sexta-feira, 29 de janeiro de 2016

Maria da Conceição Tavares acha que ‘Delfim está com saudade da ditadura’. Corrupção deslavada provoca guerra entre petistas


Tensão social. Conceição: reformas propostas por Delfim causarão greves seguidas - Aline Massuca/Valor/10-6-2012


Cássia Almeida - O Globo



Economista da UFRJ e ex-deputada pelo PT, Maria da Conceição Tavares, considerou absurda a proposta do ex-ministro da Fazenda Delfim Netto de a presidente Dilma Rousseff emparedar o Congresso pelas reformas. Ela diz que é preciso uma frente democrática ampla contra crise.

O que a senhora achou das declarações do ex-ministro Delfim Netto?
A proposta dele é absurda. Ele esquece o seguinte, o nosso presidencialismo é de coalizão. Não é um presidencialismo autoritário. A Dilma tem que negociar. Não pode chegar no Congresso e dizer que quero fazer. Isso não existe. Tem que compor aliança. Do contrário, não poderá governar. Como o PMDB está esfacelado, fica difícil. Presidencialismo de coalizão tem isso: quando o partido majoritário está esfacelado, é difícil governar.

O ex-ministro traça um cenário sombrio com recessão este ano e longo período de crescimento baixo.
Essa previsão é bruxaria dele. A gente não sabe o que vai acontecer. É certo que este ano vai ser ruim, já está claro. Agora, por quantos anos vai ficar ruim? Não tenho ideia, nem ele.

Delfim afirma que as expectativas sobre a economia podem melhorar se a presidente mandar as reformas previdenciária, trabalhista, de desvinculação do Orçamento para o Congresso.
Se as reformas não passarem no Congresso, não funciona. Ninguém é idiota, os empresários tampouco. Com uma crise política e econômica dessas, você acha que os empresários vão investir e voltar a ficar bonzinhos? Os empresários só vão voltar a investir quando as finanças públicas estiverem em dia e o Estado puder investir em infraestrutura, puxando o investimento privado. Enquanto isso não ocorrer, não tem recuperação.

A senhora concorda com as reformas que o ex-ministro propôs?
Todas coisas facílimas de fazer. Ademais, ele não diz que direção é. Só pode ser na direção liberal. De repente, ele ficou conservador. Delfim não estava assim tempos atrás. Acho que volta à cabeça dele os tempos da ditadura. Não estamos numa ditadura, quando o presidente e seu ministro da Fazenda faziam o que queriam. Só numa ditadura que as reformas passam sem o Congresso opinar. Voltou o velho espírito dele. Acho que tem saudades da ditadura. Essa crise abalou os nervos dele.

Quais as consequências de se propor essas reformas?
Vai ter um conflito social gigantesco, uma greve atrás da outra, uma tempestade no mundo do trabalho. Aí é que não dá para governar mesmo. Como está não dá para sair da crise, mas dá para manter a democracia. Com o que ele (Delfim) está propondo, tenho dúvidas de que dá para manter a democracia, talvez seja isso que ele queira.

Qual a saída?
Teria que fazer uma frente democrática ampla. Só frente de esquerda não dá. Uniria líderes empresariais, sindicais, da sociedade civil, intelectuais, políticos que tenham credibilidade. O ex-governador do Paraná Roberto Requião e Ciro Gomes são alguns nomes. O Conselhão pode ser um caminho. Acho que 80 pessoas é um pouco demais, mas poderia ser uma saída. É preciso um acordo firme para tirar o Brasil da crise.

A senhora já viu crise assim?
Na democracia não me lembro de alguma vez que estivesse tão ruim. Também não me lembro de ocasião em que o PMDB estivesse tão esfrangalhado. Isso é uma variável muito ruim. É um partido de centro, quando o centro desmorona, fica difícil ter consenso.