O acordo entre Israel e Hamas é apenas uma das mudanças no tabuleiro geopolítico mundial que Donald Trump está promovendo
“Não vou começar guerras, vou pará-las”. Foram essas as palavras utilizadas por Donald Trump na noite do dia 5 de novembro de 2024, poucos minutos após triunfar nas eleições presidenciais contra Kamala Harris.
Menos de um ano depois, cumpriu a promessa.
O conflito entre Israel e o grupo terrorista Hamas, iniciado após o pogrom de 7 de outubro de 2023, encontrou uma resolução. Mesmo que temporária. Os 20 reféns israelenses ainda vivos foram libertados. Os corpos dos outros 28 que faleceram estão sendo devolvidos pelos algozes. O pesadelo das famílias e de uma nação inteira acabou.
Por outro lado, o Exército de Israel parou de bombardear Gaza para tentar erradicar o Hamas. E centenas de milhares de palestinos, utilizados como escudos humanos pelos terroristas, estão tentando retomar suas vidas sem o pavor da guerra.
Em questão de horas, Trump conseguiu juntar trinta líderes mundiais em uma cúpula na cidade egípcia de Sharm El Sheikh. Todos se comprometeram a ajudar na reconstrução de Gaza e a garantir que não ocorressem mais conflitos na região. Os países árabes colocando dinheiro para a reconstrução da Faixa. A ONU, os europeus e os turcos enviando tropas para garantir a segurança. O Brasil não foi convidado.
O acordo de cessar-fogo foi um momento histórico, que reafirmou a liderança global dos Estados Unidos e amplificou o prestígio de seu presidente. Um sucesso diplomático gigantesco. Que até os adversários de Trump reconheceram.
A revista britânica de esquerda The Economist, tradicionalmente duríssima com Trump, não poupou elogios.
“Nove meses após seu segundo mandato, ele fez um trabalho louvável ao lidar com a situação”, escreveu a publicação. “A trégua que ele negociou em Gaza não é exatamente a ‘paz eterna’ que aparenta ser. Mas é uma conquista real, que escapou ao seu antecessor, a ser adicionada aos Acordos de Abraão, nos quais quatro estados árabes normalizaram os laços com Israel durante seu primeiro mandato. É uma das três grandes decisões em que o Sr. Trump rompeu com o consenso americano habitual e alcançou o que parece, pelo menos no curto prazo, um sucesso.”
Em março, a Economist tinha publicado outra matéria, com o título “A era da geopolítica mafiosa de Donald Trump”. Hoje, elogia sua estratégia negocial “imprevisível”. Mudança dos tempos.
A revista Time, outra sempre implacável com o presidente americano, foi ainda mais longe e lhe dedicou uma capa inteira, com a foto de Trump e apenas duas palavras: “Seu triunfo”. O jornal israelense Jerusalem Post foi às bancas com a capa “Deus abençoe o pacificador”, e a foto do mandatário. Até mesmo Joe Biden reconheceu o sucesso. “Elogio o presidente Trump e sua equipe por seu trabalho para levar um novo acordo de cessar-fogo até a linha de chegada”, escreveu o ex-inquilino da Casa Branca.
Somente no Brasil, o ódio político continua falando mais alto. A velha mídia insiste em se recusar a aceitar que o fim das hostilidades foi uma vitória de Trump. Ainda insistem que a Flotilha da Greta Thunberg ou as marchas de LGBTs com camiseta do Hamas foram determinantes. Cegueira por excesso de bile. O governo Lula, logorreico na produção de notas, se trincheirou atrás de um consternado silêncio. E birutas de aeroporto na ativa, como o novo chefe da comunicação digital do PT, Pedro Rousseff, sobrinho da expresidente Dilma, postam nas redes sociais que, na verdade, quem costurou o acordo foi Lula. Delírios que confirmam como a genética pode ser uma condenação.
Pedro Rousseff - Quem ACABOU com a GUERRA em Gaza chama-se LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA! - Trump AJUDOU a financiar a GUERRA = Lula FEZ O ACORDO pela PAZ! “O Mundo precisa GASTAR dinheiro não com ARMAS. Sim com COMIDA para MATAR A FOME de MILHÕES de pessoas.” OBRIGADO, LULA!
