segunda-feira, 30 de março de 2020

Tesouro vê déficit de R$ 400 bi no setor público em 2020 com crise provocada pelo vírus chinês

O Tesouro Nacional estima que o déficit do setor público consolidado, que inclui estados e municípios, vai se aproximar de R$ 400 bilhões neste ano se consideradas as medidas econômicas de mitigação da crise provocada pelo vírus chinês e a queda prevista na arrecadação.
Considerando apenas o governo central (que reúne Tesouro, Banco Central e Previdência), o rombo previsto está ao redor de R$ 350 bilhões.
“Ao que tudo indica, pelo conjunto de medidas já anunciadas e de perda de arrecadação que poderá ser ainda maior do que aquela já projetada no primeiro relatório bimestral, o déficit primário do Governo Central, em 2020, poderá alcançar ou superar a cifra de R$ 350 bilhões”, afirma o Tesouro.
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Fachada do Ministério da Economia - Pedro Ladeira - 3.jan.2019/Folhapress
O órgão demonstra preocupação em relação aos riscos provocados pela expansão de gastos do governo e defende que essas despesas não sejam prolongadas para além de 2020.
“Enquanto a expansão da despesa para combater os efeitos da crise do Coronavírus ficar restrito a programas temporários, ou seja, despesas que começam e terminam neste ano, não deverá haver problemas para a retomada do ajuste fiscal estrutural”, diz em nota.
Apesar das preocupações, as medidas anticrise são vistas no Tesouro como necessárias. "A piora fiscal deste ano é justificável, no Brasil e no mundo. Mas temos que ter cuidado para não transformar despesas temporárias em permanentes", ressaltou o secretário do Tesouro, Mansueto Almeida.
Segundo ele, as estimativas de resultado para 2020 vão passar por constante revisão conforme são atualizadas as previsões de receitas e despesas. "Os R$ 350 bilhões [de déficit para o governo central] é o número de grandeza que temos hoje, mas ele será continuamente avaliado", afirmou.
Mansueto foi questionado sobre o ritmo das medidas por parte do Ministério da Economia e mencionou a burocracia exigida pela legislação orçamentária como um entrave. Por isso, comemorou a decisão do ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), de flexibilizar o atendimento a determinados artigos da LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal) neste ano.
A decisão libera o governo de fazer compensação orçamentária ao criar novas despesas. Entre os artigos alvo da flexibilização, está também o que exige a estimativa orçamentária de novos gastos.
Mansueto diz que o governo vai continuar apresentando tais estimativas, mas agora com o conforto de que elas não precisam ser tão exatas. "A gente não pode se dar ao luxo de passar meses discutindo se uma planilha deve ter R$ 1 bilhão ou R$ 2 bilhões a mais. Tem que ser muito rápido e fazer uma estimativa da melhor maneira ao longo de dias", afirmou.
De acordo com o Tesouro, os próximos três meses terão maior concentração de crescimento dos gastos públicos, com a implementação de programas como o auxílio de R$ 600 a informais, a antecipação de benefícios a aposentados e trabalhadores e o reforço no programa Bolsa Família.
A meta de resultado primário para este ano foi estabelecida em R$ 124,1 bilhões de déficit. Após a decretação de estado de calamidade pública, porém, o governo não precisará respeitar esse resultado.
Os comentários foram feitos pelo Tesouro em apresentação sobre o resultado de fevereiro, que ainda não reflete os efeitos das medidas tomadas em meio à pandemia. As contas do governo central registraram um déficit de R$ 25,9 bilhões em fevereiro. O dado é o pior para o mês em três anos.
Diante da chegada do vírus chinês ao país e do agravamento da crise, o governo federal anunciou, a partir de março, ações que vão gerar impacto aos cofres públicos.
No combate à pandemia, o Tesouro sugere que sejam evitados “erros cometidos em 2009”, quando, segundo o órgão, ações de combate à crise se tornaram políticas permanentes de concessão de subsídios e intervenção do Estado na economia.
“Em um contexto que as empresas estão fechadas, com restrições à mobilidade urbana e isolamento social, o desafio não é a expansão da demanda para combater o desaquecimento da economia, mas sim aumento do gasto público para amenizar a perda de renda de uma parcela significativa de trabalhadores e das empresas que precisam da ajuda do setor público para manter suas necessidades financeiras básicas e mesmo para a manter o emprego ao longo do período mais crítico da crise”, afirma.

Bernardo Caram e Fábio Pupo, Folha de São Paulo