora as propostas para melhorar o setor sejam razoavelmente conhecidas, o país ainda derrapa para torná-las viáveis: aumento da cobertura de atenção primária, considerada porta de entrada do usuário na rede; maior organização da gestão por meio de regiões de saúde; e melhoria na integração dos dados do setor, segundo especialistas e estudos consultados pela Folha.
Nos próximos anos, o desafios serão ainda maiores, com o acelerado processo de envelhecimento da população e o consequente crescimento na carga de doenças crônicas, que são as que mais encarecem as despesas com saúde.
A partir de 2030, pela primeira vez na história, o país terá mais idosos do que crianças. Serão 41,5 milhões (18% da população) de pessoas acima de 60 anos contra 39,2 milhões (17,6%) das que terão de zero a 14 anos. Hoje os idosos somam 29,4 milhões (14,3% da população).
Se a reorganização do sistema de saúde já era necessidade, agora se torna urgência.
DEZ GARGALOS DE SAÚDE NO BRASIL
1 - Pouco gasto público em saúde 
O SUS vive um crônico subfinanciamento, menos da metade do gasto total em saúde é público. Além de pouco, parte dos recursos é desperdiçada por ineficiência
2 - Atenção primária pouco resolutiva 
A cobertura da Saúde da Família ainda é baixa, muitas equipes trabalham em situações precárias e estão sobrecarregadas
3 - Ambulatórios e emergências sobrecarregadas 
Enfrentam sobrecarga de pacientes de baixa complexidade, fluxos desorganizados e pouca oferta de especialistas e exames
4 - Excesso de médicos nos grandes centros urbanos 
País tem dificuldade em fixar médicos em cidades menores e mais distantes das capitais e vê piorar a qualidade da formação
5 - Hospitais pequenos e pouco eficientes 
Cerca de 80% dos hospitais do país são pequenos e com baixa taxa de ocupação de leitos, o que os tornam pouco eficientes
6 - Falta de leitos em hospitais gerais 
Pacientes sem chances de cura ocupam leitos de UTI quando poderiam ser cuidados em centros médicos fora de hospitais
7 - Não há integração de dados 
Não há trabalho em rede ou coordenação do cuidado, com repetição desnecessária de exames
8 - Falta avaliação de desempenho e qualidade 
Por falta de medição e divulgação de indicadores de custo e de qualidade, não é possível remunerar pelo desempenho da assistência
9 - Gestores sem formação técnica 
A maioria dos gestores do SUS é escolhida por indicação política, ao contrário de outros países que valorizam formação técnica
10 - Falta de foco no idoso e no doente crônico 
País está envelhecendo e vive aumento da prevalência de doenças crônicas, mas falta política de saúde voltada para essa população

Medidas podem gerar ganhos de quase R$ 22 bi por ano para o SUS


Atacar as áreas de ineficiência no SUS (Sistema Único de Saúde) é o caminho para o país evitar desperdícios na ordem de R$ 22 bilhões por ano e chegar a uma situação mais equilibrada nas contas do setor.
A análise vem de um novo relatório do Banco Mundial que faz projeções do impacto financeiro em 12 anos se o país adotar medidas para tornar o SUS mais eficiente.
Na atenção primária (unidades básicas de saúde), são estimados desperdícios na ordem de R$ 9,3 bilhões, se somados os três níveis de governo. Na média e alta complexidade (ambulatórios e hospitais), em R$ 12,7 bilhões.
Segundo o documento, a continuar as tendências atuais de crescimento nominal dos gastos em saúde pública, o montante atingirá R$ 700 bilhões até 2030 -sem considerar o envelhecimento populacional, o aumento da carga de doenças crônicas e a incorporação de tecnologias.
Com mais eficiência, os gastos poderiam ficar em R$ 585 bilhões, ou seja, um ganho de de R$ 115 bilhões. "Isso poderia mitigar esses impactos e proporcionar espaço fiscal necessário para a consolidação do SUS, viabilizando investimentos em áreas-chave", afirma Edson Araújo, economista sênior do Banco Mundial.
Entre as medidas propostas, estão a expansão de equipes da ESF (Estratégia Saúde da Família) que atendem nas unidades de saúde e a criação de redes de saúde para prover os municípios pequenos na média e alta complexidade.
Atualmente, especialistas avaliam que são transferidas muitas responsabilidades para os municípios, o que acarreta um descompasso entre o que se espera que eles executem e a capacidade real de entregar os serviços.
Quase 70% dos municípios têm até 20 mil habitantes. Quanto menor, mais ineficiente se mostra para prover toda a gama de serviços de saúde que é responsável, segundo dados do Banco Mundial. Na média complexidade, municípios com menos de 5.000 habitantes têm desempenho quatro vezes pior do que aqueles com mais de 100 mil.
