domingo, 26 de junho de 2022

A Petrobras e a lenda brasileira: Os vampiros comunistas e a misteriosa "Maldição de Paulo Francis", por Carlos Sampaio - Professor. Pós-graduação em “Língua Portuguesa com Ênfase em Produção Textual”

 A lenda diz que tudo começou em 1989, quando o jornalista Ricardo Boechat descobriu vampiros comunistas chocando ovos na Petrobras e assaltando a empresa. Boechat ganhou o “Prêmio Esso” 


“A maldade usa muitas máscaras, mas nenhuma é tão perigosa quanto a máscara da virtude”. (Filme - A Lenda Do Cavaleiro Sem Cabeça).

Disse Shakespeare, pela boca de Hamlet, que “há mais coisas entre o céu e a terra do que imagina nossa vã filosofia”. O Bardo inglês falava de paixão e racionalidade. Mas também de mistérios. Coisas incompreensíveis que não entendemos nesta vida, pois nem tudo é passível de entendimento. Entre essas coisas que não podemos entender destaco a “Misteriosa Petrobras”. 

A “Misteriosa Petrobras” assombra os brasileiros com um manto negro, malcheiroso, que exala um odor nojento de óleo queimado. Ela gira esse véu como os ministros do supremo com suas capas escuras assombram os brasileiros e a cada rodopio a população toma um susto enorme: dizem que crianças nascem antes do tempo, velhinhas param congeladas, mães não conseguem acender o fogão, carros não funcionam, caminhões não transportam mercadorias. É um caos total.

A lenda diz que tudo começou em 1989, quando o jornalista Ricardo Boechat descobriu vampiros comunistas chocando ovos na Petrobras e assaltando a empresa. Ele ganhou o “Prêmio Esso” denunciando, como ele próprio definiu, a “roubalheira na Petrobras”. Ninguém do governo Sarney (1985-1990) investigou o caso, nem deputados, senadores ou procuradores e nem a imprensa se interessou. 

Em 1997, o jornalista Paulo Francis descobriu que os vampiros da Petrobras já tinham se multiplicado e afirmou, no programa “Manhattan Connection”, que “...os diretores da Petrobras põem dinheiro na Suíça”; “roubam em subfaturamento e superfaturamento”; “constituem a maior quadrilha que já atuou no Brasil”. 

O presidente era Fernando Henrique Cardoso, que não mandou investigar a denúncia. Mas, os diretores da estatal, presidida na época por João Rennó, processaram o jornalista e pediram que Paulo Francis pagasse a modéstia quantia de US$ 100 milhões de dólares pelas palavras ditas. 

Quatro meses depois da denúncia, no dia 4 de fevereiro de 1997, Paulo Francis sofreu um infarto fulminante e caiu morto no meio da sala do apartamento onde morava em New York. Seus amigos dizem que o infarto foi consequência do processo movido pelos diretores da Petrobras.

O jornalista Lucas Mendes relembrou o episódio em um texto publicado no site da BBC Brasil. - “Repercussão na imprensa sobre o processo? Mínima. Saíram notas sobre os assombrosos US$ 100 milhões (que estariam sendo cobrados de indenização pelos diretores)”. E perguntou: 

- Seria o poder da Petrobras de silenciar a mídia com sua publicidade? 

Francis fez a denúncia e não obteve nenhum apoio da empresa (Globo) para a qual trabalhava e dos colegas poderosos do jornalismo, que o abandonaram até quando estava sendo processado. Dizem as más línguas que antes de morrer Paulo Francis amaldiçoou a todos, dizendo palavras enigmáticas:

- “Vai piorar, agravar, depois vai melhorar, mas enquanto todos não pagarem pelos crimes, tudo volta a piorar”.

É lenda. Mas em 2006, mais precisamente em maio, o vampiro/presidente da Bolívia, Evo Morales, ordenou a ocupação das refinarias brasileiras pelo exército boliviano. A Petrobras tomou um prejuízo 1,5 bilhão de dólares. Era a maldição de Francis se abatendo sobre a empresa e um manto de mistério e casos escabrosos começaram a acontecer: neste mesmo ano de 2006, a Petrobras pagou 360 milhões de dólares por 50% da refinaria de Pasadena. Depois, em 2008, uma decisão judicial obrigou a estatal brasileira a comprar a parte que pertencia à Astra Oil:  1,18 bilhão de dólares, 27 vezes mais do que o valor inicial.  

E a maldição continuou. O corpo da empresa, que antes tinha sido perfurado pelos bicos dos tucanos, agora era rasgado pelos vampiros/petistas/comunistas, e ficou igual a uma peneira.

Pelos buracos vazaram bilhões de dólares. 

