A presidente Dilma Rousseff foi afastada de suas funções por até seis meses em decorrência da admissibilidade de seu processo de impeachment pela maioria dos senadores. Para que volte novamente ao posto, o Supremo Tribunal Federal teria que anular o impeachment (coisa que já sinalizou que não fará) ou os senadores teriam que julgá-la, em nova votação, apta para exercer o cargo. Na prática, seu governo acabou.
Não tentarei resumir, em poucos parágrafos, o significado de seus cinco anos e cinco meses na presidência. Aponto apenas duas marcas: os escândalos de corrupção e os crimes fiscais.
Quando se fala em corrupção e uso de bancos públicos para emprestar dinheiro ao Tesouro Nacional (ou seja, as “pedaladas fiscais”), é impossível não lembrar dos governadores nos anos oitenta.
Políticos como Orestes Quércia, que governou São Paulo de 1987 a 1991, agiam sem preocupação alguma. Não podiam disputar reeleição. Usavam à vontade os recursos públicos para financiar projetos receita prevista.
Fernando Dall’Acqua descreve melhor: “Os bancos públicos brasileiros têm sido usados como fonte preferencial de financiamento do setor público. Os governos estaduais têm recorrentemente utilizado o financiamento junto a seus bancos para ampliar sua capacidade de realização de gastos. Esse tipo de financiamento se constitui, muitas vezes, na forma encontrada pelos governantes para realizar custeio e investimento sem a devida cobertura orçamentária”.
Mas, àquela altura, isso não era crime. A Lei de Responsabilidade Fiscal, sancionada em 2000, mudou isso. (Escrevi um pouco mais sobre o comportamento fiscal de governadores dos anos oitenta aqui.)
Quanto aos escândalos de corrupção, os governadores dos anos oitenta podiam dormir tranquilamente. (Os de 2016 nem tanto – a depender, infelizmente, de sua base na Assembleia Legislativa.) Quércia não foi responsabilizado por diversas fraudes.
O Judiciário e Ministério Público eram menos eficazes e não contavam, ainda, com legislação para tipificar certos crimes e com a cooperação de instituições de controle no nível federal (fortalecidas, em grande medida, pelos governos petistas). Podiam roubar impunemente. Dilma Rousseff, PMDB e PP não contam, hoje, com a mesma sorte.
Dito isso, é preciso ser muito, muito partidário para considerar o impeachment da presidente um “golpe” ou “ruptura institucional”. Ontem foi um grande dia para a responsabilidade fiscal – pilar tão importante para o sucesso de governos quanto os direitos civis – e para o combate à corrupção.
Impeachment contestado faz parte da democracia. Para o bem ou para o mal.