Uma das razões é o grande número de hospitais pequenos. Cerca de 55% deles têm menos de 50 leitos e metade da eficiência de instituições maiores, com mais 300 leitos.
"A municipalização não deu certo em termos de escala. Poucos lugares no mundo têm tantos hospitais pequenos. No Brasil, há um paradoxo: falta leito por habitante e há muitos hospitais pequenos", diz Araújo.
As taxas de ocupação de leitos no país também são muito baixas, em média 45% para todos os hospitais do SUS e apenas 37% para os leitos de cuidados agudos (muito abaixo da taxa de ocupação desejável, entre 75% e 85%).
"Além da baixa eficácia, hospitais pequenos podem trazer riscos. Mas não precisa fechar tudo. Podem ser reaproveitados para outras finalidades, como centro-dia [locais de convivência para idosos] e alojamentos para pacientes convalescentes", diz Ana Maria Malik, coordenadora do GVSaúde, programa de gestão em saúde da Fundação Getulio Vargas.
Apesar de considerar que, do ponto de vista de custos, hospitais com menos de 50 leitos não têm viabilidade econômica, Gastão Wagner, da Abrasco (Associação Brasileira de Saúde Coletiva), concorda que o caminho não é fechar essas unidades, mas sim mudar a finalidade delas.
"Podem ser transformados em unidade mista, com uma ou duas equipes de saúde da família, sala de parto e estrutura ambulatorial. É uma forma de aumentar a eficiência e atender a população, que não fica desguarnecida", diz.
Na avaliação de especialistas, como Gonzalo Vecina Neto, professor da Faculdade de Saúde Pública da USP, é preciso recuperar o tempo perdido com a municipalização e estruturar as regiões sanitárias, com regulação de acesso.
Isso se traduz pela criação de redes integradas de saúde, ou seja, grupos de municípios menores que se unem e dividem um mesmo sistema com provedores de serviços de saúde, como laboratórios, ambulatórios e hospitais.
O desafio, porém, é a coordenação desses cuidados. Hoje a fragmentação da rede do SUS resulta em duplicação de serviços, perda de economia de escala e custos operacionais mais elevados.
"Atualmente existem algumas iniciativas, mas não trabalham em conjunto com toda a cadeia de assistência, não têm clareza do funcionamento, da logística, da governança. Não funcionará se não houver pessoas dispostas a trabalhar em rede, em abrir mão de preferências pessoais", diz Ana Maria, da FGV.
Segundo Gastão Wagner, da Abrasco, no Brasil já existe uma divisão nas chamadas "regiões de saúde", mas falta gestão dessas estruturas.
"É preciso criar um fundo com contribuição de cada estado para hospitais daquela região que vão ser integrados em rede. Não seria só na área hospitalar, mas também na vigilância e enfrentamento de epidemias."
FALTAM MÉDICOS NOS MUNICÍPIOS COM ATÉ 20 MIL HABITANTES
O SUS enfrenta também desafios relacionados à disponibilidade, distribuição e desempenho de seus profissionais de saúde, de acordo com o relatório do Banco Mundial.
Hoje, essa distribuição é marcada por desigualdades, como muitos médicos trabalhando em áreas urbanas no setor privado ou atendimento especializado. Nos municípios brasileiros com até 20 mil habitantes (70% das cidades do país), há menos de 0,40 médico por mil habitantes.
Nas 42 cidades com mais de 500 mil habitantes, a taxa é bem maior, de 4,33 profissionais por mil moradores.
Uma saída defendida pelo Banco Mundial e pela Opas (Organização Panamericana de Saúde) é aumentar a atuação clínica da enfermagem, como ocorre países como Reino Unido e Canadá, com sistemas universais de saúde.
Mas há resistência dos conselhos médicos. Em 2017, o CFM (Conselho Federal de Medicina) ingressou com ação na Justiça tentando proibir que enfermeiros do SUS façam consultas e prescrição sob alegação de que invadiriam as atribuições dos médicos, mas, no final, o processo foi arquivado pelo Tribunal Regional Federal da 1ª região.
"Nas equipes de saúde da família, há um bom relacionamento entre médicos e enfermeiros. O problema está nos conselhos e nos sindicatos médicos", diz Manoel Neri, presidente do Cofen (Conselho Federal de Enfermagem).
Outro desafio é formação profissional. Nem sempre os enfermeiros saem das faculdades preparados para assumir essas responsabilidades.
Para Donizetti Giamberardino, coordenador da comissão de defesa do SUS do CFM, o sistema deve ser multiprofissional, mas sem substituição do médico por outro profissional da saúde.