Admirável mundo novo
Diferentemente dos seus antecessores do Partido Democrata, Trump tem uma visão muito menos idealista e muito mais pragmática da política internacional. Traduzindo: vale a pena enviar tropas apenas se a segurança nacional dos Estados Unidos for ameaçada. Caso contrário, as potências locais que se resolvam.
Na “Doutrina Trump”, intervenções militares ideológicas, como a da Líbia (2011), decidida por Barack Obama, ou do Kosovo (1998), determinada por Bill Clinton, não devem se repetir. Nem mesmo uma invasão como a do Iraque (2003), decretada pelo neocon George W. Bush — ala idealista do Partido Republicano — para “exportar a democracia”. Todas elas fracassos retumbantes em termos estratégicos. Desperdícios inúteis de vidas americanas, de recursos americanos e de capital diplomático americano. Sem retorno algum para os EUA.
Trump optou pelo freio de arrumação. “América primeiro” foi o lema da campanha de 2016. “Fazer a América grande de novo” foi o da segunda. Concentrar-se no cenário interno, sanear o orçamento, voltar a crescer, retomar a liderança econômica, sem distrações inúteis. Fora das fronteiras americanas, o objetivo é um só: a paz.
O que não significa entreguismo. Ao contrário. Quando for possível, negociando. Se necessário, usando a força.
Em menos de um ano de mandato, Trump já conseguiu levar para a Casa Branca o presidente da Armênia e o ditador do Azerbaijão para assinar um acordo de paz, após mais de três décadas de hostilidades. Mediou o fim da guerra-relâmpago entre Índia e Paquistão que poderia escalar para nuclear. Pressionou um cessar-fogo entre Tailândia e Camboja após um conflito que matou pelo menos 45 pessoas. Resultados obtidos na base da persuasão.
Mas, no caso do conflito entre Israel e Irã, Trump não hesitou. Ordenou um bombardeio maciço das plantas nucleares dos aiatolás. Forçou Teerã a parar de atacar Israel. No caso dos rebeldes iemenitas Houthis, a Força Aérea e a Marinha dos EUA acabaram com suas instalações bélicas. Mesma coisa no caso do Hamas. Caso não tivesse aceitado o acordo, o presidente americano ameaçou desencadear “o inferno na Terra”. Os terroristas capitularam.
Uma estratégia muito parecida com a do presidente Theodore Roosevelt, que há cem anos baseou as relações externas dos EUA no lema “fale com suavidade, mas tenha na mão um grande porrete”.
Agora, com os acordos de Sharm El Sheikh, os sauditas se comprometeram a financiar a reconstrução de Gaza. Trump conseguiu levar de volta Riad na Terra Santa. Terão que cooperar com os israelenses. Vão se entender.
Estilo durão, entregas sólidas
Ao pensar em pacificadores, o nome de Trump pode não vir à mente imediatamente. Conhecido como um negociador agressivo, sem freios para enfrentar qualquer questão, há poucas semanas ninguém apostaria que ele poderia mudar o rumo de um Oriente Médio mergulhado no caos.
Quando Trump enviou na região seu genro, Jared Kushner, empresário judeu que gere um fundo de investimento bilionário com capital árabe, e Steve Witkoff, amigo de longa data, empresário da construção civil de Nova York. A velha mídia os denegriu como “incompetentes”. Eles conseguiram onde outros falharam.
Trump não apenas demonstrou disposição para descartar as estratégias do passado, mas também usou sua considerável influência como líder da superpotência mundial para pressionar um aliado e amigo como Israel a aceitar a paz.
Próxima parada, Kiev
Agora que o Oriente Médio está mais estável, o próximo objetivo de Trump é acabar com a guerra entre Rússia e Ucrânia. Já se encontrou várias vezes com o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky. Recebeu Vladimir Putin no Alasca. Mas não hesitou em fornecer mísseis de longo alcance para a Ucrânia, nem em pressionar Kiev a fazer concessões aos russos.
Os líderes das grandes potências só entendem uma língua, a da força. E só respeitam seus pares que demonstram vontade e capacidade de usá-la. Nas relações internacionais, fracos não negociam, apenas sucumbem. Trump sabe bem disso. E está deixando bem claro para o mundo que “America is Back”. A América voltou. Para botar ordem.
Carlo Cauti - Revista Oeste