sexta-feira, 29 de março de 2024

J.R. Guzzo: 'Não adianta tentar fingir: Lula sempre será a favor da ditadura de Maduro'

 

Foto: EFE/ André Coelho


A única coisa que poderia acontecer de bom para o presidente Lula em seu caso de paixão com a ditadura da Venezuela e com o ditador Nicolás Maduro seria que ambos, pelo menos por um tempo, sossegassem um pouco e chamassem menos atenção para as barbaridades em série que cometem. É uma pena, para ele, que nem a ditadura e nem o ditador se lembrem de tornar a sua vida mais fácil. Lula não pode, depois de ter se metido nessa parceria, ficar contra nenhuma das barbaridades cometidas pelos parceiros. Ao contrário, está sempre se vendo na obrigação de bater palmas para eles, seja lá o que façam – e isso está pegando cada vez pior, porque as barbaridades ficam cada vez piores. Chegou a um ponto, agora, difícil de segurar.

A última agressão feita por Maduro contra a democracia e contra os direitos humanos mais elementares foi tão selvagem que Lula e os seus estrategistas diplomáticos se viram forçados a murmurar uma reclamação. Não deu certo, é claro, pois a queixa foi tão frouxa que acabou só causando prejuízo. Maduro ficou irritado. Quem não gosta de ditadura não melhorou em nada a sua opinião sobre Lula.


A democracia não pode voltar à Venezuela enquanto os ditadores continuarem sendo ditadores e debochando das orações do Itamaraty com eleições como essa.


É um problema que não está em vias de ser resolvido, e por uma razão bem simples: a única solução de verdade é fazer uma opção moral e ficar contra a ditadura venezuelana. Trata-se de algo que não está disponível. Lula, muito simplesmente, não sabe o que é uma opção moral. Além disso, ele é a favor, e não contra a ditadura de Maduro – não porque goste de Maduro, mas porque gosta de ditadura.

Se o governo da Venezuela conseguisse ser um pouco menos brutal do que é, o assunto não estaria tão em evidência e Lula não teria de apoiar tantas brutalidades. Mas o que acontece é justamente o contrário: a ditadura fica cada vez mais ditadura. Em seu último surto de tirania, proibiu, grotescamente, a candidata da oposição de concorrer à próxima eleição para presidente. A oposição apresentou uma segunda candidata: foi proibida também. Assim fica difícil.

O presidente Lula, aí, foi feito de palhaço duas vezes. A Venezuela prometeu ao Brasil e a outros países, por tratado internacional, que desta vez faria eleições limpas – e a primeira coisa que fez foi cassar a candidata Corina Machado. Lula, então, enfiou de vez o pé na jaca. Disse, num de seus piores momentos de grosseria, que a vítima da violência não deveria “ficar chorando”, e sim apresentar uma outra candidata em substituição. Corina fez precisamente isso – e Maduro impediu também a substituta. Não deu, aí, para a diplomacia de Lula continuar dando a cara para bater.

Veio com uma nota aguada, covarde e burra dizendo que o Brasil estava “preocupado” com a evolução da farsa e tinha esperanças de que, no fim, o amor e a democracia pudessem vencer. É um disparate. A democracia não pode voltar à Venezuela enquanto os ditadores continuarem sendo ditadores e debochando das orações do Itamaraty com eleições como essa. Lula continua sendo a favor dos ditadores, porque não admite ficar contra. Xeque-mate.

O episódio, no fundo, deixa claro, mais uma vez, o desprezo da Venezuela pelo Brasil e por aquilo que o Brasil acha ou não acha. Lula, Janja, PT? Maduro, na vida real, não leva nada disso a sério – para ele, o Brasil é um país que disputa a segunda divisão e deve ser relegado ao departamento das preocupações secundárias. Nada deixou isso mais claro do que o tratamento que deram nesse episódio ao grande cérebro das estratégias diplomáticas de Lula, o chanceler-chefe Celso Amorim – não tiveram o trabalho, sequer, de atender os seus telefonemas.

Qual a surpresa? O que realmente interessa para a Venezuela é a China e a Rússia. Lula e Amorim podem ficar sentados na sala de espera. O presidente, numa declaração especialmente cretina, disse tempos atrás que a Venezuela era uma excelente democracia, porque “tem mais eleições que o Brasil”. Pode ser. O problema é que não pode haver candidatos da oposição. Lula sabe que é assim, mas fingia que não sabia. Desta vez ficou complicado continuar fingindo.



J.R. Guzzo, Gazeta do Povo