O ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, entregou ao presidente do Senado Renan Calheiros, na tarde desta segunda-feira, o texto da proposta orçamentária de 2016, com previsão de déficit de 30,5 bilhões de reais, ou 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB). O texto prevê ainda crescimento de 0,2% no PIB do ano que vem, inflação de 5,4%, e um salário mínimo de 865,50 reais.
Diante da previsão de queda forte na arrecadação também para o próximo ano, e do corte insuficiente de gastos decorrente das medidas do ajuste fiscal, o governo tentou uma medida desastrada para tentar fazer caixa para o ano que vem. Arquitetou, nos últimos quatro dias, a volta da CPMF, o imposto do cheque, derrubado em 2007 pelo Congresso. A expectativa era de que o novo imposto, se aprovado, elevasse a arrecadação de 2016 em 80 bilhões de reais. Contudo, diante da forte resistência da oposição, da própria base aliada e das críticas da opinião pública, o imposto foi sepultado antes mesmo de ser oficialmente apresentado.
Essa era a última cartada do governo para conseguir elevar as perspectivas de receita antes da entrega do texto orçamentário, cujo prazo expira nesta segunda. Na noite de domingo, após reunião com Barbosa e o ministro Aloizio Mercadante, da Casa Civil, e diante da derrota sobre a natimorta CPMF, a presidente Dilma deu aval para que o Orçamento fosse apresentado com o déficit, sinalizando que esta seria a forma mais "transparente" de tratar o tema. O número, contudo, só foi definido na tarde desta segunda, sem a presença do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, que estava em Brasília no momento do anúncio.
Levy era contra a reedição da CPMF. O ministro afirmou a assessores que o melhor seria aprofundar os cortes, visando um resultado primário positivo em 2016. O temor do ministro, segundo pessoas próximas, era de que o rombo seria prejudicial para a avaliação da nota brasileira pelas agências de classificação de risco. O país está a um degrau de perder o grau de investimento, espécie de selo de bom pagador, pelas agências S&P e Moody's. Entre as razões para o rebaixamento está o descontrole fiscal e o caos político instalado no segundo mandato de Dilma.
Houve um tempo, em meados de 2012, em que o mercado poderia aceitar a apresentação de um déficit orçamentário sem maiores sobressaltos. Apesar de não haver uma crise declarada, naquele período, a arrecadação emitia sinais de alerta e os gastos públicos estavam a todo o vapor. O economista Raul Velloso, especialista em contas públicas, era uma das vozes a favor da divulgação de uma previsão de déficit, em vez de uma expectativa de superávit ilusória, embasada em números maquiados. Contudo, hoje, tudo indica que não há tolerância para transparência de ocasião, como a que o governo tenta implementar. O dólar alcançou 3,68 reais diante do cenário fiscal de 2016 e a bolsa opera no vermelho. A grande apreensão está em torno da incapacidade do governo de conseguir apresentar um horizonte de retomada.
Após receber a proposta orçamentária, Renan Calheiros falou em "mudança de atitude do governo" ao apresentar uma proposta "mais realista" e com "menos ficção". O peemedebista, que nos últimos dias voltou a estender a mão ao Planalto ao se tornar fiador de uma agenda anticrise, disse que é preciso "fazer o dever de casa". "O Congresso vai fazer o que for possível para fazermos a reforma do Estado para cortarmos despesas e melhorarmos o ambiente de negócios e de investimento", afirmou o presidente do Senado. Calheiros destacou ainda que aumento de impostos "não pode ser caminho único" e defendeu melhor eficiência dos gastos públicos.