segunda-feira, 4 de janeiro de 2016

"A conta não fecha", editorial da Folha de São Paulo

Não causam surpresa, mas são significativos os resultados divulgados na semana passada a respeito da pesquisa de opinião realizada de 11 a 14 de dezembro pelo instituto Vox Brasil, a pedido da Central Única dos Trabalhadores (CUT).

Avaliou-se a receptividade dos entrevistados a propostas de reforma na Previdência, que voltam a entrar nas cogitações do Executivo, e a outras medidas para a superação da crise econômica.

De acordo com o levantamento, expressivos 88% dos brasileiros, ouvidos em 153 municípios, opõem-se a qualquer alteração nas regras para aposentadorias; não se registram variações significativas nessa atitude, qualquer que seja a faixa de renda, a idade ou a escolaridade dos entrevistados.

Natural que seja assim –pois a ninguém, individualmente, haverá de agradar a ideia de esperar mais tempo para desfrutar do benefício. A pesquisa da CUT surge, obviamente, não só como um conjunto de informações para o debate mas também como instrumento de pressão sobre o governo da presidente Dilma Rousseff (PT).

Como nunca, entretanto, a realidade econômica e demográfica se contrapõe ao plano das aspirações e dos desejos.

O deficit previdenciário atinge proporções insustentáveis. Foram R$ 88,9 bilhões neste ano, calculando-se para 2016 um aumento de 40% sobre esse valor.

À falta de equilíbrio próprio, o sistema depende de aportes do Tesouro. Este, igualmente quebrado, não pode cobrir um rombo sem abrir outro, em uma equação que só atingirá a igualdade com elevação de impostos, aumento da inflação ou corte de gastos sociais –e vale lembrar que tais sacrifícios não se excluem mutuamente.

A opinião dos entrevistados na pesquisa da CUT, todavia, escancara o dilema. Não se mostram contrários apenas às mudanças na Previdência, mas também aos cortes sociais e a aumentos de impostos.

Algumas particularidades são dignas de nota. A proporção dos que se opõem a alterações em programa sociais (75%) é menor do que os 88% que defendem a permanência das regras previdenciárias.

Quanto ao sistema tributário, nem a elevação nos impostos sobre lucros das empresas tem grande apelo: 49% consideram que tal medida seria benéfica ao país.

Como resultado, as contas simplesmente não fecham. Talvez a opinião majoritária considere que o combate à corrupção seja suficiente para equilibrar o Orçamento.

Ainda que indispensável, a moralização do Estado nessa área não responderia por parcela decisiva no atual desequilíbrio. Além de recursos, falta sem dúvida mais debate –e esclarecimento para superá-lo.