sexta-feira, 12 de setembro de 2025

Ana Paula Henkel - 'Os ventos do Norte em tempos sombrios'

Para os EUA, esse momento transcende as fronteiras brasileiras, emergindo como um alarmante sinal de um padrão global de perseguição política que expõe a vulnerabilidade da democracia perante um poder judicial corrompido


Ministro do STF, Alexandre de Moraes | Foto: Montagem Revista Oeste/Shutterstock 


O mundo nunca mais foi o mesmo após o 11 de setembro de 2001, quando ataques terroristas abalaram os Estados Unidos, deixando cicatrizes permanentes e redefinindo a segurança global. Aquele dia sombrio, marcado pelo colapso das Torres Gêmeas e pela destruição no Pentágono, transformou para sempre a nação americana, impregnando-a com uma mistura de resiliência e desconfiança. 

Agora, 24 anos depois, o Brasil parece destinado a inscrever em suas próprias páginas escuras um novo 11 de setembro — não com aviões e explosões, mas com o completo desvirtuamento dos pilares democráticos de sua República. Que constem nos autos: na noite de 11 de setembro de 2025, a Suprema Corte do Brasil condenou o expresidente Jair Bolsonaro a 27 anos e 3 meses de prisão por ter ousado ser uma voz dissidente do sistema — um veredito que muitos americanos veem como uma afronta à Justiça e um reflexo de tribunais de exceção que ecoam as eras mais sombrias da humanidade. 


Julgamentos da Ação Penal 2668 – Núcleo 1, em Brasília, DF (11/9/2025) | Foto: Antonio Augusto/STF 


Para os Estados Unidos, esse momento transcende as fronteiras brasileiras, emergindo como um alarmante sinal de um padrão global de perseguição política que expõe a vulnerabilidade da democracia perante um Poder Judiciário corrompido. 

As cenas do julgamento de Bolsonaro, marcado por uma imparcialidade duvidosa e decisões predeterminadas, ressoaram profundamente entre os americanos, evocando os desafios enfrentados por Donald Trump em seus próprios embates legais e persecutórios. A semelhança entre as duas situações — acusações amplamente percebidas como politicamente motivadas, processos conduzidos por figuras com conflitos de interesse e a ausência de um devido processo robusto — é evidente, mas os americanos destacam que as instituições de seu país, especialmente a Suprema Corte, funcionam como projetadas, servindo como uma barreira que impediu que a perseguição a Trump atingisse os mesmos extremos vistos no Brasil. Esse contraste reforça a apreensão de que o caso Bolsonaro é um prenúncio do que pode acontecer quando os freios e contrapesos democráticos são solapados por ativismo com fantasia de toga.


Julgamentos da Ação Penal 2668 – Núcleo 1, em Brasília, DF (11/9/2025) | Foto: Antonio Augusto/STF 

Ao término do que parecia o “chá das cinco” da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), uma sessão marcada por risadas, piadas e elogios mútuos entre os juízes que julgavam os réus, autoridades americanas, em uma rara demonstração de solidariedade transatlântica, tomaram a rede X para denunciar o que chamam de “caça às bruxas” e “perseguição política”. O tom festivo da corte brasileira, contrastando com a gravidade das acusações, alimentou a percepção nos EUA de um tribunal desprovido de seriedade ou imparcialidade, evocando memórias de julgamentos manipulados das eras mais sombrias da humanidade. 

Desde a carta de Donald Trump de 9 de julho de 2025, na qual impôs tarifas de 50% ao Brasil e acusou o país de conduzir uma “perseguição política” contra Bolsonaro, os americanos passaram a ver o STF como um tribunal de exceção, como reminiscentes de processos stalinistas ou da Inquisição, onde a lei foi distorcida para servir a interesses políticos. Essa indignação, amplificada novamente essa semana por figuras como Marco Rubio e Jason Miller, reflete uma determinação de transformar o caso em um símbolo global da luta contra a corrupção judicial.


