domingo, 29 de junho de 2025

J.R. Guzzo - A gente somos inútel

 Operações de natureza estritamente militar, o nível de performance é o mesmo desastre


Campanha de recrutamento do Exército brasileiro | Foto: Flickr Exército brasileiro

Considere por alguns instantes os fatos apresentados a seguir — podem servir, pelo menos, para mostrar exatamente em que lugar do mapa você está. Jatos B-2 Spirit dos Estados Unidos decolaram de sua base no meio do território americano, voaram 11 mil quilômetros sem ser notados por nenhum sistema de radar e socaram em cima das centrais nucleares mais bem protegidas do Irã 12 bombas que atravessam 60 metros de concreto e transformam em farinha de rosca tudo o que está embaixo. Não existe no Brasil nenhuma construção capaz de ficar de pé depois de um bombardeio desses. 

Os dois B-2 que detonaram as usinas nucleares do Irã tiveram o apoio de 125 outros aviões americanos — mais do que toda a frota de táxi aéreo a que está reduzida hoje a Força Aérea Brasileira. Agiram na mesma operação submarinos que dispararam mísseis contra os alvos, porta-aviões prontos a prestar ajuda aos bombardeiros e os sistemas de comunicações por satélite mais avançados do mundo — esses mesmos, de Elon Musk, que o consórcio Lula-STF declarou inimigo internacional número 1 do Brasil. Cada bicho desses custa mais de US$ 2 bilhões. Os Estados Unidos têm 28 — prontos para decolar a qualquer minuto para qualquer lugar do mundo. 


Northrop Grumman B-2 Spirit, aeronave que os EUA enviaram ao Pacífico | Foto: Senior Airman Joel Pfiester/US Air Force

Mais alguma coisa? Os dois B-2 acabaram num único bombardeio com uma guerra de 12 dias entre Israel e o Irã, que há 40 anos ameaça eliminar o Estado judeu com suas bombas atômicas em construção. Os iranianos estavam levando mais uma surra de Israel. Mas o presidente Donald Trump achou mais prudente acabar logo com a história, autorizou o bombardeio-monstro, e o Irã pediu arrego na hora; foi soltar as bombas e veio o cessar-fogo. É pouco provável que os aiatolás voltem a perturbar Israel com suas ameaças de ataque nuclear. Se voltarem, vão ter de encarar os B-2 mais uma vez.

Isso se chama força — força que vem de um dispositivo militar de verdade, sem equivalentes reais no mundo de hoje, e capaz não apenas de defender o território americano, mas de impor a ordem dos Estados Unidos a regimes de malfeitores internacionais, como é o do Irã. É a capacidade concreta de encerrar guerras com uma única operação militar bem controlada. É o direito de ser respeitado para valer por todas as nações do mundo. China e Rússia entendem isso muito bem. Ficam a favor do Irã no falatório da ONU, mas não mandam um cartucho, e muito menos um soldado, para ajudar os aliados no campo de combate. 

A Rússia não consegue ganhar uma guerra na Ucrânia, país que tem o tamanho de Minas Gerais e um PIB dez vezes menor que o do Brasil. Por que iria se sentir capaz de enfrentar as forças armadas americanas? A China não faz guerras a não ser em defesa do seu território — há 5 mil anos. Os países mais fortes da Europa ficam ali no meio da tabela, evitando a zona do rebaixamento, mas sem chance de disputar realmente o campeonato. O resto não existe, e o Brasil, do ponto de vista militar, existe menos ainda. Eis aí o lugar do mapa em que estamos — em lugar nenhum. Um país militarmente nulo é também politicamente nulo, e é isso — um país nulo para quem fala sério de política internacional — que o Brasil é na vida real. 

Todo mundo com alguma coisa na cabeça sabe que é assim, mas Lula, a esquerda e os jornalistas acham que não é — e o resultado dessa ilusão mal-intencionada é que o nosso país, nos dois últimos anos e meio, está sempre no lugar errado, na hora errada e pelo motivo errado em tudo o que acontece no mundo. 

A “diplomacia” de Lula imagina que o Brasil é algo que não é. Aí fica impossível acertar No caso da guerra Israel-Irã, mais uma vez, foi um desastre com perda total. O Brasil, por culpa direta de Lula, ficou como o anão que grita de longe contra o gigante, no anonimato e na distância da multidão — e depois volta a pé para casa, sem que ninguém tenha sequer notado os barulhos que fez. Não é apenas a humilhação de se ver condenado, de novo, à posição do idiota perfeito da América Latina. É a estupidez crassa de ficar do lado que perde, sempre. 

No caso, ao fechar com o Irã contra Israel, tudo o que conseguiu foi proclamar-se como um aliado das piores ditaduras do mundo, da selvageria cívica e dos regimes chefiados por criminosos de guerra Não é uma posição que interessmaneira mais eficaz de defender os interesses nacionais brasileiros do que andar na companhia dos Estados Unidos e da luz do seu progresso. Em vez disso, Lula quer o Brasil na treva do Hamas, dos terroristas do Iêmen e dos narcoestados.a a um país sem força militar nenhuma, sem luz própria, sem autoridade moral de qualquer tipo — e incapaz não só de mostrar poder real, como também de se fazer respeitar perante o mundo. O Brasil de Lula se exclui, sem ganho nenhum, do círculo dos bem-sucedidos. É onde deveria estar. 


