sexta-feira, 29 de setembro de 2017

"Os desafios da construção da paz na Colômbia e a educação", segundo Cláudia Costin

Federico Rios/Reuters
Papa Francisco acena para fiéis durante passagem pela cidade de Cartagena, na Colômbia, neste domingo
Papa Francisco acena para fiéis durante passagem pela cidade de Cartagena, na Colômbia


Folha de São Paulo

Visitei nesta semana a Colômbia e impressionaram-me os persistentes desafios do processo de paz em curso. A desativação da mais antiga guerrilha do continente, as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), não é um processo simples, carregado que é de sentimentos contraditórios, já que o conflito, iniciado em 1964, causou 220 mil mortes e seis milhões de deslocados, que clamam não só por paz, mas por justiça.

O problema das vítimas como mobilizador da continuidade dos conflitos, magistralmente retratado por Antonio Callado em "Bar Don Juan", envolve uma percepção de que abandonar a luta significaria uma traição aos que caíram. Assim, em nome dos mortos passados, novas matanças se iniciam, num processo que se perpetua.

Foi contra essa dinâmica que o papa Francisco se colocou em visita recente ao país, enfrentando oposição dentro da própria igreja. O papa pediu aos colombianos que renunciassem à vingança para conseguir uma paz duradoura, apoiando assim a proposta do presidente Santos e chamando os bispos a se engajarem no processo.

O caminho para a paz incluiu a entrega das armas pelas Farc e de lista de seus ativos para a ONU, para que sejam usados tanto para reparação das vítimas do grupo quanto para programas de reintegração de ex-combatentes. 

E, para ser completo, precisa avançar com as negociações com o ELN (Exército de Liberação Nacional), em sequência ao recente anúncio do cessar-fogo bilateral.

Nos muros de várias escolas em Bogotá, vi a menção à importância da paz e pude, nesta que foi a Semana do Estudante, ver em seu desfile na praça de Bolívar bandeiras e cantigas com referências ao processo. No rosto das crianças tudo parecia fácil, mas não será —que o digam países como Ruanda, em que, apesar da paz e da reconciliação, a sensação de justiça demorou a se fazer sentir, o que também levou o papa a, em 2017, 23 anos depois do genocídio dos tutsis, pedir perdão pelo fato de a igreja católica, como instituição (e não apenas com a participação eventual de alguns padres e freiras, como se afirmava anteriormente) ter contribuído para o massacre.

A educação sofre muito com a falta de paz, que o digam os alunos de áreas conflagradas do Rio de Janeiro ou as crianças sírias privadas de acesso a escolas, mas pode também ser um caminho para construí-la. Se, em vez de invocarmos nacionalismos estreitos e entoarmos chamamentos para uma ação tão viril quanto destrutiva, educarmos para a cidadania global e para a solução pacífica de conflitos, muito sangue deixará de correr em guerras que tendem a se eternizar, em homenagem aos mortos dos dois lados que precisam ser vingados.