O secretário de Estado Marco Rubio e o presidente dos EUA, Donald Trump, durante uma reunião de gabinete na Casa Branca, em Washington, D.C., EUA (26/8/2025) | Foto: Reuters/Jonathan Ernst 


O contexto do julgamento: uma perspectiva americana 

Para o governo de Trump, o julgamento de Bolsonaro é visto por muitos como um espelho distorcido das batalhas legais enfrentadas por Trump depois das eleições de 2020. A percepção é que o STF, liderado pelo juiz Alexandre de Moraes, agiu como um tribunal de exceção, ignorando evidências e o devido processo legal para eliminar um líder político inconveniente. A condenação, baseada em acusações vazias, e até toscas, de tentativa de golpe, conspiração armada e danos ao patrimônio nacional, é vista como politicamente motivada, especialmente considerando que Bolsonaro estava fora do Brasil durante os eventos de 8 de janeiro de 2023, quando vândalos invadiram prédios do governo em Brasília. 

Para os americanos, o papel de Moraes como juiz e suposto alvo de um plano de assassinato levanta sérias questões sobre imparcialidade. A presença de juízes como Cristiano Zanin, ex-advogado de Lula, e Flávio Dino, ex-ministro da Justiça de Lula, no painel que condenou Bolsonaro, reforça a percepção de um importante conflito de interesses. Essa visão é amplificada pela ausência de um recurso a uma Corte superior, um princípio fundamental do sistema jurídico americano que muitos veem como ausente no Brasil.


O presidente Lula (à esq), na posse do advogado Cristiano Zanin (à dir) como ministro do STF (3/8/2023) | Foto: Valter Campanato/Agência Brasil 


Jason Miller: uma denúncia passional 

Jason Miller, estrategista político e assessor de Trump, foi uma das vozes mais expressivas no X logo após a declaração de culpa de Jair Bolsonaro. Em uma thread extensa, Miller descreveu o veredito como “uma completa desgraça para os ideais de democracia e justiça judicial”, uma condenação veemente do que ele considera uma farsa judicial. Ele acusou Alexandre de Moraes de orquestrar uma perseguição política, sugerindo que o objetivo era “ver Bolsonaro morrer na prisão”, uma acusação que reflete a percepção americana de uma sentença desproporcional e politicamente motivada.

Miller comparou o caso a uma “caça às bruxas” semelhante às ações contra Trump, destacando a falta de evidências diretas ligando Bolsonaro aos protestos de 8 de janeiro de 2023, quando ele já havia deixado o cargo e o país. Ele apontou conflitos de interesse claros, como o fato de três dos cinco juízes terem vínculos profundos com Lula, e criticou a ausência de apelação a uma corte superior. Sua promessa de “nunca ficar em silêncio” e de responsabilizar os juízes “todos os dias pelo resto de suas vidas miseráveis” reflete uma determinação americana de transformar o caso em uma causa global, ecoando a retórica de resistência que marcou o movimento Trump.

María Elvira Salazar: uma voz do Congresso  

A congressista republicana María Elvira Salazar, co-autora da lei que proíbe censores em solo americano, também se manifestou minutos depois do veredito, condenando o desfecho dado a Bolsonaro como “um ataque à democracia brasileira”. Representando um distrito na Flórida com uma significativa comunidade latino-americana, Salazar destacou o papel de Moraes como “um ditador com toga”, sugerindo que o STF agiu como uma ferramenta de repressão política. Sua crítica reflete a preocupação de muitos americanos de origem latina com o que percebem como um retrocesso democrático no Brasil, um país com o qual compartilham laços culturais e históricos.

Marco Rubio: a dura resposta oficial 

Já o Secretário de Estado dos EUA, Marco Rubio, emitiu uma declaração explosiva pelo perfil oficial do departamento na rede X, chamando a condenação de “perseguição política” perpetrada por um “abusador de direitos humanos sancionado, Alexandre de Moraes”, uma acusação que não deixa margem para meias-palavras. 

Rubio prometeu que “os Estados Unidos responderão de acordo com essa caça às bruxas”, deixando no ar a ameaça de sanções mais duras, medidas diplomáticas retaliatórias ou até mesmo uma reavaliação das relações com o Brasil, sinalizando uma guerra aberta contra o que considera uma afronta à justiça. 

