sábado, 23 de outubro de 2021

‘A sucessão do agronegócio me preocupa’, influenciadora digital e empresária Camila Telles eleita uma das 100 Mulheres Poderosas do Agro no Brasil

Filha e neta de produtor rural, Camila Telles tornou-se uma das maiores influenciadoras digitais do agro | Foto: Divulgação/Redes sociais
Filha e neta de produtor rural, Camila Telles tornou-se uma das maiores influenciadoras digitais do agro | Foto: Divulgação/Redes sociais

Ao falar mal do agronegócio nas redes sociais, a cantora Anitta não imaginava encontrar pela frente a gaúcha Camila Telles. Formada em Relações Públicas em Porto Alegre, a jovem de 28 anos não gostou do que ouviu e resolveu revidar. Em vez de “tretar” com a funkeira, Camila fez uma paródia da música Show das Poderosas para mostrar a força do setor que mais se destaca na economia nacional. “Foi uma ideia despretensiosa, mais para divertir e quebrar aquele clima de briga”, conta Camila. O vídeo viralizou. Em 48 horas, ela ganhou 20 mil seguidores e passou a enxergar o potencial das redes sociais para se comunicar e desmistificar alguns tabus do universo do agronegócio.

Filha e neta de produtor rural, Camila tornou-se uma das maiores influenciadoras digitais do agro, com cerca de 200 mil seguidores nas redes sociais, com destaque para o Instagram. Neste mês, foi parar na lista das 100 Mulheres Poderosas do Agro, elaborada pela Forbes Brasil, ao lado de nomes que estão transformando diferentes segmentos do setor. Além de influenciadora, Camila comanda uma agência de comunicação voltada para o agronegócio e, ao lado da família, toca o projeto Hortaria, para a venda de hortaliças em Cruz Alta (RS), sua cidade natal. Ela conversou com Oeste por telefone para contar sobre seu papel como influenciadora digital do agro e por que as novas gerações preocupam o futuro do setor. A seguir, os principais trechos da entrevista.

1 — Como você se tornou uma influenciadora agro?

Sempre tive duas paixões. O agro, porque sou filha e neta e produtores rurais, e a comunicação. Senti desde o início que a comunicação era um gargalo grande no setor, e na própria faculdade percebi que os profissionais de comunicação não se interessavam muito por essa área. Comecei a me dedicar a isso, fazer palestras sobre o assunto e, em 2019, viralizei. Foi super sem querer, nada planejado. A cantora Anitta falou nas redes sociais que o agro era o câncer do país, algo assim, e, ao invés de ir para as redes sociais brigar, resolvi fazer uma paródia. Porque se a Anitta, que canta, pode falar do agro que ela não domina, por que eu, que falo do agro, não posso cantar no meu Instagram? Foi uma ideia despretensiosa, mais para divertir e quebrar aquele clima de briga. O vídeo viralizou, em 48 horas ganhei 20 mil seguidores. E partir dali tive ainda mais certeza de que o agro precisava de uma defesa maior nas redes sociais, e comecei a gravar vídeos opinativos, falar sobre assuntos polêmicos como o uso de defensivos químicos, consumo da carne, marco temporal, MST.

2 — Qual é o mito do agronegócio que mais incomoda você?

É que o agro está destruindo o meio ambiente, as florestas e a biodiversidade do Brasil. Isso é uma das coisas que mais me entristecem, porque, na verdade, as maiores áreas de biodiversidade no Brasil estão em propriedades privadas. As pessoas veem as plantações de soja na beira da estrada, mas nunca entram para ver a área de preservação permanente, as áreas legalmente preservadas. O Brasil é o único país em que o produtor paga para preservar. E outra coisa que me deixa triste é que as crianças estão aprendendo nas escolas que o agro é vilão. Há uma nova geração que não consome carne porque acha que a carne está acabando com a Floresta Amazônica. A sucessão do agronegócio me preocupa. A geração mais nova já chega com um pensamento errado sobre o setor. Precisamos preparar a sucessão com pessoas interessadas em trabalhar no agronegócio e com orgulho de vestir a camiseta.

“O agro comunica muito bem para o agro, o nosso desafio é comunicar para públicos diferentes”

3 — O que é possível fazer para reverter essa visão do agronegócio entre os mais jovens?

Combater a desinformação. Esse é o ponto que tento trazer nas minhas redes sociais. Meu público é muito jovem, busco uma linguagem a mais didática possível, a menos técnica, porque o agro comunica muito bem para o agro, o nosso desafio é comunicar para públicos diferentes. É comunicar com o público da cidade, com as escolas, com as universidades. Precisamos de uma união maior no nosso setor para garantir que a informação correta chegue não só aos alunos, mas aos professores também, para garantirmos uma geração mais interessada no agro do futuro.

4 — Qual o objetivo do projeto Hortaria ?

Quando me formei em Porto Alegre, voltei a morar com a minha família na fazenda, em Cruz Alta, para viver o agronegócio na prática de trabalho. Nossa fazenda já criou pecuária de corte, mas o foco sempre foi a lavoura. Minha mãe e eu tivemos a ideia de criar a Hortaria para produzir verduras e legumes com o intuito de entregar na casa do consumidor final. É um projeto para aproximar o campo da cidade e valorizar o trabalho do produtor rural, além de garantir produtos de qualidade. Hoje, 11 pessoas trabalham conosco e estamos contratando mais gente porque vamos abrir uma agroindústria com o objetivo de entregar o produto embalado, cortado, higienizado, para facilitar a correria do dia a dia.

5 — Recentemente, integrantes do MST invadiram a sede da Aprosoja em Brasília. Como esses movimentos interferem no progresso do agronegócio brasileiro?

As pessoas têm uma visão muito errada de que o produtor é vilão no Brasil. Elas têm de entender que o agro é uma cadeia, e todos os tamanhos de produtores participam dessa cadeia. Ninguém produz por hobby, as pessoas produzem para ter um negócio, para ter renda. Sobre o MST, para começar, vandalismo não é aceitável em nenhum segmento. O que foi feito foi vandalismo, não foi manifesto. E, depois, falar que o agro é fome, é um câncer, é um discurso errado. O agro está longe de ser fome. Se temos problemas de fome no Brasil hoje não é por causa do agro. Não é porque não existe alimento suficiente ou porque estamos exportando tudo e falta produto no país. Produzimos alimentos suficientes para abastecer o Brasil interior e outros países.

Leia também: “5 grandes mentiras sobre o agronegócio”, reportagem publicada na Edição 52 da Revista Oeste


Paula Leal, Revista Oeste