quinta-feira, 27 de abril de 2017

STF nega tendência em soltar alvos da Operação Lava Jato

Breno Pires e Rafael Moraes Moura - O Estado de S.Paulo

Ministros, porém, divergem sobre habeas corpus para presos preventivamente, caso de José Dirceu, que será julgado na próxima semana


Um dia após decidirem pela libertação de dois condenados na Lava Jato pela Justiça Federal de Curitiba, integrantes da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) afirmaram que as decisões confirmam a jurisprudência do colegiado, mas que isso não significa uma revisão geral das prisões preventivas decretadas na primeira instância em novos habeas corpus. 
Formada pelos ministros Gilmar Mendes, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Celso de Mello e Edson Fachin, a Segunda Turma decidiu libertar o pecuarista José Carlos Bumlai e o ex-tesoureiro do PP João Cláudio Genu, manter o lobista Fernando Moura fora do regime fechado, conforme decisão anterior do ministro Teori Zavascki, e dar seguimento a um habeas corpus da defesa do ex-ministro José Dirceu, que será julgado na próxima terça-feira, 2. Fachin, relator da Lava Jato, saiu vencido em três votações.
Foto: Gabriela Bilo/Estadão
Bumlai
Empresario investigado pelo Lava Jato, José Carlos Bumlai
O ministro Dias Toffoli, que votou a favor da defesa nos quatro casos analisados na Segunda Turma, negou haver uma tendência em libertar presos da Lava Jato. “Cada caso é um caso. Em matéria criminal, não há decisão coletiva”, disse.
Gilmar Mendes afirmou que a Turma estabeleceu “limites em relação às prisões”. “Acho que isso traduz um entendimento tradicional do Supremo sobre prisão preventiva”, afirmou o ministro, conhecido crítico do que chama de “alongadas prisões que se determinam em Curitiba”.
Debate. A principal discussão jurídica em relação às decisões desta terça-feira, 25, é motivo de divergência entre as duas turmas do STF: se um habeas corpus pode ser aceito pelo Supremo depois de a pessoa que for presa preventivamente acabar posteriormente condenada em primeira instância.
O Supremo tem um entendimento de que a execução da pena só deve começar a partir da condenação em segundo grau – o que ainda não aconteceu nos quatro casos analisados na terça.
A Primeira Turma do STF entende que a condenação em primeira instância de alguém que já estava preso preventivamente é um motivo a mais para a continuidade da prisão preventiva. Esse foi o argumento usado pelo ministro Edson Fachin para não revogar as prisões de Dirceu e Genu e para não ir além da prisão domiciliar que já havia sido concedida a Bumlai e a Fernando Moura.
A Segunda Turma decidiu pelo contrário: um habeas corpus não fica prejudicado por uma condenação posterior à prisão preventiva. É com base neste entendimento que os ministros decidiram julgar os habeas corpus de Genu e de Dirceu, contrariando as decisões monocráticas de Fachin.
Jurisprudência. O ministro Ricardo Lewandowski afirmou que “não houve inovação”. “Todos nós invocamos a jurisprudência da própria Segunda Turma”, disse.
Gilmar Mendes respondeu com certa ironia sobre se as decisões indicavam que a visão crítica que ele tem acerca de “alongadas prisões” é compartilhada pelos colegas de turma. “Vai me dar título de futurólogo?”, indagou.
Ponderando sobre as decisões da Segunda Turma, o ministro Luiz Fux, da Primeira, disse que a demora na condenação em segunda instância não deve motivar a libertação de presos. “Se eles (ministros da Segunda Turma) fixarem a tese de que a demora no julgamento do recurso pode levar à soltura, é uma tese complicada”, disse Fux.
Ibsen. Para Edson Fachin, o cenário brasileiro sugere uma leitura da peça Um inimigo do povo, do escritor e dramaturgo norueguês Henrik Ibsen.

Protagonista da trama, Dr. Stockmann é um médico que resolveu denunciar problemas na pequena cidade da Noruega em que morava, virou desafeto de autoridades locais e se viu isolado. A obra retrata o conflito entre os interesses individual e coletivo. Em uma passagem do livro, o Dr. Stockmann diz: “O homem mais forte é o que está mais só”.