O juiz Sérgio Moro, que atua na Operação Lava-Jato, compara-a à Operação Mãos Limpas, o famoso combate na Itália contra a corrupção, ocorrido na década de 90. Considerado um dos maiores especialistas em combate à lavagem de dinheiro – e por isso atuou junto à ministra Rosa Weber no Supremo Tribunal Federal no processo do mensalão - é um estudioso do caso italiano e publicou em 2004 na revista do Conselho de Justiça Federal um artigo em que traça paralelos entre o Brasil daquela época e a Itália.
Um dos pontos mais importantes nos dois processos é a deslegitimação da classe política, que propiciou um ímpeto às investigações de corrupção, e os resultados desta fortaleceram o processo de deslegitimação. Conseqüentemente, as investigações judiciais dos crimes contra a Administração Pública espalharam-se como fogo selvagem, desnudando inclusive a compra e venda de votos e as relações orgânicas entre certos políticos e o crime organizado, analisa Moro.
As investigações na Itália minaram a autoridade dos chefes políticos – como Arnaldo Forlani e Bettino Craxi, líderes da Democracia Cristã (DC) e do Partido Socialista Italiano (PSI) – e os mais influentes centros de poder, cortando sua capacidade de punir aqueles que quebravam o pacto do silêncio. Não faltaram tentativas do poder político para interromper as investigações, relembra Moro, e foi aí que o apoio da opinião publica foi fundamental.
Por exemplo, o governo do primeiro-ministro Giuliano Amato tentou, em março de 1993 e por decreto legislativo, descriminalizar a realização de doações ilegais para partidos políticos. A reação negativa da opinião pública, com greves escolares e passeatas estudantis, foi essencial para a rejeição da medida legislativa.
Da mesma forma, quando o Parlamento italiano, em abril de 1993, recusou parcialmente autorização para que o ex-primeiro-ministro Bettino Craxi fosse processado criminalmente, houve intensa reação da opinião pública. Uma multidão reunida em frente à residência de Craxi arremessou moedas e pedras quando ele deixou sua casa para atender uma entrevista na televisão.
Em julho de 1994, novo decreto legislativo do governo do primeiro-ministro Silvio Berlusconi aboliu a prisão pré-julgamento para categorias específicas de crimes, inclusive para corrupção ativa e passiva. A equipe de procuradores da operação mani pulite ameaçou renunciar coletivamente a seus cargos. Novamente, a reação popular, com vigílias perante as Cortes judiciais milanesas, foi essencial para a rejeição da medida.
Na verdade, diz Moro, é ingenuidade pensar que processos criminais eficazes contra figuras poderosas, como autoridades governamentais ou empresários, possam ser conduzidos normalmente, sem reações.
Agora mesmo uma tentativa de anular a delação premiada do doleiro Alberto Yousseff, o que colocaria em risco toda a investigação, foi rejeitada por unanimidade pelo plenário do STF. Um Judiciário independente, tanto de pressões externas como internas, é condição necessária para apoiar ações judiciais da espécie, ressalta Moro.
Entretanto, a opinião pública, como ilustra o exemplo italiano, é também essencial para o êxito da ação judicial. Por isso os Procuradores dão longas entrevistas coletivas para explicar cada passo da Operação Lava-Jato e, assim como os responsáveis pela operação mani pulite fizeram largo uso da imprensa, aqui também a divulgação das delações premiadas e informações extra-oficiais servem para divulgar pontos importantes já atingidos pelas investigações.
Tão logo alguém era preso, detalhes de sua confissão eram veiculados no “L’Expresso”, no “La Republica” e outros jornais e revistas simpatizantes. O constante fluxo de revelações manteve o interesse do público elevado e os líderes partidários na defensiva. Craxi, especialmente, não estava acostumado a ficar na posição humilhante de ter constantemente de responder a acusações e de ter a sua agenda política definida por outros. O mesmo acontece hoje com o ex-presidente Lula, obrigado a explicar a atuação pessoal em favor da empreiteira Odebretch, e as atividades do Instituto Lula.
