quinta-feira, 30 de novembro de 2017

"O trampolim do BNDES", por Miriam Leitão

O Globo
Com Marcelo Loureiro


O governo Temer está desfazendo o que ele mesmo havia feito no BNDES. Avanços, como os que aconteceram na área ambiental, estão sendo revogados. O presidente do banco, Paulo Rabello de Castro, é pré-candidato à presidência, lançado pelo Partido Social Cristão, e está se utilizando da estrutura para viagens em que exibe um tom político. Este tipo de uso do banco é inédito.
Na semana passada, Paulo Rabello pediu para ser gravado em comunicado “aos benedenses”, diretamente do Amapá, reabrindo superintendências regionais que haviam sido fechadas pelo próprio governo Temer. Estava abraçado a um senador. As críticas ao BNDES sempre foram sobre a dimensão dos subsídios, os critérios de escolha dos beneficiários, a transparência dos empréstimos. Ser usado como trampolim por um declarado candidato é uma novidade. Neste ponto pode-se dizer que o governo Temer conseguiu mesmo inovar.
O BNDES, por ser um banco de desenvolvimento e gestor do Fundo Amazônia, sempre foi criticado por não ter políticas mais claras de preferência por atividades de menor emissão de gases de efeito estufa. Isso começou a ser corrigido na época da então presidente Maria Silvia, mas acerto no Brasil dura pouco.
O banco havia decidido que as atividades mais sustentáveis teriam um percentual maior de financiamento. Na área de energia, a preferência seria pelas novas renováveis. Assim, decidiu que nas hidrelétricas e térmicas só financiaria a metade do valor do investimento; em eólicas, 70%; e as usinas solares teriam 80%. Essa semana o BNDES anunciou que revogou essa regra de financiamento e agora todas as fontes passam a ter 80%. Isso iguala a térmica à solar. O papel de um banco de desenvolvimento é favorecer o novo e induzir políticas mais atualizadas. Uma fonte de alta emissão de gases de efeito estufa não pode ter o mesmo benefício daquela com baixa emissão. Para mostrar que o governo deixou de ter qualquer interesse em combate às emissões de gases de efeito estufa, será feito um leilão de térmica a carvão e o BNDES vai financiar em igualdade de condições com as demais fontes.
No começo do ano, o banco havia mudado a forma de atuar nos leilões de transmissão de energia. Fez uma oferta de financiamento a preços de mercado. O leilão foi um sucesso.
Agora voltou atrás, e vai oferecer, de novo, os juros subsidiados.
Logo que assumiu, o governo Temer adotou algumas decisões certas na área econômica. 
Era um governo de duas caras. Escolheu uma boa equipe para o Ministério da Fazenda e Banco Central. Nomeou pessoas com reconhecida qualificação técnica para a Petrobras, Eletrobras e BNDES e deu aos gestores o direito de montar as diretorias sem indicações dos partidos da base. No Banco do Brasil nomeou um ex-funcionário, já testado também no setor privado. Na Caixa, fez uma escolha política. No núcleo político, o governo se cercou de pessoas que estavam envolvidas em suspeitas de corrupção. O resultado foi que a economia começou a melhorar. Petrobras e Eletrobras tiveram valorização de mercado e melhora dos seus indicadores de desempenho. O BNDES iniciou mudanças de organização interna e inovações nos critérios de atuação. Na área política, o governo passou a ser atingido por denúncias, como as que recaíram sobre Geddel Vieira Lima, Romero Jucá, entre outros. Até que houve o estouro da crise do próprio Temer.
Com a saída da então presidente Maria Silvia, o novo presidente começou a desfazer as decisões tomadas. Ela havia fechado superintendências regionais, deixando só a de Brasília, porque eram foco de indicações políticas. O presidente-candidato criou sete superintendências regionais e disse que são “as primeiras". Na semana passada, ele gravou um vídeo em que aparece abraçado com um senador do Amapá.
— Levanta ela um pouquinho assim — diz Paulo Rabello, dirigindo quem estava gravando.
— Para pegar Fortaleza e a gente — explicou o senador Davi Alcolumbre, com quem estava abraçado e que o chama de “presidente Paulo".
— Senador Davi manda um recado para os nossos benedenses.
O tom político do vídeo é inequívoco. Se o governo Temer não se importa que o banco seja um trampolim, a Justiça Eleitoral deveria prestar atenção, a menos que queira que a eleição seja mesmo um vale-tudo.