Cleide Carvalho e Germano Oliveira - O Globo
Segundo o delator, Baiano e Cunha dividiram US$ 10 milhões das propinas por compra de navios-sonda na Coreia
Auditoria interna da Petrobras realizada entre março e maio deste ano sobre a fabricação de dois navios-sonda pela Samsung, na Coreia, revela que o lobista Fernando Soares, o Fernando Baiano, apontado como operador do PMDB no recebimento de propinas na estatal, reuniu-se reunido 72 vezes com o diretor da área Internacional Nestor Cerveró. Os encontros aconteceram entre fevereiro de 2004 e janeiro de 2008, durante a fase de negociação da construção das sondas.
Baiano foi apontado como "sócio oculto" do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e teria recebido propinas de US$ 10 milhões pelos contratos dos navios-sondas, dos quais US$ 5 milhões para Cunha, segundo disse o empresário Júlio Camargo ao juiz Sérgio Moro em depoimento na semana passada.
A auditoria, anexada ao inquérito que indiciou os executivos da Odebrecht, mostra ainda que Júlio Camargo, representante da Mitsui, empresa que ajudou a Samsung a fabricar os navios, foi recebido 18 vezes por Cerveró no período da negociação das sondas. Camargo disse à Justiça que recebeu uma comissão de US$ 53 milhões no negócio, dos quais US$ 40 milhões em propinas para políticos e diretores da Petrobras, incluindo Cerveró.
Dirigentes de empreiteiras brasileiras também visitaram Cerveró com frequência no período da negociação dos navios-sonda. Na lista destacada pela auditoria constam os nomes de Ricardo Pessoa, dono da UTC e considerado pelo Ministério Público Federal (MPF) como o chefe do cartel de empreiteiras que fraudavam licitações na Petrobras, e dos diretores da Odebrecht Rogério Araujo e Márcio Faria, que estão presos em Curitiba e que foram indiciados na segunda-feira pela prática de cinco crimes, incluindo corrupção, lavagem de dinheiro e fraude em licitações.
Depois de mostrar que as negociações foram realizadas "sem prévia autorização da diretoria Executiva, revelando elevada autonomia detida pela área internacional", a auditoria explica que "a boa prática de realizar processos competitivos para a seleção de propostas não foi seguida. Os registros das rodadas de negociações e dos respectivos responsáveis foram escassos".
Os auditores constataram que ao final das construções, os dois navios tiveram um acréscimo de US$ 31,5 milhões, "sem explicação". Outra falha grave apontada pelos peritos é que a Petrobras escolheu a Schahin para operar o Vitória 10.000, sem qualquer concorrência. A demora para concretizar a negociação com a Schahin para a vinda do navio da Coreia para o Brasil provocou um prejuízo de aproximadamente US$ 126 milhões à Petrobras.
"As negociações com a Schahin não foram precedidas de uma autorização formal pela diretoria Executiva, contrariando a regra geral adotada na companhia", diz a auditoria. Depois, a Schahin veio a ficar inadimplente com os pagamentos pelo afretamento do navio.
Já o Petrobras 10.000 zarpou da Coreia com destino à Angola, onde iria perfurar poços da Petrobras, em setembro de 2009. O navio foi arrendado pela Transocean, mas depois de perfurar três poços secos em Angola, foi decidido em outubro de 2010 que ele fosse usado para exploração e produção no Brasil a partir de janeiro de 2011.
"Não houve um processo competitivo para seleção do construtor da sonda. A proposta partiu da Mitsui que procurou a Petrobras para oferecer a parceria. As condições comerciais para a construção do navio-sonda com a Samsung foram negociadas diretamente pelo diretor Nestor Cerveró", diz o documento. Esse navio chegou a ser negociado por US$ 586 milhões, mas a comissão entendeu que houve sobrepreço no negócio, já que o navio acabou custando US$ 603 milhões à Petrobras.