O vaivém de Fernando Moura em sua delação pode fragilizar o caso contra Dirceu. Mas ainda há provas contundentes contra o ex-ministro
Foi na casa de Fernando Moura em São Paulo, na Alameda Casa Branca, no bairro dos Jardins, que a candidatura do ex-ministro da Casa Civil José Dirceu a deputado estadual ganhou força e vigor, em 1985. A amizade entre Moura e Dirceu, desde então, cresceu, multiplicou-se e rendeu. Moura participou de todas as campanhas de Dirceu e ascendeu com ele a Brasília, quando o PT elegeu Luiz Inácio Lula da Silva para a Presidência da República. Ainda em 2002, antes de Lula vestir a faixa presidencial, Moura já ajudava Silvio Pereira, então secretário de Organização do PT, a “organizar” e distribuir os 32 mil cargos comissionados no governo federal. O lobista também pediu a Dirceu um cargo para si, na Casa Civil que o amigo passaria a comandar. O pedido foi negado. O então futuro ministro tinha outro destino para Moura: a Petrobras.
A descrição da intimidade que tinha com Dirceu e com o poder no primeiro mandato de Lula foi feita pelo próprio Moura. Preso em agosto do ano passado na 17ª fase da Lava Jato, a Pixuleco, Moura levou coisa de um mês para fechar um acordo de delação premiada. Estava apavorado. Antes de ser procurado pelo Ministério Públicopara fechar o acordo, Moura pedira a seus advogados que preparassem a documentação para levar a colaboração adiante. Em setembro, quando colocou no papel o que revelaria, detalhou sua relação com Dirceu, com Pereira e com Renato Duque, ex-diretor de Serviços da Petrobras, também preso na Lava Jato. No dia 22 de janeiro, porém, em depoimento ao juiz Sergio Moro, Moura titubeou. Recuou em parte do que dissera no acordo, debochou do juiz e insinuou que os procuradores tivessem acrescentado fatos a seu relato. Moro, habitualmente comedido, passou-lhe uma descompostura: “Não é assim que o negócio funciona, senhor Fernando”.
O trecho que ficou mais obscuro no depoimento de Moura tem relação com um episódio do mensalão. No acordo, Moura dissera que Dirceu o orientou a sair do país em 2005, até “baixar a poeira” da investigação do mensalão que ia tomando forma. No depoimento a Moro, Moura disse que não foi isso que aconteceu e que assinara os papéis da delação sem ler. O juiz considerou, diante da mentira do delator, revogar o acordo e os benefícios de Moura. Os advogados de Moura renunciaram a sua defesa.
Menos de uma semana depois, nova mudança de rumo. Na quinta-feira passada, Moura disse que mentira ao juiz Moro e que o conteúdo de seu acordo de delação é que estava correto. Em conversa com os procuradores, Moura tinha a voz embargada. Disse que mentira por causa de uma ameaça que recebera em São Paulo. “Um homem branco, de 1,85 metro de altura, aparentando ter uns 40 anos” fez, segundo Moura, ameaças veladas a seus netos, que vivem no Rio Grande do Sul. Moura pediu desculpas e uma nova chance a Moro. Os procuradores da Lava Jato sabem que, se conseguir se equilibrar e decidir falar sem amarras tudo o que sabe, Moura tem potencial para revelar esquemas que ainda não emergiram na investigação. Especialmente dos primeiros anos do governo Lula.José Dirceu também sabe disso.
Nas duas últimas semanas, o foco da Lava Jato esteve sobre Dirceu (e sobre Lula). Moro colheu diversos depoimentos que colocam Dirceu nas cordas, na ação em que o ex-ministro é acusado de corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa. Dirceu está sozinho. OPT publicou uma carta em seu apoio em agosto do ano passado, pouco depois de sua prisão. Os companheiros diziam que a prisão de “Zé” era prova de que a “elite raivosa” não o perdoava por ter ajudado a eleger o “presidente operário”. Mas eram palavras vãs. Desde então, Dirceu foi abandonado. Lula talvez até tenha tentado ajudá-lo quando disse, em janeiro, que “o companheiro Zé Dirceu pode ter cometido um erro, mas a gente tem de saber que o companheiro Zé Dirceu é um dos responsáveis pela grandeza desse partido”. Ficou nisso.
O vaivém do amigo Moura poderia fragilizar as acusações contra Dirceu, não fosse o testemunho contundente de Milton Pascowitch, mais um lobista-delator. Pascowitch, ao contrário de Moura, não hesitou por um segundo implicar Dirceu como maestro de parte importante do esquema de corrupção na Petrobras. Em depoimento no dia 20 de janeiro, Milton Pascowitch disse que o contrato de consultoria entre sua empresa, a Jamp Engenheiros Associados, e a empresa de Dirceu, a JD Consultoria, firmado em abril de 2011, tinha como único propósito o repasse de propinas pagas pela Engevix em troca de contratos com a Petrobras. O dinheiro era para “dar cobertura das necessidades de José Dirceu”, disse Pascowitch. “Valores absolutamente desproporcionais com a necessidade dele. José Dirceu assinava contratos de R$ 20 mil por mês e as despesas dele eram de R$ 1 milhão. A pressão dele e do Luiz Eduardo (irmão do ex-ministro), em alguns meses, era muito forte.”
