terça-feira, 21 de abril de 2015

"O fim das coligações e a cláusula de desempenho", por Samuel Moreira

Folha de São Paulo


Recentemente, o instituto Datafolha publicou pesquisa mostrando que 71% dos brasileiros não têm partido político de sua preferência. Os dados, de fevereiro de 2015, reforçam a percepção de que precisamos mudar as regras atuais para criação e funcionamento de partidos, pois –ao meu ver– são inadequadas e ineficientes.

Não é o caso, nem o meu desejo, limitar a criação de legendas. Porém, é preciso ter regras mais rigorosas do que as atuais. Por exemplo, para criar um partido é necessário um número menor de assinaturas (0,5% dos eleitores que votaram na última eleição) do que para apresentar um projeto de lei de iniciativa popular (leis nacionais demandam 1% dos eleitores).

É preciso considerar ainda que exista um vínculo inicial entre o eleitor e o partido, a partir da filiação à legenda a ser criada. Não é prudente que a mesma pessoa assine simultaneamente pedidos de criação de partidos diferentes.

Outra questão relevante é o funcionamento dos partidos após a sua criação. Não é razoável que siglas sem um número mínimo de votos nas eleições gerais tenham acesso ao fundo partidário e ao tempo de TV e rádio. Pois, para terem esses direitos devem ter um determinado desempenho, um número mínimo de votos. 

Ter representação de fato.

Vejam, não se trata de criação de partido. Criem-se quantos puder. Trata-se de funcionamento de partidos existentes. Uma boa proposta seria que a legenda obtivesse ao menos 5% de votos, o que possibilitaria termos até 20 partidos em funcionamento.

Observem que para qualquer candidato exercer o mandato, ele precisa obviamente se eleger, ter necessariamente um bom desempenho, ou seja, precisa ter votos. Isso deve valer também para os partidos políticos. Já que não é viável que partidos sem um número mínimo de votos possam ter direito a parte do fundo partidário, parte do tempo de TV e rádio como ocorre nos dias de hoje.

Por conta da ausência de boas regras, a criação de partidos no Brasil tornou-se, para alguns, um bom negócio. Quase sempre a criação dessas novas legendas estão a serviço de alguém, de governantes ou de caciques políticos que viram verdadeiros donos desses "cartórios" e que formam coligações num verdadeiro 'toma lá, dá cá', numa farra que o eleitor sequer consegue perceber.

Farra, na maioria das vezes, realizada a portas fechadas, chancelada pelas tais comissões provisórias que estão mais para permanentes pelo seu longo e indefinido tempo de duração.

São coligações realizadas à revelia do eleitor, muitas dissolvem-se logo após as eleições, servindo apenas a interesses imediatos e inconfessáveis. Segundos preciosos de TV e rádio viram moeda de troca, usados para conseguir cargos, ainda que em escalões inferiores.

São ajuntamentos que o eleitor desconhece pois um mesmo partido coligado para um candidato à presidente da República alia-se aos adversários na disputa para governador, com outras siglas para deputado federal e ainda outras para deputado estadual. Difícil que o eleitor entenda. Impossível que ele aprove.

Além disso, a fórmula para a eleição é ininteligível para a maioria dos eleitores. Mistura os desconhecidos (e complicados) quocientes eleitorais, dando margem a distorções como as de um astro puxador de votos eleger quem não teve votação relevante ou ainda votar em um partido e eleger outro.

Proibir as coligações é bom para o eleitor, que saberá efetivamente em que partido está votando. E cria ainda mecanismos para que as agremiações se esforcem para disputar eleições com seus próprios candidatos e cresçam a cada pleito.

O fim das coligações nas eleições proporcionais e a introdução de uma clausula de desempenho seriam mudanças que fortaleceriam os partidos e melhorariam nosso sistema político.

SAMUEL MOREIRA, 52 anos, é deputado federal pelo PSDB-SP e membro da Comissão de Reforma Política na Câmara