"Defendemos os princípios de universalidade e equidade do SUS, a mesma medicina de qualidade para todos."
Para ele, não é possível importar soluções de países com realidades econômicas diferentes da brasileira e muito menos tomar decisões visando apenas a gestão financeira em detrimento da qualidade.
Outra iniciativa que geraria mais eficiência à atenção primária é a expansão do programa saúde da família, cuja cobertura está estagnada em 65% da população. A meta seria atingir 100%.
Segundo Mauro Junqueira, presidente do Conasems (Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde), o custo mensal de cada equipe é de R$ 35 a 40 mil, mas o governo federal só repassa aos municípios R$ 10 mil. "Existem municípios que até poderiam expandir [as equipes de saúde da família], mas, com isso, ferem a Lei de Responsabilidade Fiscal", afirma.
Muitas equipes estão sobrecarregadas. Cada uma deveria cuidar de grupos de até 2.000 moradores e hoje atende até o dobro disso. Também falta agregar tecnologia para tornar a atenção primária mais resolutiva, segundo o médico de família Roberto Umpierri, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
"Tem equipe que não consegue pedir um raio-x de tórax ou um eletrocardiograma de esforço, o que obriga o paciente a procurar um especialista e aguardar meses na fila", afirma Umpierri.
Mais resolutiva, a atenção primária poderia desafogar tanto os ambulatórios de especialidades quanto as emergências dos hospitais, que vivem lotadas de pacientes de baixa complexidade.
Os especialistas também são unânimes em apontar a integração de dados em saúde como outra peça fundamental para melhorar a eficiência do setor.
"O ideal seria que cada pessoa ao nascer tivesse um cadastro único de saúde que pudesse ser acessado por ela e pelos profissionais de saúde que vão atendê-la ao longo da vida", diz o economista Paulo Furquim, do Insper, que realiza estudos na área da saúde.

Setor discute como obter mais verbas em quadro de restrições


Responsável pelo atendimento à saúde de 7 em cada 10 brasileiros, o SUS (Sistema Único de Saúde) vive um dilema entre encontrar alternativas para superar o subfinanciamento, um dos seus principais entraves, e aumentar a eficiência no uso dos recursos disponíveis.
A Organização Mundial de Saúde aponta que, em 2015, ano dos dados mais recentes, o país gastou em saúde o equivalente a 3,8% do PIB (Produto Interno Bruto) ou US$ 333 (cerca de R$ 1.288) por pessoa.
Para comparação, em países como Argentina e França, esse valor foi de US$ 713 e US$ 3.178 no mesmo ano, respectivamente.
"Se pegar o quanto aplicamos em valores per capita somando União, estados e municípios, é pouco mais do que a Namíbia", diz Élida Graziane, procuradora do Ministério Público de Contas de São Paulo.
Esse descompasso também aparece na comparação dos gastos em saúde na rede pública em relação ao setor privado. Atualmente, 54% do total desses gastos ocorrem na rede privada, que atende cerca de 50 milhões de brasileiros. O restante, ou 46%, está na rede pública, que atende mais de 150 milhões.
Se as contas já estavam difíceis, a entrada em vigor de novas regras para cálculo dos recursos federais destinados à saúde têm aumentado a preocupação do setor.
Desde o início do ano, a União tem o orçamento calculado com base nas regras da emenda constitucional 95. A medida, conhecida como "teto de gastos", prevê que o valor a ser investido pela União em saúde seja o equivalente aos gastos do ano anterior, ajustados pela inflação.
Para especialistas, porém, a mudança acaba por congelar os recursos à saúde -a estimativa é R$ 400 bilhões sejam perdidos até 2038. Um impacto que pode ser sentido já no próximo ano.
"Nossa preocupação é que a nova regra diminua o orçamento. Se o governo não conseguir liquidar o que chama de "restos a pagar", não entra como gasto efetivado. E se restos a pagar não é liquidado, é cancelado", diz Eli Iola Gurgel, economista especialista em saúde e professora da Faculdade de Medicina da UFMG.
Por meio de modelos matemáticos e estatísticos, um estudo publicado em maio na revista internacional PlosMedicine projetou 20 mil mortes a mais de crianças até 2030 caso as medidas de austeridade fiscal sejam mantidas.
O aumento estaria associado ao corte de verbas em programas sociais, como o Bolsa Família, que transfere renda diretamente às famílias de pobreza extrema, e o ESF (Estratégia de Saúde da Família).
