"Entre os votos e a nota de risco", editorial do Estadão
Em ano de eleições e de muita pressão por maiores gastos, a presidente Dilma
Rousseff terá de governar pensando nas alianças partidárias, nos eleitores, nas
manobras da oposição e também nas agências de classificação de risco, para
evitar um rebaixamento do País. Mas pelo menos uma boa notícia surgiu logo no
início do ano. A Moody's, uma das agências mais importantes, decidiu confirmar a
nota do Brasil - por enquanto.
Segundo a agência, a economia brasileira crescerá
este ano 2% e o superávit primário do setor público deverá atingir 2,1% do
Produto Interno Bruto (PIB), pouco mais que o nível estimado para 2013 (1,8%).
Este desempenho já está embutido na atual classificação do País, explicou o
vice-presidente da Moody's, Mauro Leos. Se os números da economia vierem "em
linha" com essas projeções, a nota e a perspectiva serão mantidas até o fim de
2014, informou o especialista.
Mas a evolução dos dados, advertiu, será acompanhada e uma decisão diferente
poderá ocorrer antes do fim do ano. Um crescimento econômico mais fraco e um
resultado fiscal menor poderão resultar, argumentou, num aumento perigoso da
relação entre a dívida pública e o PIB.
A redução da nota de crédito passou a ser um risco tangível há pouco mais de
seis meses, num cenário de inflação alta, contas públicas em deterioração e
piora do balanço de pagamentos. Em junho, a agência Standard & Poor's
(S&P) alterou de estável para negativa a perspectiva de nota do Brasil.
Movimento semelhante foi realizado pela Moody's em setembro, quando a
perspectiva passou de positiva para estável. A advertência mais dura veio em
novembro, quando o diretor da S&P responsável pela avaliação do Brasil,
Sebastian Briozzo, mencionou o risco de corte da nota antes das eleições, se os
indicadores continuassem piorando.
A presidente Dilma Rousseff e o ministro da Fazenda, Guido Mantega, reagiram
rapidamente e sem disfarce a essa declaração. Pouco tempo depois, em reunião com
líderes do PT e de partidos aliados no Palácio do Planalto, o ministro citou o
risco de rebaixamento, ao expor as preocupações do Executivo com a evolução das
contas públicas. Nessa reunião, a presidente da República tentou convencer os
parlamentares a abandonar projetos com alto potencial de geração de gastos.
Houve alguma demonstração de apoio, naquele momento, mas, ainda assim, os
congressistas aprovaram um projeto de adoção do orçamento impositivo. Com essa
mudança, o Tesouro será forçado, legalmente, a liberar dinheiro para boa parte
dos projetos contemplados nas emendas orçamentárias propostas por parlamentares.
A presidente prometeu acatar sem veto essa mudança, em troca da aprovação da lei
orçamentária ainda em dezembro.
Ainda num esforço para impressionar os analistas - e acalmar os nervosinhos,
segundo suas palavras -, o ministro da Fazenda anunciou no dia 2 de janeiro, com
semanas de antecedência, o resultado das contas federais de dezembro e do ano.
O governo central, disse ele, deve ter obtido em 2013 cerca de R$ 75 bilhões
de superávit primário, o dinheiro usado para o pagamento de juros da dívida
pública. A meta, já rebaixada, era de R$ 73 bilhões. Foi, portanto,
ultrapassada, de acordo com o ministro. Mas foi ultrapassada graças a R$ 35
bilhões de receitas atípicas. Destas, R$ 15 bilhões vieram do pedágio pago pelos
vencedores da licitação do campo petrolífero de Libra. Mas o ministro prometeu
fechar as contas sem contabilidade criativa - novidade ressaltada pelo diretor
da Moody's.
Por enquanto, nada garante um resultado fiscal melhor que o do ano passado
nem uma contenção do endividamento em níveis ainda razoáveis, condição indicada
por Mauro Leos. Quanto à S&P, suas projeções para o Brasil são em geral
piores que as formuladas para os países mais dinâmicos da região. Há três
perspectivas de crédito positivas e seis negativas. Brasil, Argentina e
Venezuela estão neste segundo conjunto - um trio assustador. O governo continua
diante do duro desafio de pelo menos evitar a piora dos indicadores. Melhora,
neste ano, será uma enorme surpresa.