domingo, 27 de dezembro de 2015

Crise econômica obriga prefeituras a cortar investimentos

Sílvia Amorim - O Globo


Capitais registram queda de até 90%; perspectiva para 2016 é sombria



Prefeitura de Natal registrou maior queda: 89,9% - Divulgação


A menos de um ano para as eleições municipais, o desejo de muitos prefeitos era estar com canteiros de obras a pleno vapor para as inaugurações em 2016. Mas a crise econômica atingiu em cheio esses planos e nas grandes cidades, que, em tese, seriam menos vulneráveis à recessão, já é possível constatar que os investimentos despencaram até 90% este ano. O pouco recurso disponível em caixa está sendo canalizado para despesas obrigatórias como a folha salarial, e algumas capitais admitem que deverão fechar o ano com déficit. (Infográfico: situação fiscal das capitais)

Relatórios entregues pelos prefeitos das capitais ao Tesouro Nacional no início deste mês revelam que 14 das 22 prefeituras que apresentaram seus balancetes fiscais investiram menos este ano do que em 2014. As maiores quedas ocorreram em Natal (89,8%), Curitiba (63,7%) e Vitória (46,4%). A prefeitura do Rio é exceção e está no grupo das que ampliaram o ritmo, apesar do cenário econômico, graças à Rio-2016.

A desaceleração atingiu prefeituras de todos os portes. Na capital potiguar, o prefeito e candidato à reeleição Carlos Eduardo (PDT) aplicou até outubro R$ 35 milhões em investimentos — 10% do valor de 2014. Os números se repetem na Curitiba do prefeito Gustavo Fruet (PDT), também no primeiro mandato. Em Belo Horizonte, Marcio Lacerda (PSB) aplicou em obras e compras de equipamentos, até outubro, R$ 491 milhões contra R$ 846 milhões no mesmo período do ano passado.

— Os investimentos estão desabando este ano por causa da queda da arrecadação. Para ver como a situação é preocupante em todo o país, nos estados e no governo federal a queda é ainda maior — disse o economista e especialista em contas públicas Raul Velloso.

GASTO COM PESSOAL SOB ALERTA

Campo Grande vive situação ainda mais complicada. Alvo de uma crise política, além da econômica, a cidade está pagando salários parceladamente desde meados do ano. Ainda reduziu em 30% os investimentos, e o prefeito Alcides Bernal (PP), que ficou afastado do cargo por um ano e meio, pode fechar as contas no vermelho. No vermelho também está o gasto com pessoal no município. Cerca de 55% do que o governo arrecadou este ano foram para pagar salários.

A prefeitura está infringindo a Lei de Responsabilidade Fiscal, que limita a 54% da receita corrente líquida o gasto com pessoal. Isso se repete em São Luís.

No atual mandato, nunca a luz amarela referente às despesas com funcionário acendeu para tantos prefeitos de capitais. Onze ultrapassaram em outubro o limite de alerta imposto pela legislação (quando o gasto fica acima de 48,6% da receita).

Mais da metade das cidades avaliadas ampliou a folha de pagamento desde 2013. Essa expansão pode ter motivos além da crise.

— À medida que vai se aproximando o fim dos mandatos, é de se imaginar que os gastos com pessoal subam porque é no penúltimo ano que os prefeitos querem agradar por causa da eleição. Isso somado à crise, que frustrou as receitas, criou um problema maior para os municípios — disse Velloso.

A combinação de gastos elevados e arrecadação em baixa já levou, em outubro, duas prefeituras à lona. Natal e Manaus registraram déficit (gasto superior ao disponível em caixa). Sem perspectiva de melhorar a arrecadação, a tendência é que mais prefeituras registrem rombos nas contas de 2015, piorando a situação em 2016, ano eleitoral.

— Acho pouco provável que os municípios consigam equalizar esse déficit este ano — avaliou o professor da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe) Paulo Roberto Galvão.

Para o analista em Finanças Públicas Fábio Klein, a situação em 2016 pode ser ainda pior para os orçamentos municipais por causa do ano eleitoral.

— Há uma tendência dos governos de produzirem uma expansão dos gastos em ano eleitoral. Como muitos municípios vão começar 2016 já numa situação delicada, por causa do que aconteceu em 2015, isso vai exigir dos gestores um controle maior dos gastos, um desafio em ano de eleição — disse Klein.

De olho nesse cenário, a Fipe preparou para janeiro o curso inédito para gestores municipais “Como enfrentar a crise financeira nas prefeituras”.