Cortes nesses programas têm sido apontados como uma das razões para a alta da taxa de mortalidade infantil em 2016, após 26 anos de queda. O impacto maior seria nas chamadas mortes evitáveis, causadas por diarreias e pneumonias, que são influenciadas pela perda de renda das famílias, estagnação de programas sociais e cortes na saúde pública.
Em meio a esse impasse, a discussão sobre o financiamento da saúde deve agora chegar à Justiça.
A previsão é que o STF (Supremo Tribunal Federal) analise ainda neste semestre uma ação da Procuradoria-Geral da República que questiona as regras da chamada emenda constitucional 86, conhecida como "orçamento impositivo".
O modelo, que determinava que fossem aplicados percentuais de 13,7% a 15% da receita corrente líquida na saúde, foi usado para definir o orçamento de 2016. Para a Procuradoria, no entanto, a medida leva à redução de recursos ao estabelecer percentuais menores do que definido em regras anteriores e por retirar recursos da exploração de petróleo como "fonte adicional" da saúde.
Embora a emenda já tenha sido substituída pelo chamado teto de gastos, especialistas dizem que uma decisão a favor da suspensão pode recuperar recursos para a saúde e abrir precedente na análise de outras ações sobre o tema.
"Se o Supremo for no sentido de que não cabe retrocesso, a tendência é ter uma linha interpretativa coerente", diz Graziane.
Já há ao menos seis ações à espera de análise no STF que questionam impactos da emenda do teto de gastos. Uma delas, proposta pelo PDT, pede que a Corte exclua desse limite os gastos com educação e saúde.
O pedido tem sido reforçado por secretários de saúde do país, mas não encontra eco no governo federal. Em congresso com secretários de saúde no fim de julho, o ministro Gilberto Occhi defendeu que a medida não fosse suspensa, mas "aprimorada".
"Todos querem revogar [a emenda do teto], mas acho que precisamos melhorar a emenda. Ao melhorarmos a arrecadação no país, poderemos aumentar o financiamento do SUS. Defendo o avanço e a melhoria da regra que hoje está posta", disse.
Questionado sobre que tipo de mudança poderia ser feita, o Ministério da Saúde não respondeu. Em nota, diz que a emenda 95 "protege a saúde de ter seu piso de gastos reduzido mesmo em momentos de contração da economia e de queda de receita. Não há para a saúde um teto de gastos e sim um piso", diz.
Já para Mauro Junqueira, do Conasems (Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde), os municípios têm tido dificuldade em arcar com o aumento de gastos. De 2002 a 2016, a participação da União nos gastos com saúde caiu de 60,6% para de 43,1%. Já a dos municípios passou de 17,3% para 27,3%.
"Precisamos ter mais fôlego para dar conta", afirma ele, que defende mudanças no pacto federativo, com melhor distribuição das responsabilidades de União, estados e municípios, além de revisão nas regras de isenção fiscal concedida a alguns setores.
Se faltam recursos, também falta melhor gestão. Um balanço divulgado pelo CFM (Conselho Federal de Medicina) e pela ONG Contas Abertas em março deste ano aponta que cerca de R$ 174 bilhões deixaram de ser aplicados pelo Ministério da Saúde entre 2003 e 2017.
O valor representa 11% do total autorizado no período, que foi equivalente a R$ 1,6 trilhão. Quase metade dos recursos não usados deveriam ter sido destinados a obras e compra de equipamentos médicos para atender ao SUS.
"Tem que ter aumento do financiamento acompanhado de eficiência. Não adianta gastar mais sem ter métricas de qualidade", afirma o economista Paulo Furquim de Azevedo, professor do Insper.
Além do subfinanciamento, o modelo de transferência de recursos federais à saúde também tem sido alvo de debates.
Em dezembro, uma portaria do ministério passou a flexibilizar as regras de repasse de recursos da União a estados e municípios e permite que esses possam decidir como aplicar essas verbas.
Até então, esses recursos eram "carimbados" e enviados para uso específico em determinadas áreas, sem que pudessem passar para outras. Um recurso da atenção básica, voltado para unidades de saúde, não poderia ser destinado a hospitais.
Com a mudança, cabe ao gestor definir onde a verba será aplicada, desde que preste contas disso. Os recursos passam a ser divididos em apenas duas categorias: custeio e investimento.
A medida, que passou a ser aplicada neste ano, atende a uma demanda dos municípios, para os quais o modelo anterior deixava recursos "engessados" nas contas e impedia a aplicação em programas de maior necessidade. Especialistas, no entanto, alegam que a medida gera preocupação -sobretudo em relação ao controle dos gastos.

Com consultas de enfermeiros, acesso à saúde cresce 30% em Florianópolis


O aposentado José Manuel Vasques, 65, chega à unidade de saúde para renovar a receita do anti-hipertensivo. Diabético e um pouco anêmico, ele é acompanhado por uma equipe de saúde da família em Florianópolis (SC).
