sábado, 30 de setembro de 2017

Herdeira de apartamento em nome de primo de Bumlai diz que venda era para Lula

Ricardo Brandt, Julia Affonso, Fausto Macedo e Luiz Vassallo

Lula em seu apartamento em São Bernardo do Campo. Foto: Sergio Castro/Estadão
A herdeira do apartamento 121 do Edifício Hill House – que a força-tarefa da Lava Jato acusa ser um presente dado a Lula, registrado em nome de um “laranja” -, Tatiana de Almeida Campos informou a Receita Federal que em 2010, quando foi feita a escritura de cessão de direitos do imóvel foi informada por sua advogada que o bem estava sendo alienado para o ex-presidente.
O apartamento é o vizinho ao que Lula mora, na cobertura do Hill House, em São Bernardo do Campo, e é usado pelo petista desde 2003, pelo menos. Até 2007 era alugado pelo PT do falecido pai de Tatiana, Augusto Moreira Campos. De 2007 a 2011 foi a Presidência da República que locou o imóvel, que era usado durante os dois mandatos do petista para abrigar as equipes de segurança.

Documento

Filha do antigo dono do apartamento 121, Tatiana informou a Receita, em 2016, em documento anexado ao processo, que em 20 de setembro de 2010 sua advogada Lacier Pereira de Almeida Souza, que é sua prima, a buscou para “assinar a venda da cobertura, apto 121, para o Lula. “Foi isso que ela me falou no taxi, na ida ao cartório.”
“Como eu confiava muito nela, somente perguntei se estava tudo correto, ela fez um sinal positivo e me disse onde assinar. Eu não li nada, simplesmente assinei acreditando estar vendendo a cobertura para o Lula. O valor era R$ 504 mil (hoje desconfio ter sido muito mais, mas não posso dizer com certeza””, escreveu Tatiana.
Tatiana afirma que só em 2016 tomou conhecimento que o verdadeiro comprador era Glaucos Costamarques, apóis ter sido revelado pela Lava Jato. “Pra mim ele (Lula) era o dono, de modo que se perguntarem à minha família, todos vão dize que eu ‘vendi’ a cobertura do meu pai para o Lula.”
No documento de 12 maio de 2016 enviado para a Receita, a herdeira diz que só em 2016 buscou o cartório e descobriu que não se tratava de uma venda e sim de uma cessão de direito hereditário e que o bem ainda estava em nome do falecido pai, não tendo sido oficialmente transmitido a Costamarques.
Na acusação contra Lula, o Ministério Público Federal destaca que depois de efetivada a aquisição do apartamento, Roberto Teixeira peticionou como representante de Costamarques a ação de inventário da família do antigo dono, que correu na 2ª Vara da Família e Sucessões da Comarca de São Bernardo do Campo, “apenas em 17 de março de 2011”. “Naquela petição, nada constou sobre a transação que já havia sido realizada” em agosto de 2010.
Um mês antes, em 1º de fevereiro de 2011, Costamarques assinou um contrato feito por Teixeira de locação do apartamento em nome da ex-primeira-dama Marisa Letícia (que morreu em fevereiro), na condição de cessionário, tendo como cedentes a viúva Elenice Silva Campos e a filha Tatiana.
Na ação de inventário do imóvel, Teixeira, como representante de Costamarques, noticiou a cessão de direitos hereditários e de meação assinada em setembro de 2010 e requereu a adjudicação do apartamento 121 em favor do primo de Bumlai em 1º de julho de 2016 – quase seis anos depois, quando Lula já era alvo dos processos da Lava Jato.
A herdeira relata no documento que antes da venda do apartamento 121 para Costamarques, houve um tentativa de a excluírem da propriedade, em 2009, em uma partilha amigável que ela diz nunca ter assinado. “Em 2013 comecei a estudar Direito, para poder entender melhor tudo que estava acontecendo, e também porque sempre que eu falava isso tudo para um advogado ele dizia: ‘deixa isso, você vai mexer com a máfia do PT? Pode correr risco de morte’.”
Inquilino. Lula afirma que é inquilino do imóvel, que foi alugado em 2011 por Dona Marisa para receber os filhos e ser usado para reuniões políticos. Na semana passada, o defensor do ex-presidente Cristiano Zanin Martins, que é genro e sócio de Teixeira, apresentou 26 recibos, que vão de 2011 a 2015, para comprovar que os alugueis eram pagos normalmente.
A Lava Jato quebrou os sigilos bancários de Lula, de Dona Marisa e de Glaucos Costamarques e “não foram encontrados registros de pagamentos” feitos para o suposto “laranja” – nem mesmo via contas bancárias de L.I.L.S.
Palestras e Eeventos e do Instituto Lula.
