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Mel Casagrande, que abriu uma loja após ser demitida do emprego de comissária em companhia aérea |
JOANA CUNHA
ÁLVARO FAGUNDES
Folha de São Paulo
ÁLVARO FAGUNDES
Folha de São Paulo
A carteira de trabalho deixou de ser uma realidade para metade dos brasileiros que sobreviveram à crise econômica, mas nem assim o sonho da aposentadoria perdeu força.
De acordo com as estatísticas do IBGE, o grupo que trabalha sem carteira assinada chegou no fim do ano passado à marca de 50% da população ocupada no Brasil, pela primeira vez em cinco anos.
A onda de demissões dos últimos dois anos fez crescer o número de pessoas que trabalham por conta própria, abrindo seus próprios negócios ou atuando sem registro.
Embora a tendência nessas formas de trabalho seja a informalidade, o que se viu foi um aumento do número de pessoas que contribuíram para a Previdência Social.
Dos pouco mais de 90 milhões de trabalhadores brasileiros (com e sem carteira), 65% contribuíram para a Previdência no quarto trimestre do ano passado, mais do que os 62% de quatro anos antes.
Em números absolutos, a alta foi de 56 milhões de trabalhadores para quase 59 milhões no mesmo intervalo.
"O senso comum leva a pensar que seria o contrário", diz Cimar Azeredo, coordenador de Trabalho e Rendimento do IBGE. "Mas, embora a crise tenha levado ao desemprego, a contribuição manteve o ritmo de crescimento."
Segundo ele, trata-se de um movimento gradual, que evolui à medida que a população "ganha acesso à educação e à informação sobre a importância de contribuir".
Entre os trabalhadores por conta própria, que hoje reúnem 22 milhões de pessoas
-de ambulantes a consultores-, a parcela dos que contribuem cresceu de 23% em 2012 para 31% no fim de 2016.
-de ambulantes a consultores-, a parcela dos que contribuem cresceu de 23% em 2012 para 31% no fim de 2016.
Para quem trabalha sem registro em carteira, o aumento na parcela de contribuintes foi de quase 11% para 15% nos últimos cinco anos.
O movimento se repete entre os empregadores, em que a parcela de pessoas que contribuem para a Previdência aumentou de 69% para 78%.
É o caso de Mel Casagrande, que trabalhou com carteira assinada por 15 anos na companhia aérea TAM, mas foi demitida em um corte promovido durante a recessão.
"Chorei três dias e levantei depois pensando que era hora de colocar em prática um sonho de negócio engavetado por muito tempo", conta.
Casagrande abriu uma pequena loja de roupas femininas no ano passado e decidiu agora expandir para vender também peças de decoração.
GERAÇÃO
Trata-se de uma questão cultural, segundo o professor Bruno Ottoni, da FGV. "O indivíduo que passou pelo emprego formal está acostumado, entende que o benefício existe e tem motivação para continuar", diz. "O que estava no mercado informal se desmotiva, principalmente agora que a lei vai mudar."
A professora do Ibmec/RJ Ylana Miller pondera que a Previdência pode sofrer um "impacto geracional", intensificado pela reforma em discussão no Congresso, dificultando a conquista do benefício. "Essa nova geração não vê mais tanto valor em contribuir porque não tem uma contrapartida adequada. Por isso vemos crescer a tendência de preferência por uma previdência privada", diz.