terça-feira, 21 de julho de 2015

Condenações têm papel didático, avaliam procuradores da Lava-Jato. Tudo bem! Mas, e Lula? E Dilma?

Thiago Herdy - O Globo

Carlos Fernando dos Santos Lima e Deltan Dallagnol afirmam que a operação mudou a prática de empresários




Dois dos principais procuradores da força-tarefa do MP, Carlos Fernando dos Santos Lima e Deltan Dallagnol, disseram acreditar, em entrevista ao GLOBO, que a operação Lava-Jato já vem mudando a relação de empresários com os agentes públicos. Eles lembram que doações partidárias vêm diminuindo, que no país não existem "intocáveis" e que estamos no caminho para sermos "mais republicanos".

O indiciamento e a condenação de empreiteiros podem ter efeito no comportamento de empresários que têm o poder público como cliente?
Carlos Fernando Lima: Já se verificam sinais de mudança de comportamento entre os empresários quando o assunto é o seu relacionamento com o poder público, seja como fornecedores de bens e serviços, seja como doadores de campanha. Não é por outro motivo que as doações oficiais neste ano estão em um dos níveis mais baixos. Indiciamentos, denúncias e condenações contra empreiteiros têm o papel didático de colocar à classe dos empresários a necessidade de rever conceitos arraigados. Entretanto, ainda é cedo para se afirmar que essas mudanças sejam de paradigma, ou apenas se caracterizem como um recuo transitório em meio às incertezas causadas pela extensão e intensidade da Lava Jato.

Deltan Dallagnol: Casos como a Lava Jato e o Mensalão têm sido pontos fora da curva. Para consolidar uma atuação preventiva dos empresários em evitar a corrupção, por meio de medidas de compliance, e uma atuação também repressiva, com o corte na própria carne quando revelados nódulos cancerosos em sua empresa, precisamos de mudanças sistêmicas em nossa legislação. Essas medidas, sim, tornam a corrupção um crime de alto risco, incentivando-os a adotar cautelas para que suas empresas fiquem longe de práticas tão nocivas à sociedade.

A sentença e a continuidade das ações da Lava-Jato representam um marco no combate a crimes de colarinho branco?


Lima: Um marco dentre diversos marcos. Não haveria Lava Jato sem a Operação Banestado. Nela aprendemos a lidar com novos mecanismos investigativos, bem como alcançar o melhor da cooperação internacional no combate à lavagem de dinheiro. Há também outros marcos, como o caso do TRT de São Paulo, e o Mensalão, que desnudou o relacionamento entre agentes públicos, empresários e operadores de lavagem de dinheiro que se repetiu na Petrobras. O mérito, portanto, não é de ser uma investigação inovadora, mas sim uma operação em que se conjuga o melhor da experiência de anos do MPF e da PF no combate do crime de colarinho branco.

Dallagnol: A lição que fica é a de que não há ilícito que não possa ser apurado dentro dos limites legais e constitucionais, nem ninguém que seja ‘intocável’ em nossa República. Se quisermos, contudo, que casos frutíferos se multipliquem, sem ter de contar com a convergência de múltiplos fatores, precisamos de uma reforma no sistema, e para isso o MPF propôs medidas contra a corrupção e a impunidade. (O MPF promove a campanha "10 medidas contra a corrupção", com o intuito de levar um projeto de iniciativa popular ao Congresso).

Além da ação de órgãos de controle, que mudanças são necessárias para combater a cultura da corrupção no país?
Lima: Obviamente há ainda o que se fazer. Ainda há mudanças legislativas necessárias, algumas das quais já sugeridas pela própria Procuradoria-Geral da República, como a racionalização do sistema recursal – sem prejuízo algum às garantias constitucionais, ou ajustes do sistema de prescrição. O importante é a percepção de todos de que estamos no caminho para um país mais republicano.

Dallagnol: Estudos de criminologia de colarinho branco nos Estados Unidos, bem como os mais reconhecidos estudiosos da corrupção no mundo, expõem que impunidade e corrupção estão intimamente conectadas. Se queremos vencer a corrupção, precisamos vencer a impunidade. A Lava Jato indignou o país, e reascendeu uma esperança dentro de nós. Precisamos, agora, de uma ponte que nos leve desse lugar de indignação e esperança para a efetiva transformação. (Eu acredito que) as 10 medidas (propostas pelo MPF) são essa ponte.