O ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato no Supremo Tribunal Federal, despejou sobre os microfones nesta quarta-feira uma frase enigmática. Ao comentar a sessão em que a Segunda Turma do Supremo mandou soltar, por 3 votos a 2, uma dupla de condenados da Lava Jato, Fachin declarou aos repórteres: “Eu saí daqui ontem com vontade de reler o Ibsen: ‘O inimigo do Povo’, a história do doutor Stockmann.”
A menção ao dramaturgo Henrik Ibsen não foi gratuita. A peça escolhida por Fachin não poderia ser mais simbólica. Conta a história do médico Thomas Stockmann. Ele descobriu os poderes curativos das águas de uma cidade. A revelação trouxe prosperidade. O diabo é que o mesmo Stockmann se dá conta de que as águas contaminaram-se. Esforçou-se para convencer a população. Virou “inimigo do povo”, perseguido nas ruas.
Na fatídica sessão da Segunda Turma, Fachin votou pela manutenção da prisão domiciliar do pecuarista José Carlos Bumlai e do encarceramento do ex-gestor das arcas do PP, João Cláudio Genu. Nos dois casos, o relator perdeu por 3 a 2. Ficou entendido que a posição mais rigorosa em relação à Lava Jato tornou-se minoritária na turma que cuida do escândalo do petrolão na Suprema Corte.
Na peça de Ibsen, o doutor Stockmann, incompreendido e amaldiçoado, faz uma espécie de exaltação à individualidade: “O homem mais forte é o que está mais só”, diz ele na última frase do enredo, antes do fechamento das cortinas. Quer dizer: ainda que a maioria do “povo” do Supremo o veja como “inimigo”, o doutor Fachin parece disposto a proclamar que a abertura das trancas de Curitiba pode contiminar as águas da Lava Jato. Fará isso mesmo que tenha de se trancar na fortaleza de sua solidão.
Vem aí o julgamento de um pedido de liberdade do condenado José Dirceu. Edson Fachin votou a favor da tranca. Logo, logo descobrir que o pior tipo de solidão é a companhia de uma turma.