segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

"Uma falcatrua", editorial de O Globo

Ao se começar a desvendar o esquema de corrupção na Petrobras, caiu por terra a defesa desse negócio


Frente às informações sobre a estranha compra de uma refinaria em Pasadena, no Texas, pela Petrobras, cujo preço final ultrapassou o bilhão de dólares, bem mais que o antigo dono pagara para adquiri-la, o comportamento da direção da estatal foi o clássico: negar e garantir que o negócio havia sido um sucesso.

Até que a própria presidente Dilma, na fase de esquentamento para a campanha eleitoral — e talvez por isso — respondeu, por escrito, a perguntas do jornal “O Estado de S. Paulo” sobre Pasadena, e resolveu ser clara: como presidente do Conselho de Administração da estatal, antes de eleger-se em 2010, ela e demais conselheiros aprovaram a operação com base num parecer “técnica e juridicamente falho”, redigido pela diretoria Internacional da empresa. Interessados em fazer com que aquele caso fosse esquecido, como alguns diretores que estavam na Petrobras à época e políticos padrinhos de altos funcionários da estatal, não puderam mais controlar o assunto. O gênio escapou da garrafa.

Por meio de duas CPIs e em comissões ordinárias, o Congresso passou a ouvir esses dirigentes e a atual presidente, Graça Foster. Apesar de todo o controle que a base aliada exerce na Câmara e no Senado, sempre escapam informações elucidativas. Graça Foster, por exemplo, revelou que a estatal já havia contabilizado em balanço uma perda patrimonial de meio bilhão de dólares causada pelo passo mal dado com essa refinaria. 

Demoliam-se argumentos como o de que as oscilações do mercado internacional justificariam tudo. Afinal, uma grande perda já havia sido contabilizada. Avolumaram-se, então, as suspeitas sobre o papel do então diretor Internacional da Petrobras, Nestor Ceveró, na compra de Pasadena, ele o responsável pelo documento “técnica e juridicamente falho”

A confirmação de que Pasadena foi uma das gazuas usadas pelo maior esquema de corrupção de que se tem notícia na vida pública brasileira para saquear cofres públicos veio da Operação Lava-Jato, conduzida pela Polícia Federal, Ministério Público e Justiça Federal do Paraná. A investigação de um bilionário sistema de lavagem de dinheiro gerenciado pelo doleiro Alberto Youssef — ele já aparecera no escândalo da remessa ilegal de dinheiro pelo Banestado, no mensalão e num caso de pagamento de propinas de empreiteiras a políticos — revelou enorme conexão entre empreiteiras, altos funcionários da Petrobras e políticos, principalmente do PT, do PMDB e do PP. 

Preso, depois de Youssef, e, como este, depoente no processo sob o regime de delação, um companheiro de diretoria de Cerveró, Paulo Roberto Costa, da área de Abastecimento, afirmou que recebeu US$ 1,5 milhão apenas para “não atrapalhar” a compra da refinaria — apelidada por técnicos da estatal de “ruivinha”, por ter muitos equipamentos enferrujados.

Já se tem certeza de que aquele negócio foi mais uma das falcatruas do esquema montado na estatal a partir do aparelhamento lulopetista da empresa. Mas ainda é preciso detalhar esta história e processar os responsáveis.