Essa postura oficial não apenas eleva o caso a um nível de política externa de alto risco, mas também posiciona a administração Trump como uma defensora implacável dos valores democráticos compartilhados e denuncia o STF como uma máquina de opressão disfarçada de tribunal, alertando que tais abusos não serão tolerados. A retórica de Rubio, respaldada por sanções anteriores contra Moraes e tarifas de 50% impostas ao Brasil, reflete a determinação americana de transformar essa injustiça em um ponto de inflexão nas relações internacionais, colocando o peso da superpotência contra o que chama de “tirania judicial”.

Darren Beattie: uma análise direta 

Darren Beattie, ex-assessor de Trump e agora subsecretário para assuntos do Hemisfério Ocidental no Departamento de Estado, fez uma análise mais detalhada em um post logo depois do 7 de Setembro, mas ainda relevante para o contexto do julgamento. Ele descreveu a chicana como “um show de horrores judiciais”, comparando-o a processos stalinistas onde a culpa é predeterminada. Beattie argumentou que a condenação de Bolsonaro, sem provas concretas, é um precedente perigoso que pode inspirar ações semelhantes contra líderes conservadores em todo o mundo, incluindo os EUA.

Ecos de páginas sombrias 

Para os americanos que acompanham o caso, o julgamento de Bolsonaro ressoa como um eco sinistro dos tribunais de exceção que mancharam a história da humanidade, evocando os horrores da Inquisição, os julgamentos de Moscou sob Stalin e os tribunais de guerra nazistas que condenavam inocentes em nome do poder absoluto. 

Esses tribunais, historicamente, pisoteavam o devido processo legal, erguiam-se sobre acusações fabricadas e funcionavam como instrumentos brutais de opressão política, uma realidade que os Estados Unidos, como líderes na guerra contra o nazismo e defensores da liberdade, conhecem profundamente — suas comparações não são meras retóricas vazias, mas um grito de alerta baseado em lições duramente aprendidas. 

A percepção de que Alexandre de Moraes e o Supremo Tribunal Federal (STF) agiram como um “tribunal de exceção” tornou-se o cerne da narrativa americana, amplificada pela ausência total de evidências diretas contra Bolsonaro, pela coerção escandalosa de testemunhas — admitida em gravações que expõem ameaças a suas famílias — e pelo papel de juízes com conflitos de interesse gritantes, como Cristiano Zanin e Flávio Dino, cujas ligações com Lula transformam o julgamento em uma farsa judicial. Essa analogia não é apenas um reflexo de indignação, mas um chamado à ação contra um precedente que ameaça a democracia global.







O ministro da Justiça, Flávio Dino, e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante a apresentação de um balanço da segurança pública em 2023, em cerimônia no Palácio do Planalto, Brasília, DF (31/1/2024) | Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil


O julgamento de Jair Bolsonaro, sob a ótica americana, transcende o status de um evento isolado; é um símbolo poderoso de uma luta mais ampla contra tribunais de exceção e perseguições políticas que ameaçam os alicerces da liberdade. As vozes de Jason Miller, María Elvira Salazar, Marco Rubio e Darren Beattie formam uma coalizão de indignação que transcende fronteiras e une conservadores em uma causa comum, que ressoa desde os corredores de Washington até os rincões do movimento global de direita. 

O 11 de setembro de 2001 transformou os Estados Unidos, deixando cicatrizes que forjaram uma nação resiliente diante de ataques que abalaram os alicerces da segurança no país. O julgamento de Bolsonaro em 11 de setembro de 2025 traz ecos sombrios com a erosão da democracia por tribunais de exceção — a lei sendo pervertida para servir aos caprichos do poder. Enquanto os Estados Unidos, guiados por lições de seu passado, veem no caso um alerta vermelho, o Brasil enfrenta um teste crucial. Sob o olhar atento dos “irmãos do Norte”, esse divisor de águas desafia o mundo a defender a liberdade contra a tirania judicial, reafirmando que, assim como em 2001, a resposta à escuridão deve ser uma união sem precedentes pela Justiça.  

Amna Paula Henkel - Revista Oeste