quinta-feira, 3 de março de 2016

"Brasil no alçapão", por Fernando Canzian

Folha de São Paulo


O desastre do PIB é sintoma da armadilha que capturou o Brasil. Ela se autoalimenta num ciclo de falta de confiança, recessão, menos impostos e aumento da dívida pública.

Neste ano, o tombo mínimo contratado para o PIB é de 3%, só pelo "carregamento" estatístico do resultado de 2015. A arrecadação de impostos vai cair mais e a dívida pública, subir. A perda de confiança reforçará o ciclo.

Se a relação dívida pública X PIB fosse bem menor que a atual, estaríamos em um período clássico de recessão pelos excessos de Dilma 1. Haveria desemprego e quebras pontuais e setoriais para derrubar a inflação, com aumento suportável da dívida pública. Mas o que se configura é pior.

A dívida pública é calculada como proporção do PIB. Essa relação indica se ela é pagável ou não. Quando há crescimento do PIB, essa proporção tende a manter-se estável, mesmo que a dívida aumente.

No Brasil, temos o contrário. O que evoca o grave fantasma da insolvência do setor público. Para alguns bancos internacionais, o Brasil só perde hoje da Nigéria entre possíveis candidatos a um calote.

Folhapress/Folhapress


O quadro acima mostra a rápida piora da relação dívida X PIB nos últimos anos. E como isso se agravará neste 2016. Para 2018, já há quem projete a dívida raspando em 85% do PIB.

Por dois motivos: o governo está pagando juros altíssimos para financiar um endividamento cada vez maior e tentar controlar a inflação; de outro lado, sofre uma inédita queda em sua receita.

No ano passado, os impostos sobre produtos recolhidos no país caíram quase 7%. 

Como comparação, em 2009, no auge da crise financeira internacional, a queda havia sido de 0,3%.

Ou seja, enquanto a dívida aumenta (+juros), a capacidade de pagá-la (-impostos) desaba. Daí a trajetória explosiva do endividamento em relação ao PIB, que encolhe na recessão.

Como sair dessa? O governo teria de cortar gastos. Arrecadou menos, gasta menos, contendo a explosão da dívida.

O Orçamento do governo neste ano prevê o contrário: teremos o maior gasto da história, o equivalente a 19,1% do PIB. Tanto por conta da queda do PIB quanto por despesas novas.

A grande pergunta é: até quando o "mercado" (os que têm dinheiro aplicado no banco) acredita que o governo consegue refinanciar o que deve?