Só à partir de novembro de 2015, quando Glaucos afirmou ter sido informado por Teixeira que passaria a receber aluguel, é que a Lava Jato identificou nos extratos bancários do laranja “depósitos em dinheiro em seu favor em valores compatíveis com o suposto aluguel”.
Após a entrega dos recibos pela defesa de Lula, Glaucos disse por meio de seus advogados que os documentos foram assinados por ele no mesmo dia, em novembro de 2015, quando Teixeira o teria informado que passaria a pagar os alugueis.
A acusação do MPF nesse processo diz que Lula, dona Marisa (que deixou de figurar no processo após a morte), Costamarques e Teixiera agiram “em conluio” e “dissimularam a origem, disposição, movimentação e propriedade de R$ 504 mil, provenientes, direta e indiretamente, dos crimes de organização criminosa, cartel, fraude à licitação e corrupção praticados pelos executivos do Grupo Odebrecht”, na Petrobrás.
COM A PALAVRA, O ADVOGADO CRISTIANO ZANIN MARTINS, QUE DEFENDE LULA
Após a falsa polêmica sobre os recibos, cujas assinaturas foram reconhecidas como autênticas pelo proprietário do imóvel locado à D. Marisa em petição protocolada na data de ontem, a imprensa tenta criar mais um factoide.
Desta vez colocou em destaque informações prestadas em 12/05/2016 à Receita Federal por Tatiana de Almeida Campos, filha de Augusto Moreira Campos, que era o proprietário do apartamento 121 do Edifício Hill House – atualmente de propriedade de Glaucos da Costamarques e objeto de um contrato de locação para D. Marisa Letícia Lula da Silva.
A imprensa desconsiderou que a Sra. Tatiana prestou depoimento em 23/05/2017 ao juiz Sérgio Moro (Ação Penal nº 5063130-17.2016.4.04.7000/PR) e esclareceu que a referência a Lula decorre apenas uma afirmação feita pelos seus advogados à época para que ela assinasse os documentos de venda.
Quando indagada pela defesa sobre os fatos Tatiana respondeu: “Eu não li nada, eu não vi nada, eu não tive contato com ninguém”:
“Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva: Certo, então a senhora não viu nada em relação a essa venda que tivesse o nome do ex-presidente Lula?
Tatiana de Almeida Campos: Eu não li nada, eu não vi nada, eu não tive contato com ninguém, eu só tive contato com a minha advogada e com o Dr. Sergio Barela, que já estava lá no local. Eu não encontrei nem com a minha madrasta nesse dia”.
O advogado Cristiano Zanin Martins enviou nota neste sábado. “Em relação à reportagem publicada hoje (30/09) pelo jornal “O Estado de S. Paulo” intitulada “Indícios complicam defesa de Lula no caso do apartamento”, é preciso esclarecer que:
1- A reportagem deturpa o objeto da ação penal à qual se refere. Na acusação real e não comprovada pelo Ministério Público, o apartamento teria sido adquirido para o ex-Presidente Lula com recursos provenientes de 8 contratos firmados entre a Petrobras e consórcios envolvendo a Odebrecht. No entanto, nenhuma prova de uso de valores da Petrobras foi feita pela acusação. Além disso, o Sr. Glaucos da Costamarques comprovou ter feito a compra com recursos próprios, por meio de cheques administrativos.
2- Também é falsa a premissa de que o ex-Presidente Lula teria obrigação de fazer pagamentos de aluguéis. No último dia 25/09 apresentamos no processo o contrato de locação que tem como partes o Sr. Glaucos da Costa Marques e D. Marisa Letícia Lula da Silva.
3- Ainda no dia 25/09 apresentamos relação de recibos que dão quitação à D. Marisa em relação ao pagamento dos aluguéis até dezembro de 2015. A quitação é a prova mais plena de pagamento segundo a lei. A imprensa e agentes do processo tentaram, sem êxito, desqualificar os documentos, inclusive com precipitadas ofensas à Defesa de Lula. Mas hoje não há qualquer dúvida de que eles foram assinados pelo proprietário e em diferentes períodos e, portanto, são documentos idôneos e aptos a fazer a prova de que D. Marisa honrou sua obrigação contratual e fez o pagamento dos aluguéis.
4- A “grande descoberta da vez” é uma planilha apócrifa e que relacionaria apenas “pagamentos em agência bancária” no ano de 2011. Além de não ser possível relacionar um documento sem qualquer assinatura com D. Marisa, ele nada prova. Não se pode presumir, até porque o próprio documento não permite, que ele contenha uma relação exaustiva de pagamentos feitos por D. Marisa em 2011, que podem ser feitos de diversas formas de acordo com a lei.
5- Lamentamos que o jornal tenha dedicado suas páginas para fomentar uma acusação sem provas contra o ex-Presidente Lula sem dar à sua Defesa sequer a oportunidade de manifestação prévia.
Cristiano Zanin Martins”