A Scania iniciou nesta semana na fábrica de São Bernardo do Campo, no ABC paulista, a produção de caminhões movidos a GNV (gás natural), GNL (gás liquefeito) e biometano (obtido de resíduos orgânicos). Além de países europeus, o Brasil é o único a produzir essa linha de veículos. A fábrica local iniciará nos próximos dias a exportação dos veículos, começando com a Argentina.
As versões a GNV e GNL são aptas a usarem também o biometano, em qualquer proporção, ou seja, são veículos flex. No Brasil já ocorreram importações de caminhões a gás natural, mas a produção local é inédita, afirma a empresa. A matriz sueca do grupo produz esse tipo de veículo desde 2014. Para a produção no Brasil foram feitas adaptações, como reforços para uso em terrenos mais severos.
Com esse projeto que consumiu boa parcela do plano de investimento da Scania de R$ 2,6 bilhões entre 2016 e 2020, a marca dá início ao projeto de ter a maior parte de seus produtos movidos a combustíveis alternativos. Os próximos passos incluem a produção de veículos híbridos – previstos para serem incluídos no novo programa de investimentos de 2021 a 2024, de R$ 1,4 bilhão – e, em mais longo prazo, de elétricos.
O presidente da Scania Latin America, Christopher Podgorski, explica que a companhia queria uma “solução de transporte mais limpa aqui e agora, e o gás é uma grande oportunidade devido sua abundância no País”. Segundo ele, o GNV emite de 10% a 15% menos CO2 (dióxido de carbono) em relação ao diesel. A conta é feita com base em todo o processo de produção até o que sai do escapamento do veículo.
O executivo informa que, se for medido só o que sai do escapamento, a nova linha de caminhões da Scania já atenderia a norma Euro 6 – normas de controle de emissões que vigoram atualmente na Europa e entrarão em vigor no Brasil em 2020 para novos veículos e no ano seguinte para caminhões e ônibus já em produção.
As entregas dos novos caminhões de grande porte aos clientes ocorrerá em março, mas o executivo não informa quantas unidades já foram vendidas pois há negócios a serem fechados a partir de agora. Por ainda ter baixa escala produtiva, os preços dos novos veículos são entre 30% e 40% acima das versões a diesel, que custam a partir de R$ 400 mil.
A Ambev já testa dois caminhões a GNL da Scania, para entregas de longa distância, e também dois caminhões elétricos da Volkswagen, para entregas dentro das cidades.
Ponte para elétricos
Podgorski ressalta que o uso do gás é uma ponte até que veículos híbridos e elétricos sejam mais acessíveis. “Hoje a conta (dos elétricos) não fecha, e isso deve ocorrer no futuro”, diz.
A Volkswagen Caminhões e Ônibus, que no fim do ano iniciará a produção de caminhões elétricos de pequeno porte na fábrica de Resende (RJ), calcula que, inicialmente, os modelos que não emitem nenhum tipo de poluição vão custar mais que o dobro de um convencional.
O presidente da Scania, assim como o da Volkswagen, Roberto Cortes, defendem incentivos governamentais para atrair consumidores de veículos movidos a combustíveis renováveis, como isenção ou redução de IPVA ou ICMS. Podgorski cita, por exemplo, que na Alemanha os caminhões a gás são isentos de pedágio. Há cidades europeias que vão proibir a circulação de veículos a diesel nos centros urbanos, que também terão os impostos sobre a compra aumentados.
O Brasil precisa ampliar as redes de abastecimento, tanto de gás quanto de energia elétrica. Para ajudar no abastecimento, a Scania inaugurou um posto de GNV dentro do complexo produtivo para abastecer os caminhões que saem da fábrica para serem entregues aos clientes.
Expansão no ABC
A fábrica da Scania em São Bernardo é a segunda maior do grupo sueco em capacidade produtiva, de 30 mil unidades ao ano. Hoje, a unidade opera com cerca de 75% de sua capacidade e emprega 4 mil funcionários. O aumento de capacidade ocorrerá se a demanda por produtos crescer, informa Podgorski. O encerramento de operações da Ford não altera os negócios da Scania pois ela só produz veículos de grande porte.
A empresa exporta 60% de sua produção. Em 2019, o grupo vendeu 12,7 mil caminhões pesados, alta de 57,8% em relação ao ano anterior. As vendas totais do segmento cresceram 48,7%, para 51,7 mil unidades. A líder dessa categoria é a Mercedes-Benz, com vendas de 14,1 mil veículos no ano passado, volume 41,8% maior ante o de 2018.
Além das mudanças na fábrica para a produção de novos caminhões e ônibus, o grupo está construindo um centro logístico para estocar as peças usadas na linha de montagem em local mais próximo. Hoje, o depósito fica no município de Mauá, a 37 km de distância. O novo ficará a 4 km.
Cleide Silva, O Estado de S.Paulo