Costumo ficar perdido entre estatísticas divergentes sobre os efeitos do porte de armas. Há uma abundância de estudos mostrando que, sim, o maior acesso às armas aumenta as mortes acidentais ou causadas por impulso e motivo fútil. Mas há pontos fora da curva que não são desprezíveis. Os estados brasileiros mais violentos (AL, SE e RN) têm menos armas por habitantes que os menos violentos. Honduras, o país mais violento do mundo, tem muito menos armas que a Suíça.
No meio desses números, desconfio que a redução da violência está mais ligada ao império da lei, ao fortalecimento do mercado e das instituições, e não tanto ao acesso ou à proibição de armas. Mas digamos que os brasileiros cheguem a um consenso de que a liberação do porte aumenta a violência. Temos aí um argumento suficiente para proibi-lo? Talvez não.
No meio desses números, desconfio que a redução da violência está mais ligada ao império da lei, ao fortalecimento do mercado e das instituições, e não tanto ao acesso ou à proibição de armas. Mas digamos que os brasileiros cheguem a um consenso de que a liberação do porte aumenta a violência. Temos aí um argumento suficiente para proibi-lo? Talvez não.
É muito fácil resolver problemas sociais eliminando direitos e a liberdade dos cidadãos. Por exemplo, para erradicar a Aids, bastaria proibir o sexo sem camisinha, submeter os brasileiros a um exame compulsório, realizar castração química dos portadores de HIV ou transferi-los para uma quarentena. Se achamos isso um absurdo, é porque valorizamos a liberdade mais do que a estatística.
Em alguma medida isso vale para o direito de usar armas, pois ele pode significar a vida ou a integridade do indivíduo. Com a proibição, pessoas que usariam armas de forma responsável são impedidas, em nome da estatística, de se defender. É mais do que justo que elas não queiram socializar essa questão. Além disso, tem um toque de piada de mau gosto, num país onde traficantes à luz do dia expulsam moradores de suas casas, e onde a polícia com frequência falha ou se alia a bandidos, querer que as pessoas aceitem a proibição de se protegerem.
“Defendo um mundo em que lésbicas possam usar armas para defender suas plantações de maconha”, diz um político canadense. A frase já é batida, mas capta a essência do pensamento. O direito de se defender, ainda que desprezado pela esquerda, é parte dos direitos humanos tão relevante quanto a livre escolha sexual ou a possibilidade de se entorpecer. É preciso uma boa dose de cuidado e relutância ao restringi-lo.
Folha de São Paulo