No consultório, o enfermeiro Mateus da Silva Kretzer pergunta como Vasques está se sentindo, olha o prontuário no computador, checa as medicações usadas e mede a pressão arterial. Tudo em ordem. Quinze minutos depois, o aposentado é liberado.
"Às vezes, me consulto com a médica, outras passo só com o enfermeiro. Mas nunca saio daqui sem ser atendido", diz o aposentado que perdeu o plano de saúde em 2013 e desde então é atendido no SUS.
Capital com a maior cobertura de saúde da família do país, Florianópolis tem capacitado a enfermagem para fazer consultas, prescrever remédios, renovar receitas, além de pedir exames de acompanhamento do paciente (por exemplo, de glicemia).
Nas unidades de saúde, esse profissional tem consultório próprio e divide com o médico de família o cuidado de diabéticos e hipertensos controlados, o acompanhamento do pré-natal de baixo risco e a testagem e o tratamento de pessoas com HIV e sífilis, entre outras doenças, além de exames preventivos de câncer de colo uterino e de mama.
Matheus Altenhofen Ribeiro é vacinado no colo de sua mãe Tania Altenhofen Ribeiro no Centro de Saúde Itacorubi em Florianópolis.
Matheus Altenhofen Ribeiro é vacinado no colo de sua mãe Tania Altenhofen Ribeiro no Centro de Saúde Itacorubi em Florianópolis. -Lalo de Almeida/Folhapress
Desde 2013, quando os enfermeiros passaram a ter uma atuação clínica mais efetiva, com base em protocolos, houve um aumento de 30% do acesso da população aos serviços de saúde, chegando a 210.404 pessoas em 2016 (últimos dados consolidados).
"O importante foi não só aumentar o acesso mas qualificar a rede, garantir que o serviço seja prestado dentro da melhor evidência científica existente", afirma Elizimara Siqueira, responsável pela enfermagem da rede municipal de Florianópolis e conselheira do Conselho Regional de Enfermagem de Santa Catarina.
Os protocolos clínicos de enfermagem de Florianópolis seguem recomendações do Ministério da Saúde e do Cofen (Conselho Federal de Enfermagem). Também se baseiam em diretrizes de instituições renomadas como BMJ (British Medical Journal) e e Cochrane (uma rede de cientistas independentes que investigam a efetividade de tratamentos).
O tratamento inicial de sífilis na capital triplicou. Entre 2013 e 2016, a média de casos novos atendidos por médicos e família e clínicos-gerais, era de 20 por mês.
A partir de 2016, já com a enfermagem treinada para esse tipo de cuidado, o número mensal de novos pacientes pulou para 70. Os enfermeiros fazem o teste rápido para a detecção da doença e, se positivo, imediatamente já medicam o paciente com penicilina.
"Em muitos lugares do nosso país, a gente vê a doença na nossa cara e não pode tratar", diz a enfermeira Anna Carolina Rodrigues, do departamento de vigilância de Florianópolis.
Em outras situações, porém, a enfermagem faz o trabalho de diagnóstico e tratamento da sífilis de forma camuflada, com aval do médico da unidade.
"É muito frequente em unidades de saúde do país o enfermeiro bater na porta do médico já com a prescrição pronta [de penicilina] e só pedir para ele assinar", diz Elizimara.
Uma recente parceria entre a Opas (Organização Panamericana de Saúde) e o Cofen quer ampliar a atuação clínica dos enfermeiros no SUS como forma de aumentar o acesso e a eficiência dos serviços de atenção básica à saúde, como ocorre em países como Reino Unido e Canadá. Relatório do Banco Mundial também faz a mesma recomendação.
O enfermeiro Mateus da Silva Kretzer atende um paciente no Centro de Saúde Itacorubi em Florianópolis.
O enfermeiro Mateus da Silva Kretzer atende um paciente no Centro de Saúde Itacorubi em Florianópolis. - Lalo de Almeida Folhapress
A proposta é treinar esses profissionais para uma enfermagem de práticas avançadas, que envolverá um mestrado profissional ou uma residência na especialidade.
Mas a atuação clínica desses profissionais enfrenta resistência dos conselhos médicos. Ano passado, o CFM (Conselho Federal de Medicina) ingressou com ação na Justiça tentando proibir essas atividades da enfermagem sob alegação de que elas invadiriam as atribuições dos médicos. O caso foi arquivado.
Para Donizetti Giamberardino, coordenador da comissão de defesa do SUS do CFM, o embate não é motivado por corporativismo, mas sim por uma busca de igualdade de condições para o paciente SUS.