Talvez a lição mais importante de todo o episódio, diz Sérgio Moro, seja a de que a ação judicial contra a corrupção só se mostra eficaz com o apoio da democracia. É esta quem define os limites e as possibilidades da ação judicial. Enquanto ela contar com o apoio da opinião pública, tem condições de avançar e apresentar bons resultados. É a opinião pública esclarecida que pode, pelos meios institucionais próprios, atacar as causas estruturais da corrupção.
Um dos pontos mais importantes nos dois processos é a deslegitimação da classe política, que propiciou um ímpeto às investigações de corrupção, e os resultados desta fortaleceram o processo de deslegitimação. Conseqüentemente, as investigações judiciais dos crimes contra a Administração Pública espalharam-se como fogo selvagem, desnudando inclusive a compra e venda de votos e as relações orgânicas entre certos políticos e o crime organizado, analisa Moro.
As investigações na Itália minaram a autoridade dos chefes políticos – como Arnaldo Forlani e Bettino Craxi, líderes da Democracia Cristã (DC) e do Partido Socialista Italiano (PSI) – e os mais influentes centros de poder, cortando sua capacidade de punir aqueles que quebravam o pacto do silêncio. Não faltaram tentativas do poder político para interromper as investigações, relembra Moro, e foi aí que o apoio da opinião publica foi fundamental.
Por exemplo, o governo do primeiro-ministro Giuliano Amato tentou, em março de 1993 e por decreto legislativo, descriminalizar a realização de doações ilegais para partidos políticos. A reação negativa da opinião pública, com greves escolares e passeatas estudantis, foi essencial para a rejeição da medida legislativa.
Da mesma forma, quando o Parlamento italiano, em abril de 1993, recusou parcialmente autorização para que o ex-primeiro-ministro Bettino Craxi fosse processado criminalmente, houve intensa reação da opinião pública. Uma multidão reunida em frente à residência de Craxi arremessou moedas e pedras quando ele deixou sua casa para atender uma entrevista na televisão.
Em julho de 1994, novo decreto legislativo do governo do primeiro-ministro Silvio Berlusconi aboliu a prisão pré-julgamento para categorias específicas de crimes, inclusive para corrupção ativa e passiva. A equipe de procuradores da operação mani pulite ameaçou renunciar coletivamente a seus cargos. Novamente, a reação popular, com vigílias perante as Cortes judiciais milanesas, foi essencial para a rejeição da medida.
Na verdade, diz Moro, é ingenuidade pensar que processos criminais eficazes contra figuras poderosas, como autoridades governamentais ou empresários, possam ser conduzidos normalmente, sem reações.
Agora mesmo uma tentativa de anular a delação premiada do doleiro Alberto Yousseff, o que colocaria em risco toda a investigação, foi rejeitada por unanimidade pelo plenário do STF. Um Judiciário independente, tanto de pressões externas como internas, é condição necessária para apoiar ações judiciais da espécie, ressalta Moro.
Entretanto, a opinião pública, como ilustra o exemplo italiano, é também essencial para o êxito da ação judicial. Por isso os Procuradores dão longas entrevistas coletivas para explicar cada passo da Operação Lava-Jato e, assim como os responsáveis pela operação mani pulite fizeram largo uso da imprensa, aqui também a divulgação das delações premiadas e informações extra-oficiais servem para divulgar pontos importantes já atingidos pelas investigações.
Tão logo alguém era preso, detalhes de sua confissão eram veiculados no “L’Expresso”, no “La Republica” e outros jornais e revistas simpatizantes. O constante fluxo de revelações manteve o interesse do público elevado e os líderes partidários na defensiva. Craxi, especialmente, não estava acostumado a ficar na posição humilhante de ter constantemente de responder a acusações e de ter a sua agenda política definida por outros. O mesmo acontece hoje com o ex-presidente Lula, obrigado a explicar a atuação pessoal em favor da empreiteira Odebretch, e as atividades do Instituto Lula.
Talvez a lição mais importante de todo o episódio, diz Sérgio Moro, seja a de que a ação judicial contra a corrupção só se mostra eficaz com o apoio da democracia. É esta quem define os limites e as possibilidades da ação judicial. Enquanto ela contar com o apoio da opinião pública, tem condições de avançar e apresentar bons resultados. É a opinião pública esclarecida que pode, pelos meios institucionais próprios, atacar as causas estruturais da corrupção.