Robin Williams encarnou um dos grandes papeis de sua carreira no filme de 1987| Foto: Reprodução YouTube
A liberdade de expressão absoluta é o ideal defendido por filósofos iluministas como John Stuart Mill, que tiveram grande influência na formação política dos Estados Unidos. Graças à primeira emenda à Constituição americana, é possível dizer as coisas mais abjetas sem ser punido por isso. Mas a primeira emenda não impede que patrões censurem seus funcionários. Especialmente quando o patrão são as Forças Armadas em um período de guerra.
Este é o tema central do clássico Bom Dia, Vietnã (1987), disponível para streaming na plataforma Star+. No filme, Robin Williams (1951-2014) interpreta Adrian Cronauer, um radialista encarregado de informar e entreter as tropas americanas no Vietnã. Ele é transferido da Grécia, onde tinha uma vida serena, para o caos do conflito no país asiático. Cronauer traz consigo seu estilo anárquico de enfileirar piadas a um ritmo estonteante, permeadas por uma ou outra notícia. Mas logo ele descobre que não pode tocar certas músicas e dizer certas coisas sem a aprovação dos superiores. As canções de Bob Dylan, por exemplo, estão na lista negra. A inofensiva Orquestra Mantovani está aprovada de antemão.
O personagem de Robin Williams, popular entre as tropas americanas no Vietnã, consegue manter o seu estilo irreverente por algum tempo, apesar da contrariedade do seu superior imediato. Mas as coisas mudam na segunda metade do filme, quando um incidente coloca à prova a sua disposição de contornar a censura militar.
Piadas e moralidade
Em tempos de guerra, manter a ordem e o moral da tropa são prioridades. Comédia salpicada com algum drama, Bom Dia, Vietnã mostra como mesmo uma democracia com as garantias da primeira emenda tem limites à liberdade de expressão quando a defesa nacional está em jogo. De forma leve, o filme explora a tensão entre ordem e criatividade. Como bônus, traz boas piadas (algumas datadas) e um debate (raso) sobre a moralidade da guerra.
Bom Dia, Vietnã é um dos filmes cujo papel principal parece ter sido talhado para Robin Williams. Difícil imaginar outro ator interpretando o caótico radialista. Em muitas das cenas, as falas de Williams fluem tão naturalmente que parecem ser improvisos. E algumas, de fato, são, conforme o diretor Barry Levinson revelaria anos depois. O filme rendeu ao ator um Globo de Ouro, uma indicação ao Oscar e um lugar entre os grandes de Hollywood.
Embora Barry Levinson e o roteirista Mitch Markowitz tenham adaptado o enredo com ampla liberdade criativa, a história do filme foi inspirada em um personagem real. O verdadeiro Adrian Cronauer, que morreu em 2018, atuou mesmo como radialista para as tropas americanas no Vietnã. Mas, na vida real, Cronauer era menos indisciplinado, mais conservador e mais dedicado. O Cronauer da vida real provavelmente não renderia uma grande atuação de Robin Williams.
Gabriel de Arruda Castro, Gazeta do Povo