"Defendemos os princípios de universalidade e equidade do SUS, a mesma medicina de qualidade para todos."
Segundo ele, o sistema deve ser multiprofissional, mas sem substituição do médico por outro profissional da saúde. Afirma ainda que os protocolos clínicos de enfermagem geram uma preocupação em relação à segurança do paciente porque o diagnóstico envolve muitas nuances que só o médico está capacitado para entendê-las.
No entanto, entre médicos de família e enfermeiros de Florianópolis, a convivência é harmônica. "Há um respeito mútuo e uma união de esforços para fazer o melhor possível pelo paciente. Sem o trabalho da enfermagem, não daríamos conta de atender a todos", diz a médica de família Danusa Graeff Chagas Pinto, coordenadora de uma unidade de saúde no bairro Saco Grande.
"Nossa prática não vem substituir o papel do médico em nenhum serviço de saúde. A ideia é fornecer à população o que lhe é direito e nós temos formação técnica para suprir, mas, por ignorância de gestores, nem sempre conseguimos executar", diz a enfermeira Anna Carolina.
Quase dois terços dos 303 enfermeiros da capital catarinense têm formação em medicina de família. O município mantém uma residência na especialidade para médicos, enfermeiros e outros profissionais da saúde.
A enfermeira Andrea Paula Hass faz uma consulta de aconselhamento antes de realizar um teste rápido de HIV em um paciente no Policlínico Centro em Florianópolis.
A enfermeira Andrea Paula Hass faz uma consulta de aconselhamento antes de realizar um teste rápido de HIV em um paciente no Policlínico Centro em Florianópolis. - Lalo de Almeida/Folhapress
"A gente não abre mão da evidência. Tanto para a segurança do profissional quanto para o do paciente. E não é só um copia e cola dos estudos. Levantamos toda a evidência de um tema, há uma comissão que opina, questiona. A rede é parte da construção do protocolo", explica Elizimara.
Os protocolos também são baseados nas demandas diagnosticadas na ponta, ou seja, no tipo de problema que mais está chegando ao posto de saúde. Um deles, por exemplo, é sobre o tratamento da dor, de feridas e da tosse.
"O enfermeiro cuida de 85% a 90% da demanda espontânea [sem agendamento]. A gente não quer estar porta de entrada só fazendo triagem do que o médico vai atender ou não atender. A gente quer ser resolutivo", diz Elizimara.
A enfermagem trabalha ainda com busca ativa de pacientes com doenças infectocontagiosas e os crônicos. "Se o paciente se ausenta ou não conclui determinado tratamento, temos o hábito de ir atrás." Os profissionais também foram capacitados para comunicações difíceis, por exemplo, como dar a notícia que o paciente tem HIV.
"A gente sensibiliza o paciente a fazer o teste, estabelece um vínculo com ele e não pode perder a oportunidade de tratá-lo. Não faz sentido dizer: "agora [com o resultado positivo] você volta outro dia para passar com o médico." Você perde o paciente", explica a coordenadora.

Brasil tem aumento em taxa de mortes prematuras por doenças crônicas


Mal iniciou a caminhada no Parque da Cidade, em Brasília, Adriana Balthar sentiu o corpo dar sinais de alerta. Primeiro, veio uma sensação de desmaio. Em seguida, já deitada na grama, teve convulsões.
O diagnóstico de AVC, porém, era só uma das batalhas que enfrentaria nos últimos sete anos. Dez dias depois de ser socorrida no parque, acabou por sofrer um segundo AVC, ainda mais devastador.
"Acordei na UTI e não mexia absolutamente nada. Aos 42 anos, me vi como uma criança de dois, tendo que usar fralda e reaprendendo a falar", relata ela, que, no meio da recuperação, também enfrentou uma recidiva de um câncer de colo de útero.
Hoje, considera já ter recuperado 95% dos movimentos. Os cuidados, porém, continuam -e são diários. "Se não faço exercício com regularidade, sinto que vou perdendo a força do lado direito", diz.
Adriana é um exemplo do impacto gerado na vida de pacientes e no sistema de saúde pelo avanço crescente das doenças crônicas não transmissíveis no Brasil e no mundo.
Entram na lista doenças cardiovasculares, diabetes, câncer e enfermidades respiratórias crônicas, fatores que respondem por cerca de 7 em cada 10 mortes de brasileiros.
O problema é que, se antes o país vinha apresentando sucesso em tentativas de controle de complicações e óbitos causados por essas doenças, agora, essa frente volta a preocupar.
Levantamento inédito do Ministério da Saúde, obtido pela Folha, mostra aumento na taxa de mortalidade geral e prematura no Brasil por causa das principais doenças crônicas.
