Para quem escolheu seus advogados não só pelo mérito, mas pela capacidade de parecer bem na televisão, Donald Trump não deve estar muito satisfeito.
Jay Sekulow e Pat Cipollone usam ternos impecáveis e realmente parecem advogados de séries de televisão.
Ao contrário de um conhecido casal de juristas republicanos que Trump contratou e em seguida manteve apenas como assessores informais, Joe diGenova e Victoria Toensing. Ele por usar um terno mal cortado, ela por aparecer na Casa Branca com luvas que deixam a ponta dos dedos de fora.
Que outro presidente faria isso?
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Trump não é crítico de moda, mas quer “matadores”, na defesa . Que tenham cara de matadores e ajam como tal.
Infelizmente para ele, o desempenho de seus dois advogados, limitado pelo papel que precisam desempenhar na abertura do julgamento – basicamente, dizer não -, foi longe de brilhante.
“Despreparados, confusos e totalmente não convincentes”, espetou Chuck Schumer, o líder da minoria democrata no Senado.
Como tal, Schumer é o principal responsável pela tática de forçar votações sucessivas a cada pedido de intimação de testemunhas e documentos oficiais sobre o caso da Ucrânia.
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A cada pedido, John Roberts, presidente da Suprema Corte que está desempenhando um papel de juiz (mas sem capacidade de dar sentenças, só de supervisionar o comportamento dos senadores), tem que chamar uma votação.
Inevitavelmente, os onze pedidos do primeiro dia foram derrotados pelos republicanos que têm a maioria (53, contra 49 democratas).
É um processo repetitivo e demorado, mas a ideia é justamente passar a imagem de que Donald Trump está sendo protegido por “seus” senadores porque tem alguma coisa para esconder.
Nos bastidores, a coisa fica muito mais interessante.
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A tática da defesa de Trump é acenar com uma represália – o que mais poderia ser?
Se os democratas conseguirem convocar funcionários ou ex-funcionários do governo para corroborar a acusação de abuso de poder, contra o presidente por intimidar o governo ucraniano a investigar seu adversário político Joe Biden e o filho dele, o revide será direcionado contra Adam Schiff, talvez o mais importante dos cinco “gerentes do impeachment”, deputados democratas que estão funcionando como promotores no julgamento do Senado.
E Adam Schiff, que está se apresentando tão bem – experiência de promotor -, tem um rabo preso em algum lugar, por enquanto, difícil de comprovar.
O julgamento do presidente é tão interessante por causa, justamente, dos bons argumentos dos dois lados.
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Trump, obviamente, forçou a barra com um país vulnerável para fazer uma investigação que prejudicaria seu potencial adversário na eleição presidencial de novembro.
Se foi um ato criminoso, ou suficiente para justificar a sua remoção do cargo – mesmo que não passe na votação do Senado -, ainda está em aberto.
Mas a atuação das forças antitrumpistas também tem enroscos.
E muitos deles estão enrolados em volta de Schiff, apelidado cruelmente por Trump de “Pencil Neck”, ou pescoço fino.
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Um resumo: a denúncia anônima que desencadeou o processo de impeachment foi feita por um analista da CIA lotado na Casa Branca. Eric Ciaramella, segundo todas as indicações – nos Estados Unidos, o nome dele é preservado.
A maioria das informações sobre Ciaramella e suas possíveis motivações tem sido feita pelo repórter Paul Sperry, do braço investigativo do site RealClearPolitics.
Ciaramella tinha trabalhado como especialista em questões ucranianas para o governo Obama. Como Joe Biden, na época vice-presidente, era uma espécie de enviado especial para a Ucrânia, também trabalhou com ele.
Problema: quando ouviu, de outra fonte, sobre o telefonema suspeito de Trump com o presidente ucraniano, pedindo o “favor” de investigar os Biden, não foi diretamente aos inspetor-geral dos serviços de inteligência, Michael Atkinson, como estabelece o protocolo de denúncias sobre comportamentos indevidos ou potencialmente criminosos de altas autoridades.
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Segundo Sperry, Ciaramella procurou primeiro um ex-colega, Sean Misko. Depois de deixar a Casa Branca, Misko foi trabalhar para quem? Adam Schiff.
O nobre deputado, que como presidente da Comissão de Inteligência conduziu o grosso do inquérito na Câmara sobre o impeachment, admitiu o contato?
Nem pensar. Também proibiu que Ciaramella fosse convocado como testemunha. E colocou a história toda sob sigilo.
Fofoca: Sperry falou com duas fontes garantindo que, apenas duas semanas depois da posse, Ciaramella comentou com Misko que precisavam “se livrar” de Trump.
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O pretexto ideal veio com o infeliz telefonema com o presidente ucraniano, em julho de 2019.
É claro que estas histórias todas partem de “fontes da Casa Branca”.
Mas não seria bom se, num caso tão grave quanto o impeachment e a potencial remoção de um presidente, elas fossem investigadas e submetidas ao contraditório?
Schiff está se apresentando bem, deixando as maluquices conspiratórias de lado. O caso da Ucrânia não é sexy, como dizem os advogados americanos.
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Precisa ser exposto com clareza para atrair a atenção da opinião pública. Principalmente daquela faixa que teria uma certa dificuldade em encontrar a Ucrânia no mapa mundi.
Seus colegas também foram escolhidos para contrastar com os advogados de Trump. Incluem três mulheres (uma latina, uma negra) e um ex-militar que serviu no Iraque e no Afeganistão.
A diversidade, obrigatória no lado mais liberal, conta pontos a favor dos democratas.
Se ganhar no julgamento no Senado, mas perder a opinião pública, que pende, na maioria das pesquisas, contra ele, Trump também perde a eleição.
Este é exatamente o objetivo.
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