Lula na França usando um keffyieh, lenço que se tornou símbolo da resistência palestina e usado pelo Hamas | Foto: Reprodução/X


interessados em defender os interesses objetivos das suas populações. Entenda-se bem com quem faz voar os B-2; a partir daí, cuide do resto. Mas o presidente tem uma fantasia estúpida: a de que o Brasil faz um grande negócio querendo ser inimigo dos Estados Unidos. Pior ainda, tem a arrogância sem limites de ignorar que o povo brasileiro, em massa, gosta dos Estados Unidos, e não do seu “Sul Global”. Para onde o cidadão deste país quer imigrar: para o Texas ou para a China?

Outra pergunta que vem ao caso, e já há muito tempo, é a seguinte: diante de mais essa aula de poderio, competência e superioridade militares dos Estados Unidos, para que servem, afinal, as Forças Armadas do Brasil? Ou, mais precisamente: faz algum sentido gastar R$ 135 bilhões por ano (como em 2025) para manter Exército, Aeronáutica e Marinha, tais como são hoje no mundo das realidades? Qual é o retorno prático dessa despesa toda? E como uma estrutura militar desse tamanho ajudaria o Brasil em alguma coisa? Temos orçamento militar, mas não temos Forças Armadas. É ruim. 

Forças Armadas, basicamente, servem para duas coisas. Uma é atacar países estrangeiros que ameacem o território nacional. Aí, graças a Deus, estamos com sorte; os nossos militares não querem atacar ninguém, porque não há ninguém para atacar. A outra função é defender o Brasil de ataque inimigo. Aí, de novo graças a Deus, estamos bem, porque não há ninguém querendo nos atacar — e se houvesse seria um problema daqueles, porque as Forças Armadas brasileiras não conseguiriam defender o Brasil de um rasante de galinha paraguaia. Se não servem para atacar nem para defender, para o que poderiam servir? 

Os militares brasileiros perderam seu combate contra os traficantes de drogas nas fronteiras e nos portos — o Brasil, nos últimos anos, tornou-se um dos maiores portões de entrada e saída de narcóticos do mundo. Isso é trabalho da polícia? Com certeza, mas também é certo que fronteiras por onde passam livremente toneladas de drogas não são mais fronteiras; são apenas terra sem lei em que qualquer um faz o que quer, e onde militar não manda nada. É a mesma coisa com o contrabando de armas pesadas para o crime organizado. Os bandidos passam por lá como quem atravessa a rua.


Exército Brasileiro | Foto: Marcello Casal Jr./Agência Brasil


As Forças Armadas, por impotência, permitem que as facções criminosas mantenham territórios soberanos dentro do Brasil, como se fossem um invasor estrangeiro. Em operações de natureza estritamente militar, o nível de performance é o mesmo desastre. Na última vez em que se ouviu falar em defesa do território nacional houve menção de que o Exército iria levar tanques de guerra para a fronteira com a Venezuela. Revelou-se então que os tanques disponíveis estavam no Rio Grande do Sul — e levariam 35 dias para chegar à possível zona de ação. O que os combatentes que arrasam o sistema nuclear do Irã em 11 horas diriam de uma coisa dessas? 

A Força Aérea não tem combustível, peças de reposição nem pilotos; seria eliminada no solo, antes de decolar com um único avião. Ao mesmo tempo, é hoje uma piada nacional por levar Janja até a Rússia, sozinha num avião com 200 assentos — e ficar voando de cima para baixo para transportar, com dinheiro do pagador de impostos, o primeiro picareta que tirar do bolso uma carteirinha de autoridade. A Marinha está gastando o seu dinheiro num projeto de submarinos nucleares que já dura mais de 45 anos; ainda não rolou o submarino. A última operação militar do Exército foi prender e entregar para a polícia senhoras idosas, crianças e cidadãos indefesos que protestavam na frente de quartéis de Brasília.  

Se é inútil como força de defesa, a tropa brasileira consegue ser mais inútil ainda para cumprir a única função legal que lhe restaria: zelar pelo respeito à Constituição, segundo regras expressamente previstas em lei, caso as instituições falhem nessa tarefa. É tudo o que as Forças Armadas não fazem no Brasil de hoje. O consórcio STF-Lula transforma o Brasil, a cada dia mais, num Estado policial totalitário, anárquico e fatalmente corrupto. Faz uma política interna de ruína. Faz uma política externa vizinha à traição. Anula diariamente as leis e a Constituição Federal. Os militares baixam cada vez mais a cabeça.

Não apenas ficam no come e dorme, gastando R$ 135 bi por ano sem produzir um único parafuso, mas se tornaram cúmplices ativos do regime de exceção que está aí. Se encolhem como coelhos assustados a cada vez que o ministro Alexandre de Moraes passa por perto. Deixam clara, dia após dia, a sua compulsão por concordar com qualquer coisa que venha de Lula, Janja, STF, STJ, PGR, AGU. Não podem ver um saco petista passar por perto sem puxar na hora; puxam primeiro e perguntam depois. Diante disso tudo, ficam duas perguntas. Os militares deveriam mudar de atitude? Sim. Deveriam intervir na política, então? Não. 


Não é apenas “não”. É “não, pelo amor de Deus”. A ideia de que os militares são mais capacitados para governar o Brasil não é apenas errada; é de uma pretensão sem limites. Por que os militares seriam melhores que outros quaisquer? Por que não os dentistas, ou os cartógrafos? O que se quer é o contrário. Os militares, em primeiro lugar, deveriam ser reduzidos ao tamanho real de sua utilidade para o país. Em seguida, deveriam abandonar seu papel ativo na sabotagem da ordem jurídica do Brasil. Fora isso, força armada é para quem sabe o que fazer com ela.


Celso Amorim, assessor especial da Presidência, e presidente Lula, durante evento no Palácio do Itamaraty (1º/6/2023) | Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil 

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