Em 2016, ano dos dados disponíveis mais recentes, doenças cardiovasculares, câncer, diabetes e doenças respiratórias crônicas responderam por 421 mortes a cada 100 mil habitantes. Para comparação, até 2015, essa taxa vinha em queda, com 418,9 mortes nessa proporção naquele ano.
Na população entre 30 a 69 anos, que engloba a faixa de mortes prematuras, a alerta é ainda maior. Em 2016, a taxa foi de 354,8 mortes a cada 100 mil habitantes. Um ano antes, era de 350,7.
Até então, apesar do aumento de casos dessas doenças no sistema de saúde, o crescimento populacional e o estímulo a políticas de prevenção permitiam ao país manter as taxas de mortalidade precoce em queda.
"Vemos um pequeno aumento em relação ao ano anterior, o que não ocorria desde 2000", afirma a diretora do departamento de doenças não transmissíveis do Ministério da Saúde, Fátima Marinho.
A variação nas taxas também tem preocupado especialistas que monitoram o mesmo cenário. "Estamos assustados. O que observávamos é que o Brasil estava sempre com uma queda. E entre 2015 e 2016, vimos uma estabilidade e risco de aumento", diz Deborah Malta, professora associada da UFMG e coordenadora no Brasil do estudo Carga Global de Doenças.
Segundo ela, com o envelhecimento populacional, já é esperado um aumento no número de mortes por essas causas -mas não na população jovem. "Morrer por doença crônica provavelmente é o futuro de grande parte da população brasileira, mas não morrer prematuramente."
Apesar do quadro, o governo federal afirma que ainda é cedo para verificar com clareza uma mudança de tendência. Mas admite o alerta.
"Já tínhamos no Brasil uma taxa de mortalidade prematura mais alta que países desenvolvidos e do que outros países da América Latina", diz Marinho, que lembra que se tratam de mortes evitáveis. "Se tenho um repique de aumento como esse no meio de uma tendência de redução, corro risco de inverter o que estava ganhando", avalia.
De acordo com a diretora, a interrupção da queda e o aumento de casos tem sido puxada principalmente pelo crescimento na taxa de mortalidade por AVC e doenças isquêmicas do coração.
A situação faz o país deixar de cumprir a principal meta do Plano Nacional de Enfrentamento de Doenças Crônicas, firmado em 2011 e que segue até 2022. O plano previa uma redução de ao menos 2% ao ano nas taxas de mortalidade entre pessoas de 30 a 69 anos. Nos últimos anos, essa redução chegou a até 5% ao ano.
Também coloca em risco a previsão de reduzir em até 25% as mortes por doenças crônicas até 2025, compromisso firmado com a Organização Mundial de Saúde (agora revisto para 30% nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, que seguem até 2030).
"Naquele momento, a previsão era que conseguiríamos. Hoje, a projeção mostra que não. Se continuarmos como estamos, não vamos cumprir a meta", diz Marinho.
A pasta já organiza reuniões com secretários de saúde para definir medidas que podem ser adotadas.
Mas o que leva a esse aumento? Segundo Malta, embora o avanço do envelhecimento no país seja acompanhado pelo crescimento das doenças crônicas, isso não explicaria a estabilidade na taxa de mortes prematuras.
Para ela, o cenário pode estar ligado à crise recente, que tem impacto no acesso ao emprego e no sistema de saúde.
Marinho concorda. "São doenças que respondem muito a crises econômicas e sociais, porque estão relacionadas à hipertensão, ao estresse e à depressão, que também gera piora do diabetes. A faixa etária mais atingida é justamente aquela que o desemprego afetou", diz a diretora.
Outro motivo é uma possível piora nos níveis de assistência em alguns estados devido ao aperto nas contas.
"Já é provado que uma parte da redução das mortes por doenças cardiovasculares ocorreu devido à tecnologia. Serviços de saúde bem equipados fazem a diferença nessas doenças. Mas se tem piora na situação socioeconômica, há piora na assistência. Existem empregados que ficaram sem planos de saúde e vieram para o SUS", completa.
Desde 2014, quase 3 milhões de pessoas perderam seus planos de saúde em razão do desemprego. Para a Secretaria da Saúde do Estado de São Paulo, esse é um fatores que explicariam o grande aumento nos atendimentos de emergência nos hospitais estaduais nesse período: de 63,3 milhões, em 2014, para 84,4 milhões em 2017.
São Paulo foi o estado com a maior perda de beneficiários de planos de saúde em 2017: 160.226 pessoas deixaram de ser clientes do setor privado. A cabeleireira Eliane Barbosa é uma delas. Está sem plano desde 2016 e passou a usar o SUS. "Eu e meu filho fomos muito bem atendidos no postinho perto de casa. Meu medo é aparecer alguma coisa que dependa da internação."