Mas, em 2014, procuradores que nasceram no sábado, liderados por um juiz, se fantasiaram de caçadores de vampiros e armados de leis, empunharam armas tradicionais e sagradas, incluindo estacas de madeira, alho, água benta e ainda armas de fogo com munição de prata, símbolos religiosos apropriados e iniciaram uma caçada sem tréguas aos vampiros/petistas/comunistas.   

Era a maldição de Francis em ação. A operação se chamou “Operação Lava Jato” e desmontou uma imensa quadrilha de vampiros petistas morando dentro da empresa. Eles se alimentavam de bilhões de dólares que trocavam por petróleo.

Foram seis anos, dez meses e 17 dias a duração do combate entre os vampiros incrustados na empresa e os procuradores da Lava Jato. Dizem que uma parte da quadrilha se escondeu nos poços de petróleo em meio ao óleo negro. E outra parte voou para fora da empresa e se transformou no vírus da Covid 19, como vingança, matando milhares de brasileiros. Tudo isso é lenda.

Mas os meliantes mais perigosos foram neutralizados: dois ex-presidentes (Lula e Michel Temer) foram parar na cadeia, além de políticos e empresários milionários. Foram 79 fases, que renderam 195 denúncias apresentadas, que renderam 244 ações penais, 1.921 ações de buscas e apreensões, 349 prisões preventivas e 211 prisões temporárias. Ao todo foram denunciadas 981 vampiros grandes e pequenos e alguns que ainda estavam engatinhando no ninho. 

Os Vampiros estrebucharam, urraram, balançaram as bandeiras vermelhas, chamaram a população que estava contaminada por pão e mortadela para lutarem a seu lado, mas nada adiantou.

O gigantesco esquema de corrupção foi paralisado e mais de 25 bilhões de reais desviados dos cofres públicos foram recuperados. A Petrobras passou por uma enorme desinfecção e já recuperou 6,28 bilhões de reais roubados, fruto de acordos da Lava Jato firmados com empresas, empresários e diretores que participaram do esquema de corrupção na estatal.

Neste ano de 2022, o governo de Jair Bolsonaro conseguiu sanear a empresa que teve um lucro líquido de R$ 44,6 bilhões, registrados de janeiro a março.

Isso não lenda. É verdade verdadeira. 

Mas uma coisa misteriosa acontece: povo paga o prejuízo e a empresa fica com o lucro. Isto é quando a empresa é roubada o povo paga. Quando a empresa tem lucro os dividendos ficam com os acionistas e nunca é dividido com o povo. E todos afirmam que ninguém pode mexer na empresa. 

E a maldição de Francis continua. Ninguém pode mudar nada. Se der lucro fica com os que dirigem a empresa. Se der prejuízo, os que dirigem a empresa e os funcionários continuam recebendo dividendos e salários milionários, mas os prejuízos são pagos pelo povo.

Nesta quinta a revista Veja traz como matéria de capa um artigo defendendo a Petrobras:

“Cruzada de Bolsonaro contra a Petrobras traz ameaça à Lei das Estatais. Presidente e aliados transformaram a empresa em inimiga da vez para garantir a reeleição, uma iniciativa que pode ter efeitos desastrosos”.

- “Seria o poder da Petrobras de silenciar a mídia com sua publicidade”?

Lucas Mendes perguntou isso ou seria a parte da quadrilha que se escondeu nos poços de petróleo para não ser achada pela Lava Jato e agora volta para se apossar novamente da empresa e corrompe a mídia?

Reza a lenda que se alguém descobrir o mistério da Petrobras, a terra se deslocará de seu eixo imaginário e o mundo ficará de cabeça para baixo.

Iniciei o texto com Hamlet e finalizo com a penúltima estrofe de “O Corvo” do meu poeta preferido Edgar Allan Poe. Nele o poeta tenta espantar a ave sombria que adentrou seu quarto, pendurou-se no umbral da porta e de lá nunca mais saiu, assim como os escuros vampiros que se alimentam do negro petróleo e fincaram suas garras no país e de lá nunca mais partiram:

"Seja isso a nossa despedida!"- ergo-me e grito, alma incendiada. -
"Volta de novo à tempestade, aos negros antros infernais!
Nem leve pluma de ti reste aqui, que tal mentira ateste!
Deixa-me só neste ermo agreste! Alça teu vôo dessa porta!
Retira a garra que me corta o peito e vai-te dessa porta!"
                 E o Corvo disse: "Nunca mais!"
Foto de Carlos Sampaio

Carlos Sampaio

Professor. Pós-graduação em “Língua Portuguesa com Ênfase em Produção Textual”. Universidade Federal do Amazonas (UFAM)


Jornal da Cidade