quinta-feira, 21 de junho de 2018

Coaf vê indícios de lavagem de dinheiro em movimentações de Romário


Romario, no plenário do Senado Federal - Jorge William / Agência O Globo


O Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), órgão do Ministério da Fazenda, encontrou indícios de lavagem de dinheiro em operações bancárias envolvendo o senador Romário (Podemos-RJ), pré-candidato ao governo do Rio. Um relatório, do dia 2 de maio, indica que ele administra uma conta em nome da irmã, Zoraidi de Souza Faria, com o “intuito de ocultar” a sua própria movimentação financeira. O senador tem uma procuração, entregue por Zoraidi, que dá a ele poderes específicos sobre recursos depositados no Banco do Brasil. Segundo o Coaf, o fluxo financeiro da conta é “incompatível com a capacidade financeira” da irmã de Romário.

Revelada por O GLOBO em fevereiro, a conta de Zoraidi foi aberta em uma agência no Congresso Nacional, em Brasília, onde Romário exerce mandato parlamentar desde 2011 — primeiro na Câmara e depois no Senado. Já a sua irmã vive em Jacarepaguá, na Zona Oeste do Rio. Com rendimento anual declarado de apenas R$ 8 mil, Zoraidi recebeu na sua conta, segundo o Coaf, R$ 8 milhões, entre agosto de 2016 e abril de 2017. Já as saídas da mesma conta totalizaram R$ 7,5 milhões no mesmo período.

“A movimentação financeira apresenta-se incompatível com a capacidade financeira da cliente (Zoraidi), mesmo considerando a renda de seu procurador (Romário); aparenta pertencer ao procurador e irmão da cliente e nos leva a crer que o mesmo utilize a conta da irmã com o intuito de ocultar sua movimentação. Comunicamos por não encontrar fundamentos econômicos ou legais para a movimentação financeira, podendo configurar a existência de indícios do crime de lavagem de dinheiro”, diz o relatório do Coaf.

Do valor total que entrou na conta de Zoraidi no período analisado, R$ 6 milhões vieram da RSF, uma empresa com as iniciais do nome do senador, cujos sócios no papel são a mãe e o pai dele. É por meio desta empresa que Romário recebeu valores devidos pelo Flamengo — o acerto foi feito por um acordo judicial. Outros R$ 2 milhões rastreados no Banco do Brasil vieram de uma transferência feita pelo próprio Romário de uma outra conta sua na Caixa Econômica Federal.

As despesas identificadas também ligam a conta de Zoraidi ao senador. Para a advogada Adriana Sorrentino, foram repassados R$ 1,3 milhão entre 2016 e 2017. Em fevereiro, ela disse ao GLOBO ter vendido a Romário — por R$ 6,4 milhões — uma casa em um condomínio de luxo na Barra, Zona Oeste do Rio. O senador já negou ser proprietário do imóvel, que teve cotas do IPTU pagas por meio da conta de Zoraidi no Banco do Brasil.

Outros pagamentos relacionados ao senador.

Outro que recebeu recursos da conta em nome da irmã foi o escritório do advogado Norval Valério, que já representou Romário em diversos processos (R$ 408 mil). Já o advogado Marcello Santoro, ex-cunhado de Romário, a quem representou em ações na Justiça, recebeu depósito de R$ 300 mil. Uma pesquisa feita em sites de tribunais não identificou processos em que Zoraidi seja defendida por estes advogados. Há também um pagamento de R$ 82 mil a Marcius Ney de Oliveira Fernandes, assessor parlamentar de Romário, lotado em um escritório de apoio no Rio.

O senador tem dívidas milionárias com credores já reconhecidas judicialmente. A Justiça, no entanto, tem dificuldades de encontrar valores e bens em nome de Romário, em função das movimentações financeiras por contas que não pertencem oficialmente a ele e pelo registro de imóveis e carros em nome de familiares, como Zoraidi e a mãe.

Outros documentos obtidos por O GLOBO mostram transações que podem ter sido feitas com o objetivo de dar lastro financeiro a Zoraidi e uma aparência de normalidade às movimentações milionárias na conta no Banco do Brasil. Entre 2015 e 2016, ela assinou contratos de empréstimos que chegaram a R$ 10 milhões. Em abril de 2015, foi firmado um acordo com Romário, no valor de R$ 4 milhões. No ano seguinte, assinou outro contato, este com a RSF, no valor de R$ 6 milhões.

Por lei, o Coaf é obrigado a avisar as autoridades responsáveis por investigações quando encontrar indícios de lavagem de dinheiro em movimentações financeiras.

O senador Romário e Zoraidi receberam na segunda-feira, por e-mail, uma série de questionamentos, mas não responderam até o fechamento desta edição. Por telefone, o parlamentar foi avisado, via assessoria de imprensa, sobre o envio das questões. A irmã do senador também recebeu as perguntas por WhatsApp, mas não respondeu. Tampouco atendeu o telefone.

 


Marco Grillo e Thiago Prado, O Globo