A concessão de habeas corpus a empreiteiros presos em Curitiba reafirma que não há tribunais de exceção na democracia, o que implica bases sólidas para as denúncias
Tomada a decisão, por três votos a dois, pela Segunda Turma do Supremo, os procuradores que trabalham na Operação Lava-Jato para desbaratar o esquema de corrupção na Petrobras fecharam-se em reunião. Sinal de que o golpe foi sentido.
Afinal, o STF, ao conceder o habeas corpus pedido por Ricardo Pessoa, empreiteiro da UTC, tido como chefe do cartel que atuava na estatal, e estender o benefício a oito outros, também abrigados em carceragens em Curitiba desde novembro do ano passado, afetou a estratégia do juiz federal do caso, Sérgio Moro, e do Ministério Público, de estender ao máximo as detenções, a fim de relaxar resistências a acordos de delação premiada.
Moro segue a experiência das Mãos Limpas (“Mani Pulite”), grande operação executada na Itália na década de 90, que desmontou articulações entre mafiosos e políticos. Nela, longas detenções preventivas facilitaram a colaboração de criminosos. O mesmo tem acontecido com denunciados na Lava-Jato, com apoio, reconheça-se, de Cortes superiores, inclusive o STF, onde habeas corpus foram rejeitadas sucessivamente. Mas há limites. Mesmo assim, todos ficarão em prisão domiciliar, monitorados eletronicamente.
O ministro Teori Zavascki, relator dos inquéritos da Lava-Jato na Segunda Turma, argumentou que Pessoa, já afastado da UTC, impedida por sua vez de firmar contratos com a Petrobras, não terá condições de, em semiliberdade, prejudicar as investigações.
Deu o voto vencedor. Gilmar Mendes, outro a concordar com Teori, disse que o Supremo não pode agir condicionado pelo “clamor público”. É certo, nem sob pressão de poderosos.
Dias Toffoli foi o terceiro voto a favor do relaxamento da prisão preventiva. Mas a questão não é pacífica, tanto que Cármen Lúcia e o decano Celso de Mello assumiram posição oposta.
A democracia é incompatível com tribunais de exceção, fica mais uma vez referendado.
Uma coisa, como se discute, é decretar o cumprimento de penas de prisão a partir do veredicto da segunda instância, fórmula proposta para combater o grande sentimento de impunidade existente no país. Outra, estender em excesso a prisão preventiva, como se definitiva fosse.
Fica claro que a decisão da Segunda Turma exige que o Ministério Público faça competente encaminhamento das denúncias a Moro, para que prováveis condenações em primeira instância sejam confirmadas no julgamento dos recursos. Consta que Ricardo Pessoa (UTC) e José Aldemário Pinheiro Filho, o “Léo Pinheiro” (OAS), outro que passou para prisão domiciliar, são donos de informações incandescentes sobre a participação da cúpula do PT, Lula em destaque, e governo nos esquemas de corrupção na estatal e até fora dela. Cabe ao Estado acusá-los com provas consistentes, como forma de convencê-los a aderir à delação premiada.