domingo, 28 de dezembro de 2014

Desgoverno Dilma: Orçamento reduzido faz Itamaraty atrasar pagamento de aluguéis

Isabel Fleck e Rodrigo Vizeu - UOL


Numa das embaixadas brasileiras abertas na África na gestão Lula, o atual chefe do posto divide seu tempo entre as tarefas de representante do governo brasileiro no país e as que –numa situação normal– seriam feitas por assistentes, como enviar telegramas e traduzir currículos.

O acúmulo de funções, numa embaixada que previa ao menos cinco funcionários, faz com que o diplomata tenha que estender constantemente seu expediente solitário até a madrugada. Ele só aceitou falar sob anonimato.

Trata-se de mais um sintoma do desprestígio orçamentário do Itamaraty ao final do primeiro mandato de Dilma Rousseff. Entre 2003 e 2013, a participação do ministério no Orçamento caiu pela metade, de 0,5% para 0,28%.

O diplomata multitarefa na África não é o único a sofrer com a falta de braços. Segundo o Itamaraty, em 70 embaixadas e consulados criados no governo Lula, há 315 funcionários, quase metade dos cerca de 570 estipulados em portaria de 2013.

O governo não informou dados de sete postos reabertos.

Dos lotados nessas embaixadas, 148 são diplomatas –menos de dois terços do que estava previsto para o funcionamento das representações.

Para um alto diplomata, é evidente que a "expectativa" criada nos oito anos da gestão Lula, com os novos postos, "não foi sustentada" no governo Dilma.

"Eu diria que é melhor não ter uma embaixada do que ter uma vazia ou não operacional", diz Oliver Stuenkel, professor da FGV. "É muito comum ouvir queixas de diplomatas de outros países que ficaram animados com a abertura de uma embaixada, mas depois viram que ela não funciona de verdade."

ATRASOS E MULTAS

No último ano, a penúria ficou mais evidente com o atraso de pagamentos de auxílio-moradia para funcionários no exterior e até mesmo do aluguel dos imóveis ocupados em alguns postos.

Segundo a Folha apurou, em ao menos cinco representações, o governo brasileiro teve multas de até US$ 3.500 devido à inadimplência.

Elas incluem a sede da missão do Brasil na OEA (Organização dos Estados Americanos), no complexo Watergate, em Washington. A multa, lá, foi de quase US$ 1.500.

As maiores multas teriam sido em imóveis ocupados pelos consulados de São Francisco, nos EUA, e de Xangai, na China: cerca de US$ 3.000 e US$ 3.500, respectivamente. Em Pretória, na África do Sul, o proprietário ameaçou acionar órgãos locais para que o aluguel fosse pago.

O Itamaraty não confirmou se pagou ou renegociou as multas, mas disse que os aluguéis estão em dia em toda a rede de postos no exterior.

Para o ex-secretário-geral do MRE Marcos de Azambuja, a inadimplência afeta a imagem do Brasil, não só do governo. "Um país caloteiro internacionalmente tem uma visibilidade muito negativa."

O Brasil devia às Nações Unidas, até 23 de dezembro, ao menos US$ 170 milhões. Destes, US$ 77 milhões são do orçamento regular –o Brasil é o segundo maior devedor, atrás dos EUA– e US$ 87 milhões são para a manutenção das forças de paz. O resto (US$ 6 milhões) é para tribunais como o TPI (Tribunal Penal Internacional).

Apesar de considerar esse tipo de atraso comum em vários países-membros, que só pagam às vésperas de votações importantes, o professor da FGV e colunista da Folha Matias Spektor aponta o principal impacto negativo para o Brasil: "Temos condições humanas de ocupar muito mais postos na ONU e não o fazemos porque estamos em dívida", avalia.