Entrada forte de dólares e outras moedas com a crise global de 2007-08 e a pandemia de Covid fortaleceu a inflação em todo o mundo.| Foto: Gerd Altmann/Pixabay
A teoria econômica ensina que há uma relação sensível entre o estoque de moeda, o tamanho do Produto Interno Bruto (PIB) e a inflação, cujas conclusões são praticamente as mesmas nas várias escolas de pensamento econômico – quando há divergências, elas são parciais, sem destruir o eixo central da teoria. “Moeda”, aqui, é representada por todos os meios de pagamento usados como instrumentos de troca, dos quais a moeda manual e os depósitos bancários são os mais populares.
A teoria diz que o total dos meios de pagamento deve ser compatibilizado com o tamanho do PIB, o volume de transações realizadas pelo sistema (pessoas, empresas, governo, resto do mundo e qualquer agente que atue no mercado) e o nível de preços. Se um país produzir o mesmo PIB de um ano para outro, mas os preços dobrarem no segundo ano – como ocorreu na Argentina –, o total de moeda em valores nominais segue o novo valor do PIB aos preços duplicados. Nesse exemplo, a nação nada tem de produto adicional, mas a duplicação de todos os preços (em termos médios) requer mais dinheiro para as mesmas transações.
Quando ao lado da inflação existe um ambiente jurídico ruim e inseguro, os efeitos negativos sobre a economia nacional são altamente danosos
Na situação acima descrita, há o efeito de empobrecer as pessoas pela corrosão do poder de compra, além de desorganizar o sistema de preços e perturbar a capacidade de previsão. Essa situação, sozinha, é suficiente para prejudicar o sistema de produção, distribuição, circulação, consumo e investimento, com a consequente queda do PIB em períodos seguintes, isto é, a nação entra em recessão que, durando muitos anos, transforma qualquer país em um lugar pobre, com todas as mazelas sociais decorrentes. Se a esse quadro se juntar um corpo de leis instáveis e confusas, que colocam à mercê de decisões judiciais estranhas e desconhecidas até mesmo os atos passados, fica configurado um cenário real que definitivamente impede o país de ter crescimento econômico e desenvolvimento social.
Quando explodiu a crise financeira mundial, iniciada em 2007 e agravada nos anos seguintes com efeitos nocivos à economia global, os quais duram até hoje, os governos desesperados, com Estados Unidos e Europa à frente, inundaram o mercado com injeção de moeda destinada a socorrer o sistema financeiro e reduzir o estrago. O total de moeda jogada no mercado global por causa daquela crise girou em torno de US$ 9 trilhões, para um PIB mundial de US$ 80 trilhões – portanto, o equivalente a pouco mais de 11%. Vários especialistas alertaram que, sendo certa ou errada a decisão adotada, esse volume de moeda espalhada pelo mundo acabaria fomentando a escalada da inflação, o que de fato aconteceu e está se refletindo na economia mundial até hoje, com as agravantes causadas pelas medidas destinadas a enfrentar a pandemia.
A inflação nos países desenvolvidos subiu até a casa dos 10%, chegando a ser maior em alguns deles. No Brasil não foi diferente. Embora a situação brasileira tenha sido melhor que a de vários países desenvolvidos, o Banco Central decidiu combater a inflação e, segundo seus próprios relatórios, tentou fazê-lo ao menor custo econômico possível – no caso, com a menor a redução do PIB. Vale ressaltar que sempre há custo econômico para combater a inflação, podendo ser maior ou menor conforme a eficiência das autoridades monetárias, especialmente a política de juros e câmbio sob o comando do BC.
Com a lei da autonomia do BC e o mandato fixo de seus diretores, o atual presidente do BC termina seu mandato no fim de 2025, e o perfil da nova gestão é algo em aberto. Se houver uma gestão que toque o BC com mais tolerância em relação à inflação (como quer o presidente Lula em suas falas públicas), o país pode conviver com uma inflação maior, que à frente exigirá mais sacrifícios para ser debelada. Como dito, quando ao lado da inflação existe um ambiente jurídico ruim e inseguro, os efeitos negativos sobre a economia nacional são altamente danosos, pois uma condição importante para o país receber investimentos privados nacionais e estrangeiros é, sem dúvida, a segurança jurídica, coisa na qual o Brasil vem pecando há muito tempo.
Por fim, o Brasil está vivendo um problema adicional: a enorme dúvida sobre a aprovação da reforma tributária – e, se ela sair, qual será efetivamente o seu teor, pois, a julgar pelo andamento das propostas, agora no Senado Federal, ninguém sabe o que virá dali, inclusive porque a fixação das alíquotas dos tributos será deixada para lei complementar. É o Brasil, como sempre, demorando para enfrentar os problemas que travam o crescimento econômico. A nação aguarda.
Gazeta do Povo