O lobista acrescentou que parte desses repasses não foi feita em espécie: a Jamp pagou parte da compra da sede da empresa de Dirceu, a reforma de um apartamento em nome do irmão do ex-¬ministro, a reforma de outro imóvel cujo verdadeiro dono seria Dirceu e a compra de uma casa para a filha dele. Total: mais de R$ 2,7 milhões. Pascowitch afirmou que Dirceu era contemplado com os pagamentos por ter atuado na indicação de Renato Duque para a diretoria de Serviços da Petrobras.
O depoimento de Dirceu estava agendado para as 14 horas de hoje. A ÉPOCA, o advogado de Dirceu, Roberto Podval, disse que “está absolutamente clara a abundância com que terceiros usaram o nome de José Dirceu para se locupletar”. O advogado diz que é muito estranho que tentem colar em Dirceu a imagem de líder do esquema. “Só o Pascowitch recebeu R$ 80 milhões em propina. Como é que um ‘líder’ ganharia 10% desse valor? A conta não fecha.” Podval acrescentou que Dirceu tem como provar que não tinha relações com Renato Duque antes que seu nome lhe fosse indicado para a Petrobras como todos os outros que chegaram a sua mesa. E que o ex-ministro também pode demonstrar que os serviços prestados por sua consultoria realmente existiram.
A descrição da intimidade que tinha com Dirceu e com o poder no primeiro mandato de Lula foi feita pelo próprio Moura. Preso em agosto do ano passado na 17ª fase da Lava Jato, a Pixuleco, Moura levou coisa de um mês para fechar um acordo de delação premiada. Estava apavorado. Antes de ser procurado pelo Ministério Públicopara fechar o acordo, Moura pedira a seus advogados que preparassem a documentação para levar a colaboração adiante. Em setembro, quando colocou no papel o que revelaria, detalhou sua relação com Dirceu, com Pereira e com Renato Duque, ex-diretor de Serviços da Petrobras, também preso na Lava Jato. No dia 22 de janeiro, porém, em depoimento ao juiz Sergio Moro, Moura titubeou. Recuou em parte do que dissera no acordo, debochou do juiz e insinuou que os procuradores tivessem acrescentado fatos a seu relato. Moro, habitualmente comedido, passou-lhe uma descompostura: “Não é assim que o negócio funciona, senhor Fernando”.
O trecho que ficou mais obscuro no depoimento de Moura tem relação com um episódio do mensalão. No acordo, Moura dissera que Dirceu o orientou a sair do país em 2005, até “baixar a poeira” da investigação do mensalão que ia tomando forma. No depoimento a Moro, Moura disse que não foi isso que aconteceu e que assinara os papéis da delação sem ler. O juiz considerou, diante da mentira do delator, revogar o acordo e os benefícios de Moura. Os advogados de Moura renunciaram a sua defesa.
Nas duas últimas semanas, o foco da Lava Jato esteve sobre Dirceu (e sobre Lula). Moro colheu diversos depoimentos que colocam Dirceu nas cordas, na ação em que o ex-ministro é acusado de corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa. Dirceu está sozinho. OPT publicou uma carta em seu apoio em agosto do ano passado, pouco depois de sua prisão. Os companheiros diziam que a prisão de “Zé” era prova de que a “elite raivosa” não o perdoava por ter ajudado a eleger o “presidente operário”. Mas eram palavras vãs. Desde então, Dirceu foi abandonado. Lula talvez até tenha tentado ajudá-lo quando disse, em janeiro, que “o companheiro Zé Dirceu pode ter cometido um erro, mas a gente tem de saber que o companheiro Zé Dirceu é um dos responsáveis pela grandeza desse partido”. Ficou nisso.
O vaivém do amigo Moura poderia fragilizar as acusações contra Dirceu, não fosse o testemunho contundente de Milton Pascowitch, mais um lobista-delator. Pascowitch, ao contrário de Moura, não hesitou por um segundo implicar Dirceu como maestro de parte importante do esquema de corrupção na Petrobras. Em depoimento no dia 20 de janeiro, Milton Pascowitch disse que o contrato de consultoria entre sua empresa, a Jamp Engenheiros Associados, e a empresa de Dirceu, a JD Consultoria, firmado em abril de 2011, tinha como único propósito o repasse de propinas pagas pela Engevix em troca de contratos com a Petrobras. O dinheiro era para “dar cobertura das necessidades de José Dirceu”, disse Pascowitch. “Valores absolutamente desproporcionais com a necessidade dele. José Dirceu assinava contratos de R$ 20 mil por mês e as despesas dele eram de R$ 1 milhão. A pressão dele e do Luiz Eduardo (irmão do ex-ministro), em alguns meses, era muito forte.”
O lobista acrescentou que parte desses repasses não foi feita em espécie: a Jamp pagou parte da compra da sede da empresa de Dirceu, a reforma de um apartamento em nome do irmão do ex-¬ministro, a reforma de outro imóvel cujo verdadeiro dono seria Dirceu e a compra de uma casa para a filha dele. Total: mais de R$ 2,7 milhões. Pascowitch afirmou que Dirceu era contemplado com os pagamentos por ter atuado na indicação de Renato Duque para a diretoria de Serviços da Petrobras.