CONTROLE DE FATORES DE RISCO PASSA POR ESTAGNAÇÃO NO PAÍS
O aumento nas mortes por doenças crônicas ocorre em conjunto com sinais de alerta no monitoramento de alguns fatores de risco.
É o caso da prática de atividades físicas, por exemplo. Entre 2011 e 2015, o número de brasileiros adultos que faziam pelo menos 150 minutos de exercícios de intensidade moderada no tempo livre passou de 31,6% para 37,6%.
Esse avanço, porém, empacou nos últimos dois anos -em 2017, a taxa foi de 37%. O mesmo ocorreu em relação ao consumo de frutas e verduras, que vinha crescendo até 2015. Nos últimos dois anos, porém, a taxa passou de 25,2% para 23,2%.
Soma-se a esse cenário a dificuldade em reduzir o índice de fumantes e o crescente aumento no percentual de adultos que fazem consumo considerado abusivo de álcool.
"São sinais que acendem a luz amarela", avalia Malta. "Isso mostra que novas medidas precisam ser implementadas para controlar esse consumo. Sem políticas regulatórias, o Brasil pode perder o bonde da história", diz ela, que sugere como exemplo o aumento da taxação e adoção de embalagens genéricas de cigarro, estratégia já adotada em outros países, como Austrália.
De acordo com Fernando Costa, diretor de promoção de saúde cardiovascular da Sociedade Brasileira de Cardiologia, há necessidade de políticas mais estruturadas de atenção aos fatores de risco de doenças crônicas, em especial a obesidade.
"A população aumentou muito de peso, e com isso aumenta a doença metabólica. E acaba tendo mais diabetes, que são fatores gravíssimos para a arterosclerose. Muitos começam a fazer exame de colesterol já velhos", diz.
"Existem dois tipos de investimento necessários. O primeiro é o cuidado do doente agudo, de forma a salvar todas as vidas que podem ser salvas. O outro é prevenção, que é o investimento a longo prazo. Mas você não vê isso hoje", completa.
A pressão do avanço das doenças crônicas já é sentida na rede de saúde. No governo federal, a avaliação é que a alta carga de doenças crônicas e as perdas de saúde têm aumentado além da capacidade instalada no SUS.
Segundo Martha Oliveira, da Anahp (Associação Nacional de Hospitais Privados), na rede privada, a situação já leva hospitais a reorganizar o atendimento. "Já temos vários hospitais extrapolando o nível terciário e tentando buscar o paciente desde o nível de atenção primária, começando a buscar outros tipos de cuidado. É um movimento que já ocorre em outros países, do hospital redesenhando seu papel", diz.
Um dos fatores que impulsionam essa mudança é o aumento de custos. A OMS (Organização Mundial de Saúde) estima que os custos das doenças crônicas levem a perda de US$ 7 trilhões (cerca de R$ 27,3 trilhões) entre 2011 e 2015 em países de baixa e média renda, tanto em custos de saúde quanto pela perda da força de trabalho.
Foi o que ocorreu com Adriana: com o AVC e o câncer, acabou tendo que deixar o trabalho e se aposentar mais cedo para cuidar da recuperação. Ao mesmo tempo, seus gastos aumentaram. "Tinha plano de saúde, mas paguei muita coisa por conta própria", relata ela, que ainda mantém uma rotina rígida de cuidados.
Na tentativa de evitar casos como esses, alternativas simples e preventivas começam a ganhar maior espaço na rede.
Ao ver que a unidade de saúde para onde tinha sido alocada tinha um campo livre ao lado do prédio, a professora de educação física Silvia Borges não hesitou: chamou a equipe e começou a organizar aulas diárias atreladas aos atendimentos na unidade.
"No início, montamos os exercícios com cabo de vassoura e sacos de areia. Depois, a prefeitura foi mandando colchonetes", conta ela, que trabalha em UBS em Manaus.
A atividade varia conforme o quadro dos pacientes, como idosos e doentes crônicos. Uma das participantes é a auxiliar de cozinha Elineia Costa da Silva, 51. Diagnosticada com diabetes há sete anos, teve que mudar de rotina. De uma vida sedentária, passou a fazer exercícios e alterou a alimentação. "Não é fácil, mas tenho conseguido controlar."
Borges também diz que já sente os impactos da prevenção. "Muitos mudaram os hábitos e pararam de ser hiperusuários porque viviam com queixas e complicações."


Cláudia Collucci e Natália Cancian, Folha de São Paulo